“Se o resultado em Lisboa for mau, Assunção Cristas tem os dias contados”, diz Pedro Pestana Bastos

“Se o resultado em Lisboa for mau, Assunção Cristas tem os dias contados”, diz Pedro Pestana Bastos


Membro da comissão nacional do CDS, o advogado ofereceu-se para o combate político das autárquicas em Loures onde, diz, se joga o futuro da direita


Miguel Relvas disse na entrevista ao “Expresso” do último sábado que, se fosse ele, logo depois que o CDS anunciou que retirava o apoio a André Ventura em Loures, ele acabaria com todas as coligações PSD/CDS na região de Lisboa. O que é que tem a dizer sobre isso?

Bem, isso reflete, a visão que o Miguel Relvas tem do CDS. Infelizmente, no PSD ainda há algumas pessoas, designadamente numa linha bem protagonizada por Miguel Relvas, que entendem que o CDS serve para ser mordomo do PSD. Recordo-me das declarações, há muitos anos, que o Miguel Relvas teve depois de o CDS ter elegido 23 deputados, em que o Miguel Relvas também dá uma entrevista ao “Expresso” a dizer que o CDS tinha de devolver os sete deputados que tirara ao PSD. É uma visão que vem desde o cavaquismo, que fez escola no PSD, que, pura e simplesmente, não entende porque existe o CDS. E esse PSD pensa que o CDS é um partido marginal que deve ter três ou quatro deputados, que deve estar ali circunscrito à direita do PSD, que não pode falar com mais nenhum partido do arco governativo. É uma visão ultrapassada, designadamente nas pessoas mais novas do PSD que têm uma visão totalmente oposta do CDS. O CDS tem relações com todo os partidos do arco da governação e não está acantonado à direita do PSD. Aliás, é muito interessante percebermos como vai evoluir o espectro político à direita, a seguir a estas eleições e Loures tem a ver um bocadinho com isso. Passámos a ter com a ‘geringonça’ algo que nunca tivemos que é a possibilidade de termos maiorias à direita e à esquerda, em que o PCP e o Bloco de Esquerda integram projetos governativos. No meu ponto de vista, isto reequilibra o sistema partidário português.

Porquê?

O nosso sistema era um sistema desequilibrado em que quando havia maiorias à direita, entre o PSD e o CDS, as maiorias formavam-se naturalmente e, à esquerda, quando o PS conseguia ganhar eleições, mas sem maioria, havia um desequilíbrio. E atraía-o para o chamado bloco central. Estando o PS limitado com coligações à esquerda, seria sempre compelido a fazer sistemas de governação ou com o PSD ou até mesmo com o CDS como foi em 78. E, portanto, vivíamos num sistema de bloco central dominado ora pelo PS ora pelo PSD, com alternativa mas sem alternância. Eu acho que isto é mais saudável. É mais saudável existirem governos à esquerda quando a esquerda tem maioria no parlamento e governos à direita quando a direita tem maioria no parlamento. Assim é que deve ser. Se não fosse este reequilíbrio, provavelmente, o sistema eleitoral português iria implodir porque não tínhamos soluções para isso. António Costa teve o mérito de conseguir algo que ninguém achava possível. Isto tem outras consequências que, do ponto de vista eleitoral, podem ser interessantes para o CDS que é a pressão do voto útil terminou. Hoje em dia não interessa quem ganha as eleições, interessa quem consegue fazer maioria no parlamento. E isso não tem nada de golpe, isso é a democracia a funcionar. E muita da direita ainda não compreendeu isso.

Para o CDS é melhor que exista este governo à esquerda porque cria um espaço para o CDS à direita?

O CDS não se pode transformar num partido charneira, como algumas pessoas pretendem, em que possa fazer coligações com o PS ou com o PSD. O CDS deve lutar pela maioria à direita. Eu lutarei para que o CDS volte ao governo quando a direita tiver mais do que 115 deputados.

Também irá permitir que o CDS consiga estabilizar à direita um número de deputados que não varie tanto como…

Os próximos meses e os próximos anos vão ser muito interessantes do ponto de vista de como se vai reorganizar a direita. Tendo em conta as sondagens, há uma possibilidade séria do PSD em Lisboa e no Porto ficar com votações abaixo dos 20%. Se tiver um bom resultado em Loures, em contraposição aos maus resultados em Lisboa e Porto, poderá ter efeitos dentro do PSD que são imprevisíveis. Poderá haver pessoas dentro do PSD favoráveis a uma alteração do discurso no sentido de ser mais populista. Isso nunca poderá acontecer com Pedro Passos Coelho, que não tem nada a ver com o discurso de Loures. Pedro Passos Coelho já se arrependeu de não ter tirado o apoio a André Ventura em Loures e este apenas tem o apoio do PSD porque Passos Coelho é a pessoa mais teimosa que existe na política portuguesa. Quando toma uma decisão, não retira essa decisão, independentemente das consequências. Isso já foi muito importante para o país. Recordo-me da crise do irrevogável, se não fosse a teimosia de Pedro Passos Coelho, teríamos uma crise enorme no governo.

