Da doutrinação da ideologia do género ao regresso dos tribunais plenários


O BE pretende corrigir a natureza e oferecer uma carta-branca para qualquer fedelho de 16 anos poder decidir pela sua importante e esclarecida cabecinha qual o género que quer que se passe a aplicar-lhe


Não sendo uma notícia absolutamente nova, ainda assim, acabámos de ser surpreendidos por alguns detalhes da – muito importante, absolutamente urgente e disruptiva – proposta de lei que o BE apresentou ao parlamento referente às alterações à legislação que regula a possibilidade de proceder à mudança de sexo.

Antes de continuar, importará referir que este artigo é de opinião e que eu não subscrevo, não me revejo e tenho absoluta reserva sobre a (recorrente e obsidiante) doutrinação à volta da ideologia do género, e que, dito isto, tal não significa que não reconheça a necessidade, que ninguém nega, de resolver situações relacionadas com casos que não encaixam necessariamente numa classificação historicamente dual.

E, portanto, reconheço a necessidade da existência de uma abordagem legislativa a este tema onde ela faça sentido. Tenho, porém, enormes reservas sobre esta imposição por decreto de doutrinação política em matéria que exige, essencialmente, uma abordagem científica e ética.

O BE, porém, prefere o imediatismo panfletário e as suas grandes causas tresandam, sob piedosos motivos, a morte e à recusa da nossa própria natureza de seres biológicos; para o BE, a vida, a morte, o sexo (ou identidade de género), tudo se resume, se dá, se tira ou muda e define à distância de um decreto; a realidade natural é uma realidade a suprimir.

Fiéis à cartilha totalitária e delirante, segue nesta proposta na renegação, outra vez por decreto, de milhares de anos de evolução da espécie, porque a biologia, certamente, seguirá um percurso ideológico, homofóbico, anti-transgender e inimigo duma data de géneros para além do masculino e do feminino a que cumpre atalhar.

Para tanto, o BE pretende corrigir a natureza e oferecer uma carta-branca para qualquer fedelho de 16 anos poder decidir pela sua importante e esclarecida cabecinha qual o género (diferente daquele que a opressora natureza lhe destinou) que quer que se passe a aplicar-lhe.

Não contente, e ao que parece, os iluminados legisladores ainda pretendem que todos os pais deste país fiquem sujeitos à possibilidade de serem accionados pelos ditos fedelhos, fedelhas ou transfedelhos quando estes, na sua bondade e autonomia – que o BE já decidiu ser, provavelmente, reaccionária e opressora –, possam entender (possibilidade que os iluminados não admitem sequer) que um adolescente de 16 anos não terá experiência de vida nem maturidade, percurso e mais uma data de bagagem relevante para tomar uma decisão com implicações tão drásticas, permanentes e irreversíveis como essa.

Ora, como argumento absolutamente decisivo desta discussão, quando confrontado com o facto de a lei não permitir que o referido menor possa votar, mas lhe poderia permitir que pudesse mudar de sexo (linha de argumentação algo panfletária e a que falta substância, mas cuja imagem é sugestiva), a resposta veio como o verdadeiro pináculo da estupidez e superficialidade que este tema sério mereceu, quando o BE, em resposta a tal objecção, acrescentou que a sua coerência é absoluta porque também defende que o direito a votar deveria ser conferido a partir dos 16 anos… Está, pois, tudo dito!

Realmente, o grau de profundidade destas abordagens parece ser (mas, infelizmente, não é o caso) o de um adolescente de 16 anos sob efeito de psicotrópicos.

Senão, que dizer do segmento da referida proposta que pretende impor aos pais, através de uma acção a intentar contra estes, pelo filho, a obrigação de concordar com a decisão, deste, de mudança de sexo aos 16 anos.

Que mente perversa e totalitária se lembraria de impor aos pais, desta forma, uma participação forçada, violenta e absolutamente despótica numa decisão a que estes se opõem no exercício do seu poder/dever paternal e em consciência?

Que pai não tomará tal decisão perante evidências médicas que o aconselhem?

Mas mais: é absolutamente lícito que, aos 16 anos do seu filho, nenhum pai queira tomar a decisão de colaborar numa decisão que muito legitimamente pode, e muitas vezes deve, querer deixar para o seu filho quando a lei lhe der a possibilidade e autonomia, e a vida, experiência e maturidade, necessárias para tomar tal decisão em absoluta consciência.

São estes os novos ideais da democracia do tempo novo, onde se trocam cativações (que se fingem não ver) pela imposição de ideologias radicais, e em que se passa a possibilitar a todos os portugueses poderem ser livres de aceitar e viver com a doutrina da ideologia do género engolindo-a a bem, ou (se julgam que não querem) a engoli-la imposta pelas sentenças dos tribunais…

Dificilmente se conseguiria mais acabado exemplo de ditadura dos costumes.

É, mutatis mutandis, o BE a abrir escancaradamente a porta ao regresso dos famosos tribunais plenários, para julgar os inimigos da (sua) política da ideologia do género.

 

Advogado na norma8advogados

pf@norma8.pt

Escreve à quinta-feira, sem adopção das regras do acordo ortográfico de 1990