Salgado era quem mandava na PT

Salgado era quem mandava na PT


A revelação é feita por Rafael Mora, antigo administrador da PT e da Ongoing, no seu depoimento na Operação Marquês. Mora diz que Salgado chamava ao edifício do BES o chairman da PT, Henrique Granadeiro, e o CEO, Zeinal Bava, e era lá que eram tomadas as grandes decisões.


As decisões na Portugal Telecom eram tomadas não pelos seus administradores mas por Ricardo Salgado. Neste sentido, realizavam-se no edifício do BES, na Avenida da Liberdade, frequentes reuniões onde se deslocavam Zeinal Bava e Henrique Granadeiro, a mando de Salgado. Quem o diz é Rafael Mora, um espanhol hoje com 52 anos que desempenhou importante papel em todo este processo, tendo sido o braço-direito de Nuno Vasconcellos na Ongoing e administrador da própria PT em 2008.

Era «o Dr. Ricardo Salgado quem efetivamente definia as decisões a tomar no âmbito da PT, através de inúmeras reuniões que eram mantidas na sede do BES, onde se deslocavam quer o Zeinal Bava, quer o Henrique Granadeiro», disse Mora no DCIAP, ouvido como testemunha.

Rafael Mora esclareceu que foi Ricardo Salgado quem aconselhou Nuno Vasconcellos a comprar 2% da PT, numa altura muito quente em que se perfilavam grandes negócios envolvendo este grupo. Também foi o próprio Salgado que vendeu esses 2% a Vasconcellos, os quais pertenciam a Patrick Monteiro de Barros mas tinham sido cedidos ao BES como garantia de um negócio com o Crédit Suisse.

Vasconcellos e Sócrates ajudam Salgado a chumbar OPA da Sonae

Nuno Vasconcellos tornou-se então administrador da Portugal Telecom e já usou a sua posição no grupo para votar contra a OPA da Sonae sobre a PT. 

A OPA acabaria por ser chumbada – num processo em que José Sócrates, então primeiro-ministro, teria a sua primeira intervenção (que haveria de revelar-se calamitosa). 

«O Governo deu instruções» para que a Caixa Geral de Depósitos votasse contra a OPA da Sonae sobre a PT – acusaria depois o líder da Sonae, Belmiro de Azevedo, considerando que Sócrates «portou-se mal» neste caso. E adiantou que desde aí, «nunca mais falou» com o primeiro-ministro: «Não tenho interesse e sou correspondido». 
A intrusão de Sócrates neste negócio, dando instruções à CGD (então dirigida por Santos Ferreira e Armando Vara) para chumbar a OPA, viriam mais tarde a ser amplamente confirmadas por outras fontes, e a investigação acredita que o ex-primeiro-ministro recebeu chorudas ‘luvas’ por essa intervenção.  

Salgado e Granadeiro mantinham contactos com Sócrates 

No seu interrogatório no DCIAP como testemunha, Rafael Mora confirmou ainda que, a partir dessa altura, o processo da PT – desde a venda da Vivo à compra da Oi – foi sempre acompanhado por José Sócrates, sendo os contactos estabelecidos pelo próprio Ricardo Salgado ou por Henrique Granadeiro. 

Sócrates mostrou-se de início desfavorável à venda da participação da PT na Vivo à espanhola Telefónica, e chegou a usar a golden share para chumbar o negócio. Mas os investigadores admitem ter-se tratado de uma tática para fazer subir o preço pago pela Telefónica. E para forçar a compra, a seguir, da Oi. De facto, no seu depoimento, Rafael Mora adiantou que Sócrates só se mostrou recetivo à venda da Vivo depois de assegurar a aquisição de uma posição na Oi. 
A participação na Vivo seria vendida à Telefónica por 7,5 mil milhões de euros, e a posição na Oi seria adquirida por 3,75 mil milhões, valor que estaria fortemente inflacionado. 

Os lucros resultantes da venda da Vivo foram distribuídos pelos acionistas da PT, o que interessava sobremaneira a Salgado, que já lutava com enormes dificuldades financeiras. E a compra da Oi também lhe interessava, pois – como o SOL noticiou recentemente – o BES tinha interesses na Oi através da Ongoing. O negócio da Oi interessava igualmente sobremaneira a Lula da Silva, pois era uma empresa cheia de problemas onde o Estado brasileiro era acionista.

A investigação pensa que estes dois negócios terão rendido muitos milhões de luvas aos que neles participaram.
 No seu depoimento, Rafael Mora referiu-se ainda ao contencioso existente entre Nuno Vasconcellos, dono da Ongoing, e Francisco Pinto Balsemão, patrão da Impresa. 

Salgado faria ‘jogo duplo’ com Vasconcellos e Balsemão

Apesar de Nuno Vasconcellos ser filho de Luiz Vasconcellos – ex-braço direito de Balsemão e seu amigo de longos anos –, isso não o impediu de entrar em guerra com ele. Vasconcellos tentou apoderar-se do controlo do grupo de comunicação social liderado por Balsemão, que integra a SIC, o Expresso, a Visão e a Caras, entre outros meios.
Mora revelou que, no aceso desta guerra, Vasconcellos sentiu-se de certa forma ‘traído’ quando soube que a PT pagava 25 milhões de euros por ano à Impresa, por publicidade e conteúdos dos canais por cabo. Ou seja, embora Vasconcelos fosse sócio da PT e aliado de Salgado, estes faziam ‘jogo duplo’, ajudando Balsemão. 

As relações entre estes homens seriam, aliás, marcadas por outras ‘deslealdades’. Mora contou, por exemplo, que Nuno Vasconcellos, depois de se tornar dono de 2% da PT, comprou mais 3% aparentemente à revelia de Salgado e com um empréstimo do BCP.