Acha que em Loures se está a jogar o futuro da direita?

Um hipotético bom resultado de André Ventura poderá originar uma reformulação dos partidos da direita. Se fosse conjugado um bom resultado em Loures com um mau resultado em Lisboa e no Porto, eu não tenho dúvida que muitas pessoas na base do PSD iriam questionar se não seria mais importante evoluir para um discurso mais próximo de André Ventura. E poderia haver espaço, teoricamente, para um partido com essas ideias e que siga essa política. Uma coisa é segura: não é com Pedro Passos Coelho.

Quem poderia liderá-lo?

Eventualmente Miguel Relvas, se tivesse alguma credibilidade, mas hoje em dia não tem credibilidade nenhuma. Portanto, não sei quem seria. A tradição do PSD é muito humanista, muito social-democrata, no seu “baronato” não vislumbro protagonistas para essa guinada à direita. Mas, nas bases, sentimos essa pulsão. Nas bases do PSD e de algum CDS, não nego isso. Há aqui um corte transversal a ambos os partidos na adesão a este tipo de discurso. Por isso é que eu lhe digo que, inclusivamente, podia originar uma reorganização à direita, em que passaríamos a ter um partido de cariz mais populista e um partido de direita mais tradicional. Isso originaria que parte do PSD e parte do CDS se organizariam num partido e os antigos CDS e PSD estariam noutro partido.

Dois partidos na mesma, mas de diferente ideologia.

Imagine que, em Lisboa, Assunção Cristas fica à frente de Teresa Leal Coelho – não estou a dizer que é certo, acho muito difícil de acontecer, mas hoje as sondagens dizem que é possível. Imagine que no Porto, o PSD tem 12 ou 13%, se se concretizarem as sondagens. E imagine que em Loures, há um bom resultado do PSD. Temos o PSD do discurso mais tradicional com resultados desastrosos e, numa câmara importante como Loures, um PSD com um discurso ao arrepio da tradição, com um resultado bom, passando dos 17% das últimas eleições para 25% ou 30%. Depois de percebermos que o sistema parlamentar está diferente e que o PS fará naturalmente coligações à sua esquerda quando não tiver maioria, isso não é indiferente para a direita. Fará sentido existirem dois partidos à direita do PS com discursos que aqui e ali são próximos? A ideia de que o CDS é um partido necessariamente à direita do PSD não é verdade. E, aliás, com a liderança de Assunção Cristas não existe uma guinada à direita, antes pelo contrário. Há aqui uma redefinição à direita que pode acontecer nos próximos tempos. E não é necessariamente mau.

Com Assunção Cristas há um redirecionamento no CDS?

Não é um redirecionamento…

Antes estaria a caminhar para ser mais PP e hoje volta mais à democracia cristã.

Tínhamos um CDS com um líder nato, Paulo Portas, que liderou o CDS durante mais de uma década e tinha uma intuição política como mais ninguém em Portugal. O CDS de Paulo Portas chegou a ser democrata cristão, liberal, direita popular. Paulo Portas tinha essa intuição de perceber onde é que o CDS mais serviria em cada momento político. É verdade que, com Paulo Portas, o CDS nunca teve mais de 12%, mas nunca teve menos de 7%. A diferença entre uma grande vitória do CDS e uma grande derrota do CDS eram 2%, 3%, a margem de erro de uma sondagem. Era um partido que vivia na margem de erro entre o sucesso e o insucesso. Assunção Cristas não tem essa flexibilidade, mas tem o que Paulo Portas não tem, a autenticidade. Enquanto Assunção Cristas estiver à frente do CDS, o CDS nunca dará guinadas à direita. O tipo de políticas que tivemos com Paulo Portas, com sucesso, é verdade, tinha o reverso da medalha, que era o partido ter pouca previsibilidade e os partidos políticos vivem da confiança e da previsibilidade. As pessoas não confiam, não aderem. E com Paulo Portas nós nunca sabíamos o que era o CDS passado um ano. Mas acho que daqui a uns anos, se Paulo Portas não cair na tentação de intervir politicamente e aparecer demais, acho que o país, a direita em particular, terá muitas saudades dele.

Paulo Portas poderá ser um bom candidato a Presidente da República?

Poderá ser um bom candidato a Presidente da República. Daqui a um ano não será certamente o tempo de Paulo Portas, mas daqui a seis, sete anos poderá ser candidato a Presidente da República.

Para que haja essa reconfiguração à direita é preciso que haja fragilidade no CDS, com um mau resultado de Cristas em Lisboa?

