Estatuto do MP: uma discussão que exige visão e coragem


Pensar soluções apenas numa perspetiva próxima retira-lhes, sempre, solidez e efetividade


Um dos modos mais perversos de abordar os problemas da sociedade e das suas instituições é limitar essa reflexão e a busca de soluções às contingências do dia-a-dia e às aspirações imediatas dos que são por elas afetados.

Pensar as soluções apenas numa perspetiva próxima retira-lhes, sempre, solidez e efetividade.

Não se resolve, desse modo, as questões que supostamente deveriam ser solucionadas e impede-se mesmo um enquadramento sistemático de problemas parciais num projeto mais vasto e coerente que responda, esse sim, ao leque de circunstâncias complexas condicionadoras da realidade que se quer mudar. 

O que nesta moderna e mais utilitária perspetiva sucede muitas vezes é que nem o que pode ser resolvido imediatamente acaba por o ser e os problemas que supostamente deveriam ficar solucionados acumulam-se e, inclusive, agudizam-se.

Esta maneira muito imediatista de encarar os problemas não acontece hoje, porém, por acaso.

Ela resulta, desde logo, de alguma dificuldade na assunção frontal das perspetivas estratégicas por parte de muitos dos intervenientes fundamentais para a resolução dos problemas.

Tal dificuldade radica, em muitos casos, nas exigências do método democrático e participativo que hoje – e bem – se exige para a tomada de decisões públicas relevantes. 

Ela resulta também, por vezes, da ampliação mediática constante dada às posições dos que nesse processo são chamados a intervir e dos sinais errados que daí, involuntária mas frequentemente, decorrem.

Os problemas advêm ainda do escasso tempo político concedido aos participantes no processo de decisão, o que muitas vezes condiciona o amadurecimento das boas soluções.

Muitas delas acabam, assim, por tornar-se incompreensíveis para os seus destinatários, o que permite que em seu torno se desenvolvam receios e discursos tremendistas dos sempre presentes velhos do Restelo. 

Por tudo isso, procurar ajustar problemas relevantes, mas setoriais, numa resposta mais global que responda a desafios de maior alcance e importância é hoje, reconheça-se, de uma enorme dificuldade.

Esta agiganta-se, porém, se por necessidades táticas não se procurar transmitir desde o início uma visão mais ampla e esclarecida dos problemas a resolver, agora e no futuro.

Tal esclarecimento deve, com efeito, ser direcionado não só aos que esperam um justificado benefício imediato, mas deve envolver também os que, depois deles, irão seguramente ser confrontados com os mesmos problemas.

É, todavia, importante que os que participam num processo institucional de discussão, procura e consenso democráticos tenham a perspetiva das oportunidades – muitas vezes únicas – de que desfrutam e saibam decidir em função do essencial e não de questões acessórias, por mais importantes que estas se apresentem no momento.

Procurar abordar a realidade de frente pode levar, é certo, a incompreensões melindrosas, designadamente entre os que, instalados, reagem sempre a qualquer mudança, mesmo que esta, na verdade, os não afete.

Participar num processo que se centre na resposta a problemas reais acumulados e que, com soluções de remendo, se irão continuar a agravar exige, por isso, visão histórica e, sobretudo, muita coragem cívica. 

Estou convicto de que os magistrados que estão a discutir o seu estatuto dispõem de ambas. 

 

Jurista

Escreve à terça-feira


Estatuto do MP: uma discussão que exige visão e coragem


Pensar soluções apenas numa perspetiva próxima retira-lhes, sempre, solidez e efetividade


Um dos modos mais perversos de abordar os problemas da sociedade e das suas instituições é limitar essa reflexão e a busca de soluções às contingências do dia-a-dia e às aspirações imediatas dos que são por elas afetados.

Pensar as soluções apenas numa perspetiva próxima retira-lhes, sempre, solidez e efetividade.

Não se resolve, desse modo, as questões que supostamente deveriam ser solucionadas e impede-se mesmo um enquadramento sistemático de problemas parciais num projeto mais vasto e coerente que responda, esse sim, ao leque de circunstâncias complexas condicionadoras da realidade que se quer mudar. 

O que nesta moderna e mais utilitária perspetiva sucede muitas vezes é que nem o que pode ser resolvido imediatamente acaba por o ser e os problemas que supostamente deveriam ficar solucionados acumulam-se e, inclusive, agudizam-se.

Esta maneira muito imediatista de encarar os problemas não acontece hoje, porém, por acaso.

Ela resulta, desde logo, de alguma dificuldade na assunção frontal das perspetivas estratégicas por parte de muitos dos intervenientes fundamentais para a resolução dos problemas.

Tal dificuldade radica, em muitos casos, nas exigências do método democrático e participativo que hoje – e bem – se exige para a tomada de decisões públicas relevantes. 

Ela resulta também, por vezes, da ampliação mediática constante dada às posições dos que nesse processo são chamados a intervir e dos sinais errados que daí, involuntária mas frequentemente, decorrem.

Os problemas advêm ainda do escasso tempo político concedido aos participantes no processo de decisão, o que muitas vezes condiciona o amadurecimento das boas soluções.

Muitas delas acabam, assim, por tornar-se incompreensíveis para os seus destinatários, o que permite que em seu torno se desenvolvam receios e discursos tremendistas dos sempre presentes velhos do Restelo. 

Por tudo isso, procurar ajustar problemas relevantes, mas setoriais, numa resposta mais global que responda a desafios de maior alcance e importância é hoje, reconheça-se, de uma enorme dificuldade.

Esta agiganta-se, porém, se por necessidades táticas não se procurar transmitir desde o início uma visão mais ampla e esclarecida dos problemas a resolver, agora e no futuro.

Tal esclarecimento deve, com efeito, ser direcionado não só aos que esperam um justificado benefício imediato, mas deve envolver também os que, depois deles, irão seguramente ser confrontados com os mesmos problemas.

É, todavia, importante que os que participam num processo institucional de discussão, procura e consenso democráticos tenham a perspetiva das oportunidades – muitas vezes únicas – de que desfrutam e saibam decidir em função do essencial e não de questões acessórias, por mais importantes que estas se apresentem no momento.

Procurar abordar a realidade de frente pode levar, é certo, a incompreensões melindrosas, designadamente entre os que, instalados, reagem sempre a qualquer mudança, mesmo que esta, na verdade, os não afete.

Participar num processo que se centre na resposta a problemas reais acumulados e que, com soluções de remendo, se irão continuar a agravar exige, por isso, visão histórica e, sobretudo, muita coragem cívica. 

Estou convicto de que os magistrados que estão a discutir o seu estatuto dispõem de ambas. 

 

Jurista

Escreve à terça-feira