1. Depois de um longo período de agonia em que jornais como o i, o “SOL” e pouco mais do que o “Expresso” foram denunciando as trapaças e má gestão no grupo BES/GES, fez três anos que o banco afundado por Salgado foi objeto de uma resolução determinada pelo Banco de Portugal, que atuou depois de ter sido extremamente complacente durante muito tempo.
Essa complacência estendeu-se ao governo de então (et pour cause ao anterior de Sócrates), que chegou a decidir sobre a matéria com um primeiro-ministro a banhos na Manta Rota, comentando o assunto de havaianas à entrada da praia. Isto depois de um conselho de ministros virtual presidido por Portas e feito por email com assinatura eletrónica por parte de alguns ministros que dizem não terem percebido bem o que se passava, como foi o caso de Assunção Cristas, a banhos longe das suas funções piscícolas, hortícolas e florestais.
No caso BES/GES falhou tudo até ali e o mais triste e mais grave é que falhou tudo desde então, não havendo sequer uma noção mínima do que já custou aos portugueses a incompetência e os esquemas viciados que envolveram a organização que arrastou na sua queda a própria PT e muitas outras empresas.
Em custos diretos do banco, é pouco falar-se em 25 mil milhões, e em indiretos há especialistas que asseguram que o saldo será superior a 150 mil milhões, que serão pagos por contribuintes, pequenos acionistas e outros espoliados, além dos depositantes nos outros bancos que constituem o fundo de resolução. No fundo, são sempre os mesmos, visto que toda a gente é contribuinte mesmo que indireto e toda a gente tem conta num banco, até crianças acabadas de nascer.
O enorme rombo que houve no banco permanece ainda hoje um mistério, na medida em que ninguém percebe para onde foi o dinheiro e quem lucrou com o naufrágio comandado por Salgado e pelos seus comparsas familiares, de negócios ou da política. Levaram sumiço milhares de milhões do BES/GES, mas eles não deixaram de existir. Afinal, onde estão? Sabe-se quem os delapidou e quem tem de os pagar, mas não se sabe quem os embolsou e escondeu. Houve uma resolução (no sentido de acabar com a coisa), mas nada foi resolvido (no sentido de tratar dos problemas e reparar o esbulho).
O Novo Banco, que sucedeu ao BES, não ata nem desata apesar de ter tido duas boas administrações e de haver um cidadão que foi sub-repticiamente contratado quando ainda estava no governo para o vender, recebendo a quantia mensal de 35 mil euros. Pois bem, nem mesmo Sérgio Monteiro, apresentado como providencial, conseguiu desfazer–se do BES bom, quanto mais do mau. Ou seja, não concretizou uma venda do Estado a privados, embora antes de ser governante tivesse conseguido várias operações em sentido inverso.
No domínio da justiça, a coisa não está melhor. Ou melhor, está a correr muito bem para quem tem culpa e mal para quem foi espoliado. Não há acusados, não há ninguém julgado, não houve sequer uma prisão preventiva ou mesmo domiciliária (mesmo em mansão apalaçada) de nenhum dos presumíveis cabecilhas. Houve, reconheça-se, a aplicação de cauções pesadas para a bitola de qualquer cidadão, mas que não o são naqueles casos concretos. Mas nada de pessimismos. Digamos que à volta do BES está tudo a correr lindamente na justiça, com base no pressuposto de que, quando é lenta, beneficia os culpados e prejudica os inocentes. Já quando é rápida, é boa para os inocentes e não beneficia os culpados. Clarinho como água.
Três anos depois está, portanto, praticamente tudo ainda por tratar no caso BES/GES. Veremos quantos mais três anos irão passar até que algo se resolva e haja um julgamento, isto para não falar de uma sentença definitiva. Com a seca que por aí anda, é mais provável que acabe a água em muitos rios. Mas não faz mal. A malta paga e não reclama, seja nos impostos ou nas comissões bancárias. O melhor é não pensar nisso até porque é verão, há sol e já há campeonato de futebol e grandes programas de televisão públicos e privados para comentar esse tema essencial. Cá vamos cantando e rindo enquanto o turismo nos safa. Pourvu que ça dure…
2. A propósito do BES, foi gratificante e até comovente saber que apareceu um espontâneo hiperbilionário português, de sua graça Pedro Almeida, senhor, segundo rezam as notícias, de 5 mil milhões de euros (mais que Américo Amorim), que adquiriu a Herdade da Comporta. A nossa imprensa de investigação noticiou o facto com júbilo e explicou que a criatura tinha feito fortuna nos petróleos, que tinha ligações a Monteiro de Barros e ao próprio Grupo Espírito Santo, tendo grande parte da sua atividade sediada na Suíça, precisamente onde o Salgado tinha importantes interesses. Só falta mesmo dar-se a coincidência de a intermediação ter sido feita por alguém ligado à família.
Jornalista