Não, não tem. A reconfiguração partirá sempre do PSD. Se o CDS mantiver as suas cinco câmaras – e parece que manterá – e tiver um resultado acima dos 10% em Lisboa, a noite eleitoral do CDS está safa. O CDS nunca teve dois dígitos em Lisboa em eleições autárquicas sozinho, nem com Maria José Nogueira Pinto nem com Paulo Portas, portanto será o teste dos votos para Assunção Cristas, que fez muito bem em ter-se candidatado em Lisboa.

 Não foi uma manobra arriscada?

É arriscada e ela tinha de arriscar. Assunção Cristas está a suceder a Paulo Portas, não tem unanimidade dos dirigentes e militantes. É extremamente difícil suceder a Paulo Portas. Nuno Melo, que tem imensas qualidades, também teria dificuldades, não teria uma liderança sem perigos e sem desafios. O que está a acontecer a Assunção Cristas é o normal, é um partido que se sente quase órfão de líder, depois de um líder tão carismático como Paulo Portas. A única possibilidade de afirmação de Assunção Cristas é ir a votos e ter um bom resultado. Se o resultado de Lisboa for mau – e hoje tudo indica que não será –, perto do que teve Paulo Portas, Assunção Cristas terá os dias contados no CDS. O partido está à espera de perceber que votos é que rende este discurso. Um resultado acima ou próximo dos 10%… A eleição do segundo vereador é marcante. O CDS sozinho elegeu sempre um vereador em Lisboa, mesmo depois do fim da coligação de Nuno Krus Abecasis. A marca dos dois dígitos, que é o segundo vereador, é a fronteira. Menos de 10% será sempre uma derrota. Agora já se fala em três vereadores, em 17%, isso é o céu.

Entrar na euforia não é peso demasiado para Assunção Cristas?

Há um risco. O CDS tem a vantagem de nunca ter acreditado em sondagens e sempre entendeu que as sondagens tinham um desconto CDS, portanto, há o risco de estarmos eufóricos. O PSD tem um mau candidato em Lisboa e acho que há uma lição importante para a direita: fica patente que se o CDS e o PSD fossem juntos podiam ganhar a Câmara de Lisboa. Os dois partidos estão com 33% nas sondagens, se estivessem juntos com Assunção Cristas podiam estar a disputar a vitória. Com Assunção Cristas ou Pedro Santana Lopes. Acho que Medina já perdeu a maioria absoluta, seja porque há dois candidatos à esquerda que são bons, seja porque à direita Assunção Cristas tem uma candidatura muito boa. Em eleições legislativas, os dois partidos podem ir separados porque interessa é quem elege mais do que 115 deputados. Nas autárquicas o sistema eleitoral é diferente, o presidente da câmara é sempre o líder do partido mais votado.

Voltando a Loures e voltando ao apoio do CDS a André Ventura. André Ventura não saiu do nada já tinha defendido este discurso em artigos de opinião. Foi má escolha ter apoiado André Ventura desde o início.

Foi mau trabalho de casa. O que me garantiram no CDS é que as pessoas não tinham conhecimento dessas declarações. André Ventura não é independente é um dirigente do PSD, havia algumas garantias de ser alguém que estivesse de acordo com o ideal social-democrata. Ninguém foi ver os artigos que o senhor fez nos últimos dez anos. A decisão de retirada do apoio não foi imediata. Falou-se com o candidato, o PSD e o CDS, houve uma altura que o CDS tentou manter a coligação e convencer o PSD a encontrar outro candidato. O que nós fizemos não foi romper com o PSD, foi reflitam nisto, analisem isto e vamos tentar arranjar outro candidato. E o PSD hesitou. Aliás, o André Ventura foi convidado a desdizer as suas declarações, a esclarecê-las, só que nesse esclarecimento não retirou uma vírgula. E o PSD agora pode ter um problema. Eu acho que Portugal tem especificidades que nos levam a crer que este tipo de discurso não tenha o sucesso que terá noutros países. Portugal tem uma grande tradição de inclusão

Se Paulo Portas fosse líder do CDS, tal como Relvas diz na entrevista, acha que teria a mesma decisão?

Tenho dúvidas, se Paulo Portas fosse líder, que o CDS retirasse o apoio a André Ventura como Assunção Cristas fez. E isso é um mérito de Assunção Cristas. Não teve a mínima hesitação. Eu sou do CDS, cheguei a ser oposição a Paulo Portas, reconhecendo as capacidades que ele tem, tenho dúvidas que esta seria a sua decisão.

A decisão de Assunção Cristas é ideológica ou de afirmação de liderança?

É uma decisão ideológica. Isto não é uma cedência ao politicamente correto e, aliás, tenho repetido e a Assunção também, que, contrariamente ao Bloco de Esquerda que apresentou uma queixa-crime por xenofobia, entendemos que André Ventura tem todo o direito a defender aquilo. André Ventura pode ter as ideias todas erradas, mas não é um criminoso.

