Construção. Sindicato ameaça com greve se não for feita revisão salarial

Construção. Sindicato ameaça com greve se não for feita revisão salarial


Em cima da mesa está um aumento salarial de 70 euros para todos os operários qualificados e subida do subsídio de alimentação para 8,50 euros/dia. Associações estão contra


O setor da construção civil pode vir a parar caso as entidades patronais não aceitem o aumento salarial de 70 euros para os trabalhadores qualificados e a subida do subsídio de alimentação de 5,65 para 8,50 euros por dia. A reivindicação é feita pelo sindicato do setor, que ameaça partir para uma greve nacional se as exigências não forem aceites. 

Para o presidente do sindicato, Albano Ribeiro, a explicação é simples: “Os trabalhadores do setor, desde o mais ao menos qualificado, têm de ver valorizado o seu trabalho com salários que reflitam a atual situação do setor.” Albano Ribeiro garante que está disponível para negociar as atualizações salariais com o patronato até ao final das férias.
“O setor da construção está a contribuir para o crescimento económico, logo, não é humano que um operário qualificado, como um carpinteiro de primeira, tenha um salário de 557 euros, igual a um operário não qualificado ou um servente”, sustentou o responsável.

O argumento não parece convencer as associações do setor. Apesar de admitir que a crise da construção penalizou fortemente os trabalhadores e as empresas – com destruição de emprego e de empresas, a par da redução do rendimento e dos salários –, Ricardo Gomes, presidente da Associação de Empresas de Construção e Obras Públicas e Serviços (AECOPS), defende que não sejam tomadas medidas que comprometam a saída da crise.
“Agora que o setor dá os primeiros sinais de recuperação, é indispensável criar as condições para a sua recuperação sustentada, evitando uma subida acentuada dos custos e dos preços e o surgimento de bolhas imobiliárias que comprometam a saída da crise. Neste contexto, o aumento dos salários deve acompanhar o crescimento da produtividade, sob pena de vir a comprometer a recuperação económica do setor e do próprio emprego”, diz ao i.

Já o presidente da AICCOPN, Reis Campos, lembra que o emprego no setor tem vindo a crescer de forma contínua nos últimos oito trimestres, tendo já gerado 42 mil postos de trabalho. “Já transmitimos ao sindicato que qualquer aumento salarial deveria ser perspetivado no âmbito de uma revisão global das condições previstas na contratação coletiva de trabalho”, acrescentando ainda que “é um exercício que estamos dispostos a fazer, sem perder de vista que discutir aumentos nominais de salários sem acautelar aumentos proporcionais de competitividade é colocar as empresas e o emprego em risco”, revelou ao i.

No entanto, para o sindicato, esta melhoria das remunerações poderia também “permitir o regresso” de alguns dos trabalhadores que, nos últimos seis anos, saíram do país para “ganhar quatro vezes mais do que ganhavam em Portugal”.

Regresso

O certo é que os trabalhadores portugueses da construção civil que estavam a trabalhar fora do país já estão a regressar a Portugal. No pico da crise trabalhavam cerca de 50 mil noutros mercados – num setor que contava com 230 mil –, principalmente o angolano, mas com a crise acabaram por voltar ao país. A garantia foi dada ao i pelas associações do setor, apesar de a AECOPS admitir que este número poderá ser ainda mais elevado, uma vez que os 50 mil eram apenas os que estavam inscritos na Segurança Social.

A opinião é unânime junto das duas associações: este regresso não se deve à recuperação do setor em Portugal que, ainda assim, começou a dar alguns sinais de vitalidade, mas à crise deste setor em países onde havia muitos trabalhadores destacados, como é o caso de Angola e da América Latina. 

Daí as associações do setor destacarem que a presença externa da construção portuguesa continua a alargar-se para áreas com elevado potencial, como é o caso de parte muito significativa da América Latina – países como o Peru, a Colômbia e o Chile. “Além de continuarmos com um posicionamento muito forte nos nossos mercados tradicionais, designadamente os PALOP, estamos a crescer de uma forma verdadeiramente global. Portugal é, hoje, o segundo país europeu com maior presença em África e o terceiro na América Latina”, revela ao i Reis Campos, presidente da AICCOPN. 

Já Ricardo Gomes garante que, “perante a ainda incipiente recuperação em Portugal, o dinamismo da construção na Europa ainda continua a ser um destino para muitos trabalhadores portugueses”, salienta. 
A verdade é que o setor tem vindo a dar sinais de recuperação, impulsionado, em grande parte, pelo mercado da reabilitação urbana, que só em maio cresceu 22%. As associações contactadas pelo i começam a suspirar de alívio depois do longo período de recessão e acreditam que a atividade deverá consolidar-se nos próximos meses.

“O aumento da procura decorre, por um lado, da ligeira melhoria da conjuntura económica nacional, com a subida do rendimento, a redução do desemprego e a expansão do crédito à habitação, com taxas de juro e spreads reduzidos”, lembrou Ricardo Gomes, justificando esta tendência também com o aumento da procura externa e do número de estrangeiros que procuram adquirir casa em Portugal. “É um movimento que acompanha o forte crescimento do turismo que, por sua vez, também torna atraente o investimento em casas reabilitadas para aluguer temporário”, salientou. 

No entanto, a AICCOPN lembra que esta dinâmica é mais expressiva em determinadas zonas das grandes cidades, em especial de Lisboa e do Porto. Reis Campos acredita que ainda há muito espaço para crescer nestas duas cidades, uma vez que a reabilitação urbana ainda é um fenómeno localizado. “A reabilitação ainda está longe de atingir a escala e, sobretudo, a abrangência territorial necessárias. Trata-se de um mercado que, de acordo com as nossas estimativas, ascende a 24 mil milhões de euros”, concluiu.