Tornou-se um padrão: o Daesh, à medida que sofre revezes, perdendo território e combatentes na Síria e no Iraque, desdobra-se em ações terroristas noutras partes do globo. Ao massacre de Paris, em novembro de 2015, seguiram–se Turquia, Bangladesh, Iraque, Iémen, Líbano, Arábia Saudita, de novo a França, em Nice e, simbolicamente, no 14 de Julho, agora Barcelona. Os ataques em Barcelona são um modo doloroso de nos recordarmos que o Daesh é mais do que um califado. Para Raymond Aron, “é dita terrorista uma ação de violência cujos efeitos psicológicos estão fora de proporção com os resultados puramente físicos”.
Aterrorizar é o efeito imediato dessa ação e poucas coisas há que suscitem mais medo, em sociedades livres e seguras como as ocidentais, do que esta nova forma de guerrilha urbana, de um terrorismo do tipo “kill fast and easy”, em que qualquer objeto prosaico como uma viatura pesada, um machado ou uma faca comum é usado de forma aleatória. Qualquer um de nós pode tornar-se um alvo de oportunidade, na esplanada, na rua, na praia. E aterrorizar não é apenas intimidar. É também o convite a reações contraproducentes ou desesperadas. Pelo que importa perceber o terrorismo, os terrorismos – perceber não é sinónimo de complacência, mas de inteligência estratégica –, para podermos combatê-los.
Na segunda metade do século passado, o terrorismo tornou-se num meio de combate comum e disseminado mundialmente. Se inicialmente foi encarado com certa displicência quer por opiniões públicas, quer pelos governos das nações por ele não impactados – a velha questão do que não se passa no meu quintal –, a acentuação da sua periculosidade e a sua internacionalização levaram a que tenha vindo a merecer destaque acrescido nos media, nas relações internacionais e nos estudos no quadro da defesa nacional e da estratégia.
“Verifica-se, porém, que existe alguma confusão nos entendimentos da natureza do fenómeno, profundas discrepâncias nas opiniões sobre o alcance da sua ação e, sobretudo, em parte por causa disso, sobre as formas mais adequadas de o enfrentar”, salienta o major-general Raul Carneiro Martins.
Façamos um pequeno excurso histórico. O termo “terrorismo” foi cunhado durante a Revolução Francesa para definir as práticas dos dirigentes revolucionários liderados por Robespierre. Servindo para a imposição de ideologias desde finais do século xviii, com a Revolução Francesa, foi eleito como instrumento preferencial pelo anarquismo de Bakunine e praticado sistematicamente pelo marxismo-leninismo de Estaline, Pol Pot, Mao Tsé-Tung, e pelo nacional-socialismo de Hitler e de Mussolini. Terrorismo é também a ação do Ku‐Klux‐Klan contra os negros americanos, das Brigadas Vermelhas italianas, da Ação Direta francesa, das FP-25 portuguesas, do Baader-Meinhof alemão, do Exército Vermelho japonês.
Esta diversidade permite-nos extrair duas conclusões: é difícil encontrar denominadores comuns em todos os terrorismos – agentes e alvos são variáveis. Os propósitos políticos – “justiça” versus “injustiça”, violência destinada a combater uma potência, etc. – ou ideológicos são variáveis ou inexistentes. O único denominador comum indiscutível é o medo amplificado. Isto é, e o Daesh sabe fazê-lo com mestria, as vítimas imediatas funcionam “como meros símbolos ou elementos de comunicação”, explica Raul Carneiro Martins. Habitualmente, o terrorista ou a célula aposta em três vetores: espetáculo (procurando, provocando o sensacionalismo e chamando o máximo de atenção para a sua ação), imprevisibilidade (quanto ao local, modus operandi e vítimas) e crueldade (por exemplo, o uso de IED com objetos cortantes ou pregos).
Parte do combate ao terrorismo passa por lhe tirar arena pública e nessa batalha todos temos responsabilidade.
Escreve à segunda-feira