De Lisboa ao Equador


Todos ficámos felizes com a qualificação de Portugal para o Mundial da Rússia. Fernando Santos, que já estava de parabéns por fazer anos, mereceu ser parabenizado a dobrar. 


É, sem dúvida, um treinador competente, embora com a competência própria de um engenheiro. À sua obra falta a arte que caracteriza os projetos dos bons arquitetos. As suas equipas praticam um futebol enfadonho, que não entusiasma ninguém.

Há muito quem diga que o importante no futebol são os resultados e que as boas exibições não interessam. Não estudei por essa cartilha. Para mim, as exibições interessam mesmo. É diferente vencer por 3 ou 4-0, com golos bonitos, do que vencer com um autogolo. Aliás, Mourinho, acusado durante muitos anos de praticar um futebol feio, apesar de ganhar sucessivos títulos, está a mudar a forma de jogar das suas equipas, apostando num futebol mais atraente.

Assim, a noite de festa de terça-feira foi chatíssima do ponto de vista futebolístico. A seleção portuguesa raramente jogou bem. Procurou trocar a bola, marcou um golo mal enjorcado e só se esmerou na jogada do segundo golo, na verdade bonita.

Ronaldo não jogou nada, atrapalhou-se com a bola quando estava sozinho frente ao guarda-redes, mas mesmo assim foi poupado pela crítica, que o idolatra. Um comentador dizia que ele tinha sido muito importante no tal segundo golo, pois o seu movimento “arrastara” um defesa. Ou seja, Ronaldo foi importantíssimo porque se mexeu! Parece mentira. Havia de ficar quieto numa jogada que decorreu dentro da área?

Foi preciso esperar pela madrugada para ver um bonito jogo de futebol: o Equador-Argentina, que esta tinha de ganhar para estar no Mundial. Foi um jogo alegre, aberto, e com cinco jogadores que conhecemos dos nossos estádios: Salvio, Acuña, Otamendi, Enzo Pérez e Di María. Metade de uma equipa! A Argentina começou a perder logo aos 37 segundos, mas inverteu o resultado e ganhou 3-1, com Messi a marcar os três golos.

Messi e Ronaldo estarão, assim, no Mundial da Rússia. Mas francamente, ao ver os dois jogos, voltei a não perceber como é possível compará-los. Ronaldo é hoje apenas um finalizador, um jogador de último toque, que mete a bola dentro da baliza. Ora Messi joga no campo todo, empurra a equipa para a frente e ainda arranja forças para ir à área e marcar. Claro que os números de Ronaldo são impressionantes. Mas os golos não são tudo: André Silva marcou nove golos nos dez jogos da qualificação e ninguém diz que é um génio.

Quer no que toca ao futebol jogado pela nossa seleção, quer no que respeita a Ronaldo, devemos pôr o nacionalismo de parte e ser capazes de ver a realidade. O que não quer dizer que não vibremos com as vitórias da seleção e com os golos de Cristiano Ronaldo. Mas nem Portugal joga um futebol bonito, nem Ronaldo é “o melhor do mundo”.