Quando se dissipar o fumo do contínuo downburst que, para enorme azar da competentíssima estrutura, recém-eleita e empossada, da Protecção Civil, teimou em não largar este executivo, a imagem do país não será animadora.
A verdade é que, mesmo sem condições climatéricas extremas, ou alegados fenómenos atmosféricos invulgares que o IPMA não confirma nem desmente, o país (como de costume, mas muito mais) vai ardendo.
É um caminho algo estafado vir apontar, como no conto em que o rei vai nu, que o país arde este ano, como nos outros, e que, muito provavelmente, só o clima fará o favor aos portugueses de não dependerem dos boys do PS (recém-entronizados nos cargos que o PS permite serem do Estado) para defenderem as suas vidas e as suas propriedades. Matéria na qual, aliás, os resultados (mesmo sem relatórios) já são esclarecedores e alarmantes.
O Estado, nesta nova concepção dos tempos da pós-verdade, é uma agremiação que, ao género de um cientista demente, faz experimentalismo nas estruturas hierárquicas e aguarda entre a incapacidade, o fascínio e a perplexidade – perante o processo causal – que alguém lhe entregue um relatório para perceber o que terá corrido mal.
É difícil conceber – nesta alucinação colectiva – uma denegação mais chocante do exercício do poder executivo.
O governo, e bem, saúda todo e cada um dos números bons que lhe acontecem e abjura – enquanto aguarda o respectivo relatório – todos os factos negativos que possam ocorrer durante a sua governação.
Porque o único plano que o MAI tem para eficazmente acabar com os incêndios é esperar que chova – conhecemos a tendência que o MAI tem para que a meteorologia seja explicação que lhe resolva todas as situações complicadas –, este Verão tem sido particularmente duro para o governo.
Dois anos depois, já não parecendo plausível dizer que a culpa é do anterior governo, Costa e os seus inimputáveis ministros acordaram do sonho.
O fumo dos incêndios ainda mascara, mas mal, fantasmas do passado como o SIRESP, em que o PM e a MAI têm importantes responsabilidades políticas, ou a impreparação da estrutura recém-empossada da Protecção Civil, as cativações dos orçamentos que no início dos incêndios já tinham esgotado o orçamento disponível e tantos outros “pequenos crimes sem castigo”.
É indisfarçável a perplexidade das equipas no terreno com a insustentável leveza (de espírito e de conhecimentos) das estruturas de chefia, e esta contaminação parte também da inimputabilidade com que o PM presenteou os seus ministros e que escondeu atrás da simpática porta-voz da Protecção Civil.
Em qualquer país razoavelmente civilizado, a gravidade dos incêndios e a sua extensão já teriam provocado mudanças, ou o facto de os paióis do exército terem sido pilhados teria consequências.
Esta letargia que o país vive, proporcionada pelo fumo que cobre o país e não assenta, e com os portugueses, por estes dias, virados para o mar, parece a acalmia antes da tempestade.
É que neste país entretido em sobreviver ao seu governo, e deste a sobreviver ao seu país, esquece-se ou omite-se que atrás deste fumo temos, também, a maior capitação de impostos de sempre no Orçamento passado; o maior valor absoluto da dívida externa de sempre; um aumento da dívida líquida de quase dez mil milhões de euros; as maiores cativações de sempre dos orçamentos dos ministérios; e os números do retorno ao desequilíbrio da balança comercial e externa, entre tantos outros factos que o fumo vai ajudando a esconder. Questões estas que já nenhuma chuva lavará.
Vamos ver o que restará quando o fumo finalmente levantar…
Advogado na norma8advogados
pf@norma8.pt
Escreve à quinta-feira, sem adopção das regras do acordo ortográfico de 1990