Está tudo bem


Eu saltei. Saltei sem rede, ciente de que, mesmo que me custe, mesmo que não goste de todos os meus estados, mesmo que não queira a ansiedade de pensar em amanhã, mesmo que goste mais de mim presente, apeteceu-me atirar-me para o futuro


Eu saltei. Saltei sem rede, ciente de que, mesmo que me custe, mesmo que não goste de todos os meus estados, mesmo que não queira a ansiedade de pensar em amanhã, mesmo que goste mais de mim presente, apeteceu-me atirar-me para o futuro.

Se há coisa sobre a qual penso, escrevo e falo é a esta minha urgente vontade de aprender a viver no agora. No presente. Tem sido um caminho difícil de percorrer porque me esqueço demasiadas vezes de como é que se faz. Se pensarmos sobre isto, percebemos que é tão suave e ténue a linha que separa o sonho da projeção. Se, por um lado, “o sonho comanda a vida” e é dele que se alimenta a fé, por outro, a projeção é tão perigosa porque é ela que nos empurra para o futuro e nos afasta do presente. O futuro. O perigoso futuro que não existe, que não tem forma, nem data, nem espaço, mas que invocamos como se fosse real. Como se fosse ele que vivêssemos neste instante.

Escrevo-vos com a consciência de que não sou um exemplo a seguir. Não é regular nem sábia esta minha forma de estar. Porque aquilo em que acredito não é aquilo que cumpro sempre.

E está tudo bem.

Nos primeiros dias de agosto, apresentar-vos-ei o meu novo projeto. E se o faço é porque o sonhei, porque o quis, mas tenho a plena perceção de que idealizá–lo me afastou algumas vezes do agora. Fi-lo conscientemente. É como se, às vezes, conduzisse em contramão, sem peso de consciência. Vou para o lado contrário porque, nesse momento, é o que eu quero. Durante estes meses, escolhi a projeção, o amanhã, o futuro, porque sim. Contei pelas mãos (como fazem as crianças) os dias que faltavam para que o pudesse apresentar ao mundo. Imaginei tantas vezes o dia “D” mesmo que isso implicasse não aproveitar o único dia que era verdadeiro meu – o de hoje.

E está tudo bem.

Ontem, ao pegar num dos meus livros favoritos, “O Poder do Agora”, li sobre a importância da entrega a tudo aquilo que sentes. Se te sentes inativo, entrega-te a essa inatividade, sem resistência, aceitando-a que a sentes, e só dessa forma te libertarás dela. Porque terá menos peso em ti. E se eu, nestes últimos tempos, tenho tido dificuldade em viver cada dia com a responsabilidade de que é só esse dia que interessa, porque mais nada existe (como tanto aprendi com o Pedro), devo aceitar – devo aceitar que me tem sido difícil estar só aqui. É mais difícil ainda quando as pessoas que te rodeiam te estimulam, constantemente, a que te mandes para lá. Perguntam-te por resultados, por metas, por objetivos. Querem que lhes confirmes um plano, querem respostas, querem que saibas. Fazem-no por amor, querem-te bem, mas querem também alívio. Querem que os descanses, que lhes digas coisas que os contentem, que os acalmem. E tu tens de saber se, ao dar-
-lhes as respostas, arrancas conclusões de ti à força que te definirão para sempre sem que tu queiras. Os outros projetam-te, mas tu só saltas se quiseres. Fá-lo por ti.

E está tudo bem.

Eu saltei. Saltei sem rede, ciente de que, mesmo que me custe, mesmo que não goste de todos os meus estados, mesmo que não queira a ansiedade de pensar em amanhã, mesmo que goste mais de mim presente, apeteceu-me atirar-me para o futuro. Fiquei mais ausente, mais ansiosa, mais aluada, mas estive sempre consciente dessa escolha.
E fi-lo sempre, sempre por mim.

E está tudo bem.

Não, não quero contar os dias pelos dedos das mãos. Quero viver os dias. Mas quero também saber aceitar quando sou outra coisa.

Porque está tudo bem.

 

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