1. Pedrógão Grande foi há um mês. Aos dias do horror marcados por graves falhas operacionais não explicadas sucederam–se os socorros, os afetos, os reconfortos, as ajudas, os concertos e os peditórios. Trinta dias depois da tragédia e de promessas renovadas para efeitos de efeméride, constata-se que estamos na fase que mais nos caracteriza: a da ineficácia, da descoordenação, da fuga às responsabilidades, das verbas geridas por não se sabe quem, da falha dos meios materiais e humanos de apoio e da inexistência de adequados instrumentos políticos práticos. Isto para não falar da gigantesca burocracia que tudo tritura, ou ainda dos inquéritos que não começam e que, possivelmente, nunca servirão para nada, dos seguros que assobiam para o lado, enquanto oposição e governo fazem demagogia a rodos à volta da desgraça alheia. Só Marcelo pode fazer com que as coisas não fiquem como sempre têm ficado em situações semelhantes. Veremos se o Presidente vai mesmo impor um apuramento total das responsabilidades doa a quem doer, como ele garantiu. Para o conseguir terá eventualmente de usar os seus poderes concretos, e não apenas a sua influência verbal. Há muitos anos houve entre nós uma Operação Pirâmide que provou que a boa vontade não chega para resolver as coisas. Mais do mesmo, não, obrigado!
2. António Costa tinha ganho em ficar calado em vez de atacar a Altice no recente debate do estado da nação e nos propósitos que retomou, mais moderadamente, anteontem. Desde logo porque a companhia franco-israelita só comprou a PT porque o próprio PS, através do governo de Sócrates, permitiu uma série de operações que desvalorizaram a companhia para financiar o Grupo Espírito Santo.
De facto, foram combinações entre Sócrates, Salgado, Bava, Granadeiro e mais uns quantos que levaram à venda da PT, a mais dinâmica e prestigiada empresa portuguesa, erguida por milhares de pessoas dedicadas até surgirem certas aves de rapina. Para ser rigoroso, é preciso dizer que o que a Altice comprou e salvou era uma ruína comparada com o que a PT já tinha sido. Por isso mesmo, Costa deveria saber melhor que ninguém que se, por exemplo, houve falhas técnicas em Pedrógão que se repetiram em Alijó, talvez certas razões de fundo residam no muito que se passou para trás, com a destruição de valor da empresa ou até por decisões que ele próprio tomou quando comprou e renegociou o SIRESP enquanto ministro. Mas, se, porventura, o ataque de Costa à Altice tivesse mais a ver com reservas à compra da TVI (uma operação de enorme dimensão e revolucionária), então também não tinha razão. É que a mudança de donos resultou da insolvência do grupo espanhol Prisa, que controla o “El País” e que pertence a socialistas. Portanto, se queria queixar-se, António Costa deveria ter ligado para Madrid e, simultaneamente, admoestar e remodelar alguns dos seus ministros que integraram o governo devastador de José Sócrates, como Santos Silva e Vieira da Silva, para citar apenas Silvas.
Finalmente, se a indignação do primeiro-ministro viesse da alegada existência de pressões para despedir trabalhadores na Altice/PT, então talvez fosse conveniente que tivesse olhado para a Caixa Geral de Depósitos (CGD), onde há registo de pressões tremendas sobre os funcionários que são abordados para sair. Dessas supostas rescisões amigáveis no banco público, onde o governo manda, ninguém fala, nem mesmo o Bloco ou o PCP. Lá diz o povo que uma coisa é a Olívia empregada e outra a Olívia patroa.
3. Já aqui se escreveu que a construção da União Europeia é o mais bonito e mais difícil projeto político concretizado desde que há democracia. Nenhum outro se lhe compara. Um dos exemplos dessa edificação é o programa Erasmus, destinado a estudantes universitários e que agora completou 30 anos. Nessas três décadas, muitos milhares de jovens, hoje alguns já quarentões, estudaram fora, conheceram novas paragens, novas abordagens e abriram as suas cabeças a realidades diferentes, ganhando conhecimentos e mudando mentalidades individuais e coletivas. O projeto Erasmus foi e é importante para todos os países da União. Deu azo a mobilidade, a redes profissionais e contactos, a relações de amizade permanentes e, não raras vezes, à constituição de famílias improváveis. O Erasmus foi um contributo fundamental para a caminhada europeia comum. Um orgulho!
4. André Caldas é o recandidato do PS à junta de Alvalade, além de ser chefe de gabinete de Mário Centeno, o que já de si pode constituir uma séria limitação de disponibilidade para o exercício do mandato. A essa circunstância profissional soma-se a bizarria de morar no outro lado da cidade, concretamente no Alto do Restelo, sendo, portanto, freguês de Belém. Agora que as freguesias urbanas de Lisboa têm dimensões geográficas e humanas tão consideráveis, há certas coisas que não têm grande justificação política.
Jornalista