Outubro escaldante no PSD?


Além dos efeitos de resultados autárquicos eventualmente fracos, Passos Coelho pode sofrer o desgaste de sondagens negativas sobre legislativas que sejam publicadas proximamente


1) É certo e sabido que o resultado das autárquicas vai gerar uma confusão tal que todos os partidos arranjarão forma de proclamar vitória. Há, no entanto, que reconhecer que é Passos Coelho que tem a tarefa mais complicada. Isto porque se arrisca a não somar nenhuma conquista significativa ao leque de autarquias que o PSD controla atualmente (salvo se ganhar Coimbra), porque pode não ficar à frente do PS em mandatos e porque pode ver o partido ficar-se por votações pouco expressivas no Porto e, sobretudo, em Lisboa, onde Cristas tem apostado em força, parecendo mesmo cativar o voto de descontentes sociais- -democratas para quem só haverá mudança se ocorrer uma derrocada social-democrata na capital. Tanto ou mais do que os próprios resultados de uma noite eleitoral confusa, poderão contar também para gerar desenvolvimentos subsequentes as sondagens que, certamente, não deixarão de ser feitas, antevendo eventuais legislativas. O efeito associado das duas coisas pode ser o início de um processo de contestação direta ao resiliente líder, embora se saiba que Passos não é minimamente dado a estados de alma emocionais e que está decidido a bater–se contra quem vier. Prova disso está no facto de ter já convocado um conselho nacional do partido para 3 de outubro, a fim de analisar os resultados e a situação política, condicionando a manobra de eventuais oposicionistas. Seja como for, há alguma probabilidade de o PSD ser o partido que fica na berlinda a partir do dia 1, deixando Rui Rio ou outros potenciais pretendentes (que os há) sem margem para não reagirem se a débâcle eleitoral ocorrer mesmo, o que não é uma certeza. Basta lembrar que o PSD conseguiu ser o partido mais votado nas legislativas quando, uns meses antes, o davam por irremediavelmente batido.

O ponto fraco da estratégia política nacional de Passos desde então foi basicamente não ter exigido mais a Costa e à geringonça, invocando alegadas circunstâncias positivas que herdaram do governo PSD/CDS. Preferiu anunciar um diabo que não apareceu, ignorando que estávamos tão mal que as coisas só podiam melhorar, mesmo que poucochinho. Mais tarde ou mais cedo, o diabo virá, mas não necessariamente por causa de Costa e da sua política, que foi a correta. Chegará simplesmente porque a economia é feita de ciclos e contraciclos.

2) Depois de António Costa ter negado a existência oficial de um suposto relatório, elaborado por uma das secretas sobre Tancos, que critica violentamente o ministro da Defesa e o chefe do exército, o “Expresso” prometeu mostrar inequivocamente o seu conteúdo. Ainda bem. Não vai chegar dizer que são 63 páginas que apontam para cenários que podem ir de eventuais mandantes corsos a senhores da guerra africanos, passando por máfias ou grupos islâmicos radicais. Essas são especulações legítimas que qualquer cidadão informado ou cronista poderia traçar. Se é para produzir só coisas daquelas que temos serviços secretos, então mais vale acabar com eles e dar as verbas ao Serviço Nacional de Saúde, que bem precisa. Entretanto, estão em causa a palavra do primeiro-ministro, a seriedade do líder da oposição, que cavalgou a notícia, e a credibilidade do jornal. Venha lá o documento e o nome de quem o produziu e subscreveu, já para não pedir o de quem o plantou na imprensa. Ao menos isso, já que do alegado roubo de Tancos continua a nada se saber.

3) Japoneses e sul-coreanos: os vistos gold que se seguem. A instabilidade que ocorre na Ásia, com o agravamento da tensão entre a Coreia do Norte, os Estados Unidos e o Japão, tem levado cidadãos daqueles países, possuidores de folga financeira, a informar-se sobre a hipótese de investirem numa casa cá, obtendo o respetivo visto. Situação semelhante, aliás, está a verificar-se com crescente número de turcos. Apesar de lamentáveis acontecimentos recentes ao nível da segurança, continuamos a ser tidos como seguros, simpáticos, baratos e afáveis, embora não falte gente a querer modificar este paradigma, tentando estragar o que tem sido positivo, como o alojamento local, o turismo ou as isenções fiscais a residentes estrangeiros. Há quem tenha a atração do abismo, nem que seja por inveja, apesar de não saber fazer melhor.

4) Prossegue a vaga de ocupações perpetrada por diplomatas a confortáveis e influentes lugares do Estado, demonstrando que estamos perante uma confraria política que se tornou omnipresente – uma espécie de PREC da alcatifa. Estamos longe do comportamento de neutralidade exigido a funcionários do Estado, sejam magistrados, militares ou diplomatas. A somar a exemplos recentes, o governo indicou agora Seixas da Costa para o CGI da TV pública e Graça Mira Gomes para o Sistema de Informações da República. Por este andar, só falta diplomatas ocuparem os postos vagos pelas demissões na Proteção Civil. Se calhar, é melhor não dar ideias.

Jornalista