Bom, eu compreendo que se está a celebrar a derradeira noite de liberdade de uma vida até aí regida pela doce libertinagem de quem não deve nada a ninguém. Ok, tudo certo. Mesmo o namoro, compromisso de amor entre duas pessoas não encerra em si o que o casamento parece trazer, a monogamia definitiva até que a morte nos separe ou algo do género. Nunca fui bom com as liturgias católicas sobre a união eterna entre dois seres pensantes mas parece ser qualquer coisa mais ou menos pintada com estas cores.
Mas deveria mesmo ser assim? Bom… quem sou eu para dizer ou escrever algo sobre o assunto? Afinal não passo de um zuavo flibusteiro desta vidinha que para aqui anda aos trambolhões como diria o capitão Haddock das Aventuras do Tintin por entre duas garrafas de rum.
Ainda assim arrisco debruçar-me um pouco sobre esta temática até porque não tenho mais nada para fazer e como o ensopado de borrego está a apurar no fogão em lume brando ainda me resta uma boa meia horinha para estar por aqui a escrever parvoíces.
Uma coisa é certa, as mulheres e os homens têm conceitos bem diferentes sobre a celebração em questão e vocês sabem do que eu estou para aqui a dedilhar não sabem meus agradáveis velhacos de circunstância?
Vamos por partes então.
O verão aproxima-se e as pessoas começam a casar-se como se não houvesse amanhã. O que não faz assim tanto sentido porque geralmente está um calor dos diabos e, pelo menos para o homem que se aperalta de fato e talvez gravata para os mais totós significa um dia inteiro a transpirar os pecados por entre copos de martini, vinho branco, tinto, gin, whisky, vodka, champanhe e basicamente toda e qualquer bebida alcoólica que sirva para despejar a sobriedade pelo cano abaixo. No inverno a empreitada se calhar fazia-se melhor mas isso serão contas de outro rosário.
Voltando às despedidas de solteiro…
Para a mulher.
Juntam-se todas num restaurante, com modelitos a fazer pandã uns com os outros. Claro que isto é tudo combinado para aí com 40 meses de antecedência, nada é deixado ao acaso, se o dress code é laranja e branco com lantejoulas caju, vai tudo corrido a laranja e branco com lantejoulas caju. E ai de quem quebrar esta regra sepulcral, a amiga em questão será condenada ao ostracismo durante pelo menos duas vidas e meia. Enfim… Estão a imaginar o cenário? Todas sentadinhas no restaurante com os seus vestidos laranja e branco com lantejoulas caju adquiridos possivelmente nos saldos do Corte Inglês? Sim, eu sei, parece um congresso feminista do PSD mas reparem que não fui eu quem escolheu a roupa. Adiante…como é que nós incautos voyeures deste cenário dantesco distinguimos a noiva dos demais geladinhos Solero que para ali estão sentados? Fácil. A noiva tem uma tiara com uma pila enfiada na cabeça. Respirem fundo… claro que estão a pensar por que raio é que a noiva tem uma pila de esponja a baloiçar entre os olhos? Eu não faço ideia… juro que me ultrapassa esta metáfora do falo na mona como fim de uma vida de solteira. Mas elas lá saberão o significado deste hino ao bom gosto. Elas lá saberão…
O jantar avança e os temas de conversa são basicamente sempre os mesmos, os antigos namorados, o vestido de noiva, a lua-de-mel numa praia qualquer nos trópicos com pulseira que dá direito a comer e a beber até cair para o lado e o empregado de mesa espadaúdo que até levava um encosto de bateria antes de a noite findar.
Mais tarde vão para uma discoteca, ao magote, e com a pila já a saltar de cabeça em cabeça das demais amigas, azucrinam a cabeça ao DJ até ele meter aquela música, aquela cançoneta definitiva das despedidas de solteiro, sim…já adivinharam qual é? Essa mesmo… o Time of My Life do Dirty Dancing com o Patrick Swaize todo gingão a menear a anca de encontro à Jennifer Grey. E É NESSE MOMENTO QUE ELAS GRITAM QUE NEM UMAS DESALMADAS! Pois… todas as mulheres querem casar com o Patrick Swaize porque no fundo sabem que o seu futuro marido já tem um floreado de pança, umas entradas a avançar pela testa e mexe-se tão bem na pista de dança como uma empilhadora a gás num armazém de contraplacados. Enfim não se pode ter tudo. Ficam as memórias do que poderia ser.
Para o homem.
Bom… os homens… juntam-se no restaurante, vestidos assim à parva, embebedam-se até à desgraça, falam de miúdas e de miúdas e de miúdas e que como nos seus tempos de solteiros varreram tudo o que lhes apareceu pela frente e que agora essa vida mansa chegou ao fim por causa do raio da anilha no dedo (ou talvez não…) Vão para uma danceteria de meninas, continuam a beber para lá da desgraça, há varão à mistura, silicone, palmadas nas bimbas, fio-dental e nudez para o noivo a quem lhe é concedido um fogacho de ramboia com uma profissional do ramo da felicidade momentânea. E É NESSE MOMENTO QUE ELES GRUNHEM QUE NEM UNS DESALMADOS! Pois… todos os homens querem casar com a Demi Moore do Striptease porque no fundo sabem que a sua futura mulher já sente os efeitos da gravidade no corpo, veste-se como uma bibliotecária ao domingo e fio-dental… como direi… já foi chão que deu uvas após os primeiros dois meses de namoro.
Enfim não se pode ter tudo. Ficam as memórias do que poderia ser.
Resta o amor, esse velhaco salvador da humanidade. E o amor terá sempre uma palavra a dizer.
João Pedro Santos
Escritor e Humorista.