São conhecidos por “mãos leves”, mas os esquemas há muito que recorrem a outras habilidades. Mapas, écharpes e chapéus são alguns dos adereços usados pelos carteiristas de Lisboa para levar a melhor sobre as vítimas. Os roubos de carteiristas na capital parecem não estar a abrandar, antes pelo contrário. Este verão, a PSP já recebeu 1664 queixas, uma subida de 4% face ao mesmo período no ano passado. Dá pelo menos 27 vítimas por dia.
Os dados foram fornecidos ao i pelo Comando Metropolitano da PSP, que adianta que, das denúncias registadas entre 21 de junho e 21 de agosto, 1173 foram feitas por turistas. Os estrangeiros que visitam a capital representam, assim, 70% dos lesados, ainda que tenha havido uma redução de 6% nos furtos que visaram turistas face ao que se verificou no verão passado.
O fenómeno tem sido caracterizado pela polícia, que identifica neste momento quatro pontos da cidade onde ocorrem mais assaltos. Os furtos concentram–se sobretudo no eixo central da cidade (Avenida da Liberdade/Baixa pombalina), na zona de Alfama e Mouraria (em particular no Castelo de S. Jorge, Sé e imediações), em Belém (na envolvente do Mosteiro dos Jerónimos, Torre de Belém e Jardim de Belém) e, por último, nas carreiras dos elétricos que despertam a curiosidade dos turistas. Não só no emblemático 28 da Carris, mas também nas carreiras 12 e 15.
As manobras de diversão fazem parte do modo de atuação e é aí que são usados apetrechos. “É prática do ‘carteirista’ atuar sem que seja notado e, como tal, a sua ação estará sempre encoberta por uma manobra de diversão, com algum objeto que oculte o ato do furto ou com ajuda de terceiros que distraem a vítima para perpetrarem o furto sem serem detetados”, informa o Comando Metropolitano da PSP.
Questionada sobre uma tentativa de assalto recente no Bairro Alto, em que o suspeito tapou a carteira da vítima com um chapéu de palha enquanto remexia nos seus pertences, a PSP explica que não só é usado o chapéu como existe a tática de abrir um mapa nas costas da vítima ou, no caso das “senhoras carteiristas”, usar um lenço para encobrir o furto.
Em bando
Quem são? A PSP não adianta nacionalidades, mas confirma que já foram identificados grupos estrangeiros (homens e mulheres) que atuam na rua, em andamento, e nos transportes públicos. Já os carteiristas portugueses atuam sobretudo nos transportes, diz a mesma fonte.
Nos últimos meses têm sido noticiados casos de carteiristas de nacionalidade romena. Há cerca de uma semana, avançou o “Correio da Manhã”, um agente da PSP de folga travou um grupo que tinha acabado de assaltar um turista norte-americano que se preparava para entrar no elétrico 28. Eram três mulheres de nacionalidade romena e usaram o esquema do “turista perdido”, em que abrem então um mapa nas costas da vítima, para a distrair, enquanto tentam roubar o que estiver mais à mão. Neste caso foi detida a mulher que ficou com a carteira, mas as cúmplices fugiram.
“Os carteiristas atuam normalmente em grupos de três/quatro elementos, o que lhes permite manter uma vigilância à aproximação da polícia. Enquanto um ou dois vigiam, outro encobre a atuação daquele que efetivamente furta a carteira à vítima”, explicou ao i o Comando Metropolitano da PSP, informando ainda que têm sido identificados e detidos vários indivíduos por este tipo de crime. Na última semana, por exemplo, foram detidos cinco carteiristas.
Contudo, muitos regressam pouco tempo depois à rua, sabe o i. Os furtos simples são puníveis com pena de prisão até três anos, pelo que, na maioria dos casos, os suspeitos ficam em liberdade até ao julgamento.
O fenómeno do carteirismo aumentou nos últimos anos no país, embora no ano passado as queixas tenham diminuído ligeiramente. De acordo com o Relatório Anual de Segurança Interna, houve um total de 13 879 participações, quando em 2015 tinha havido um recorde de 14 443 queixas.
As prioridades na política criminal em termos de prevenção para o biénio de 2017/2019, publicadas na semana passada em Diário da República, incluem pela primeira vez o chamado furto de oportunidade, onde se pode incluir o carteirismo, o que não aconteceu nos últimos anos. A prioridade na investigação recai, ainda assim, noutros crimes de maior gravidade, como o terrorismo, violência doméstica, crimes contra a liberdade e a autodeterminação sexual, tráfico humano, cibercriminalidade, corrupção ou criminalidade violenta em ambiente escolar, citando apenas alguns exemplos.
Em matéria de prevenção, a PSP assegura que tem levado a cabo diversas operações policiais direcionadas para este tipo de criminalidade, “intensificando o policiamento nas zonas da cidade onde se verifica maior concentração populacional e, consequentemente, onde se registam a maioria dos furtos”.
A Polícia de Segurança Pública destaca também brochuras distribuídas aos turistas para efeitos de sensibilização que incluem avisos como o facto de os criminosos tentarem ser confundidos com viajantes, estudarem previamente a vítima ou aparentarem ser “pessoas educadas”.
Além dos avisos da polícia e a bordo, por exemplo, dos elétricos, a mensagem vai-se espalhando por outras vias.
Na avaliação do “tram 28” no Tripadvisor, dez comentários alertam para os carteiristas a bordo. O mais recente foi publicado a 18 de julho. “Cheio, pickpockets e difícil tirar fotografias”, escreveu o turista, que deu duas estrelas à experiência depois de ter sido roubado, reconhecendo ainda assim o auxílio da polícia.
Noutro comentário publicado em junho, um turista da Austrália dizia ter apanhado uma jovem a tentar roubar a mala de outros turistas. Também este verão, um turista da Carolina do Norte limitou-se a informar que nem sequer teve a experiência do elétrico por conselho do taxista do aeroporto. “Disse-nos que é famoso pelos carteiristas.”