Exportar miúdos cedo demais Há “clubes vendedores”


Os empresários correm o mesmo risco. Na ânsia de fazerem dinheiro rapidamente, poderão vir a ser vítimas da sua ganância, prejudicando outros negócios. Jorge Mendes é respeitado porque vendeu Ronaldo e mais alguns craques. Mas se começar a transacionar jogadores que não se impõem, a sua estrela empalidecerá


Há “clubes vendedores” e “clubes compradores”. Os clubes portugueses são necessariamente vendedores, isto é, têm de vender os melhores jogadores para se equilibrarem financeiramente.

Essas vendas podem ser de futebolistas da formação ou de futebolistas vindos de países pobres, africanos ou latino-americanos, que os clubes portugueses descobrem, valorizam e apresentam na montra europeia, vendendo-os com grande margem de lucro. Os exemplos não têm fim, desde Di María a Pepe ou James Rodríguez.

Hoje – pensando nas possíveis idas para o estrangeiro do benfiquista Nélson Semedo ou do talento leonino Gelson Martins – ocupo-me dos jovens formados nos clubes.

Um dos primeiros casos que recordo é Simão Sabrosa, vendido muito novo ao Barcelona. Não se impôs e regressou a Portugal. Se tivesse esperado uma época ou duas, talvez a sua carreira tivesse sido diferente.

Depois dele foram muitos outros: Ronaldo, Bruma, André Gomes, Bernardo Silva, João Cancelo, Ivan Cavaleiro, Gonçalo Guedes, Renato Sanches…

O grande perigo desta “exportação de miúdos” é ser prematura. O caso de Bruma é paradigmático: perdeu–se, provavelmente, um grande jogador. E Gonçalo Guedes ou Renato Sanches também estão em risco de se perder. O pior que pode acontecer a um jovem que começa a despontar é não jogar. É, semana após semana, assistir ao jogo no banco. É ver as substituições a esgotar-se e ele não entrar. Esta ansiedade mata. Retira a confiança e a autoestima. Renato Sanches é hoje uma sombra do jogador de há um ano.

Mas, sendo mau para os próprios, também para os clubes é um erro venderem jogadores cedo demais. Primeiro, porque os poderiam vender muito melhor um ano ou dois mais tarde. Depois, porque a venda de jogadores que não se afirmam nos clubes para onde vão esfriará o interesse por futuras transferências. Se Gonçalo Guedes e Renato não conseguirem impor-se, é natural que o PSG e o Bayern não voltem a comprar tão cedo jogadores ao Benfica.

E os empresários correm o mesmo risco. Na ânsia de fazerem dinheiro rapidamente, poderão vir a ser vítimas da sua ganância, prejudicando outros negócios. Jorge Mendes é respeitado porque vendeu Ronaldo e mais alguns craques. Mas se começar a transacionar jogadores que não se impõem, a sua estrela empalidecerá.

Eu sei que os próprios jogadores, embriagados por épocas de sucesso, são muitas vezes os primeiros a forçar a saída. Mas é preciso fazer pedagogia e levá-los a perceber as desvantagens de partirem antes de tempo.

Resumindo, as saídas prematuras de jovens futebolistas para o estrangeiro são más para todos: para os clubes que os compram, para os clubes que os vendem, para os empresários e para os próprios jogadores. A ansiedade e a ganância não são boas conselheiras.