Se não fosse a gravidade e tragédia de tudo isto, até podíamos estar perante um belo guião de uma comédia de Mel Brooks. Uma espécie de “Balbúrdia no Oeste”, mas à portuguesa.
Arde uma localidade do nosso território. Pelos menos 64 homens, mulheres, crianças, famílias perderam a vida a tentar fugir das chamas numa estrada para a qual foram encaminhados em circunstâncias que, passados todos estes dias, ninguém nos soube explicar. As autoridades apressadamente culpam, com todas a certezas da incerteza do momento, a meteorologia, mas passados poucos dias começam a admitir a possibilidade de intervenção humana.
Os dias passam e as explicações continuam sem aparecer. A ministra vai ao parlamento. “O que aconteceu (em Pedrógão Grande) foi um grande incêndio.” A plateia maioritária espanta-se com a novidade, mas explicações sobre o porquê daquelas mortes não aparecem. Dizem, lá do alto, que “não é tempo” disso. É tempo de outras coisas. De abraços, beijos e lágrimas. É verdade que é. Mas já vai sendo tempo também de termos uma explicação sobre esta tragédia humana que nos atormenta pelo que sucedeu, mas também porque não escapamos à invariável pergunta: “E se fosse connosco?”
Logo vêm as tentativas de encontrar explicações nas características da floresta. “São os eucaliptos!”, exclamam alguns entendidos, com a política a cheirar-lhes o rasto. Esquecem-se é que as características da floresta são as mesmas há décadas, que todos os anos há incêndios, mas que foi só em Pedrógão Grande que morreram 64 pessoas. Porquê? Passadas duas semanas, ainda não sabemos. O presidente da ANPC vai à televisão dizer que tudo correu dentro da normalidade. Mas sabemos pela comunicação social que se passaram horas desde as primeiras chamadas até o auxílio ser devidamente prestado.
Depois de tudo, ainda furtam de um paiol militar um número indeterminado de armamento. O estado da arte começa a ser conhecido. Faltam meios, falta segurança, falta tudo. Na gaveta do ministro encontram-se uns papéis! Parece que são um tal concurso para reforço da segurança do recinto, mas que andou fechado durante dois anos. O concurso é publicado dois dias depois do incidente. Com data muito anterior. A culpa acabará por ser da funcionária do Diário da República mas, até se chegar a essa conclusão, que merecerá certamente uma longa investigação, a sensação de insegurança instala-se na comunidade.
O ministro diz que é grave. Tem razão. É muito grave. Mas diz também que o destino do armamento pode ser o terrorismo, sem perceber que há alturas em que o silêncio é mesmo o melhor conselheiro. Lá do alto, voltam a dizer-nos, “agora não é oportuno”, e provavelmente o assunto cairá no esquecimento.
Vivemos num tempo de inoportunidade crónica. Razão tinha Salgueiro Maia: “Meus senhores, como todos sabem, há diversas modalidades de Estado: os Estados sociais, os corporativos e o estado a que chegámos.” E este é o estado a que nós chegámos.
Vice-presidente do grupo parlamentar do PSD. Docente universitário, Escreve à segunda-feira