Por que razão alguém com nenhuma experiência autárquica, que não vive sequer em Loures, decidiu oferecer-se para ser candidato?

Porque sou do partido e gosto muito do partido. Fui dos que apoiei a decisão desde o início, incomoda-me que, no ano em que Portugal completa 150 anos da abolição da pena de morte, alguém admita a pena de morte. Como tenho noção que é um perigo avançarmos por esse caminho fui dos que admiti desde o princípio avançar, independentemente do resultado. Não tenho grandes ligações a Loures, a minha única ligação é que tenho uma empresa com  um estabelecimento em Moscavide. É uma ligação ténue. Mas disponibilizei-me, sem qualquer dúvida. E sem qualquer necessidade. Acho que o partido reconhece isso e não me vai cobrar uma grande percentagem. Acho que é importante oferecer aos lourenses uma solução à direita que não é aquela preconizada por André Ventura. O CDS é claro, nunca fará nenhum acordo de coligação pós-eleitoral nem com a CDU, nem com o PSD de André Ventura.

O seu discurso tem-se centrado mais na oposição a André Ventura que à CDU…

Tem muito a ver com as perguntas que me fazem. É natural que como houve uma coligação que deixou de existir, as pessoas conduzam muito as entrevistas para isso. Ainda ontem [terça-feira] enviamos uma carta a pedir um compromisso de todos em que baixamos a componente municipal do IRS, que é de 5%, em 0,5% por ano, uma descida suave. Quando acabar o mandato está em 3%, ainda superior Lisboa que é 2,5%, ainda superior a Oeiras que é 2,5%.

Desde 1993 até agora, em eleições autárquicas, o CDS teve no máximo 3,90% em 2001 e já desceu a 2,12 em 2005, os resultados andam sempre em redor dos 3%. Nesta campanha já afirmou que quer ganhar a Ventura esse é um desejo fantasioso ou acredita mesmo nisso?

Nós entendemos que somos a candidatura que melhor representa o espírito da PàF, da coligação que foi feita com o PSD, e a evidência disso é que o nosso último governo, liderado por Pedro Passos Coelho, aprovou em Conselho de Ministros, a Estratégia Nacional para a Integração das Comunidades Ciganas – foi publicada a 23 de abril de 2013, é a resolução 25/2013. Ali apresenta-se uma visão da integração que é totalmente oposta àquela que é defendida por Ventura e daí que eu não compreenda Passos Coelho, que assinou em Diário da República esta resolução, que foi aprovada num governo de coligação, e que foi rasgada à frente das câmaras por André Ventura. Nós somos fiéis a esta resolução e entendemos que as pessoas que apoiaram o governo de coligação e esta resolução devem aderir à nossa proposta e não à de Ventura. No fundo, as pessoas têm de perceber que direita é que querem para Portugal, se querem uma direita do CDS e do PSD, que sempre tiveram nestas últimas décadas, ou se querem romper com esta tradição para ter algo de novo. Quando digo que quero ter mais votos, o que quero é que esta direita, que representa esta resolução 25/2013 tenha mais votos que a direita de André Ventura, que não é a de Passos Coelho.

E se o CDS tiver o mesmo resultado que costuma ter?

É uma derrota. E assumirei as consequências como um dos grandes derrotados da noite.

E se conseguir ser eleito vereador, fica?

Com certeza, com muita honra, orgulho e vontade.

Mas isso mudará a sua vida?

Sim, mudará muito a minha vida. Mas quando assumi esta responsabilidade tive noção das consequências.

Também é uma manobra arriscada sua para ter outra carreira política?

Eu já não sou novo no CDS, tenho 47 anos e podia facilmente ser candidato a uma Assembleia Municipal, numa coligação PSD-CDS em que estaria confortavelmente encostado. Mas para isso não contem comigo. Para mim só vale a pena se for uma coisa mesmo difícil, mesmo complexa. Estou a fazê-la com muito gosto e faço-o independentemente dos resultados. Se os resultadores forem maus, volto à minha vida. Nunca dependi da política, nunca tive nenhum cargo político que fosse remunerado.

Mas tem ambições políticas em termos nacionais?

Todas as pessoas que estão na política devem ter ambições entendo que estou no CDS para servir o meu partido e o país, portanto, em tudo o que o meu partido entender que eu sou útil, eu estarei presente. Estou no CDS para tudo o que o CDS quiser. Se o CDS entender que eu devo ser candidato a Lisboa, sou candidato a Lisboa;  se o CDS entender que deva ser candidato a deputado, sou candidato a deputado, ou se me quiser convidar para um governo, eu estarei disponível. Entendo a filiação num partido com a necessidade de estar disponível. Não é para ir a jantares e encher salas em congressos.