Por todo o lado muralhas protectoras, checkpoints, soldados. Não faltam em Cabul cenários de barricada para a guerra, armamento, detectores de metal, barreiras, forças de segurança. Os atentados cada vez mais sofisticados prosseguem. Porquê?
Três anos depois de David Cameron ter declarado “mission accomplished” e Barack Obama ter assegurado que “a guerra americana no Afeganistão terminou”, a carnificina no centro de Cabul torna cristalino para os afegãos que não há pausas na violência.
No país que durante décadas foi pátio de recreio das duas potências – o discurso wilsoniano a favor da democracia e liberdade universais foi propulsionado por um realismo maquiavélico, a doutrina Reagan de apoio aos mujahideen, “os inimigos do meu inimigo”, ajudou ao colapso do comunismo e mergulhou no caos o Afeganistão – é raro subir-se aos telhados de forma voluntária. Os afegãos fazem-no quando a terra treme ou quando avistam uma nuvem negra de fumo no horizonte, como que aconteceu no dia 31 de maio, resultante da violenta explosão que matou 90 pessoas, feriu 400 feridos e destruiu parcialmente a embaixada da Alemanha. “O ataque dirigiu-se contra as pessoas que trabalham nas empresas de telecomunicações, nos bancos, em empresas privadas, em embaixadas. Contra pessoas que tentam fazer do Afeganistão um lugar melhor” escreveu Wazhma Frogh, membro do Parlamento.
Analistas de segurança questionam-se como foi possível detonar um camião cheio de explosivos na green zone e quem está por detrás da operação? A capital afegã é protegida por um chamado Ring of Steel, um cinto de 25 checkpoints da polícia nacional afegã, existindo ainda outros pontos de controlo em rotundas ou em nós rodoviários. Os habitantes de Cabul não se recordam de nenhuma época onde a presença das forças de segurança fosse tão incisiva. Muros de protecção de três, algumas vezes até cinco, metros bordam as estradas durante quilómetros. As residências de políticos, os edifícios oficiais e as embaixadas dispõem de pessoal de segurança próprio. Por todo o lado muralhas protectoras, checkpoints, soldados. Não faltam em Cabul cenários de barricada para a guerra, armamento, detectores de metal. A cidade é vigiada por câmaras aéreas e na zona das embaixadas os serviços secretos afegãos estão particularmente ativos. Face a isto como se explicam quer os ataques sistemáticos a forças de segurança – em 2016 , até meados de Novembro morreram 6785 soldados e polícias – quer os ataques suicidas contra civis?
No Afeganistão estão estacionados cerca de 13 mil soldados da NATO, cuja principal missão – uma vez que a missão de combate terminou oficialmente em 2014 – é apoiar e treinar as forças de segurança nacionais. Fontes militares ocidentais duvidam que os afegãos partilhem o objectivo da NATO – vencer os fundamentalistas islâmicos sejam talibans, do Daesh, ou outros grupos – e apontam que militares e polícias estão muito mais preocupados em proteger as suas famílias e chegar a acordos com políticos poderosos. Muitas forças de segurança afegãs faltam às acções de formação.
O atentado de 31 de maio, que revela um inquietante aumento de capacidade dos terroristas – não seria possível sem uma cooperação estreita entre os autores, os serviços secretos e as forças de segurança, ambos minados pela corrupção. Às forças de segurança falta uma liderança constante e uma cooperação abrangente. Postos chaves estão por ocupar devido a querelas internas no governo. Do mesmo mal padece o ministério do Interior e os serviços secretos, onde alguns cargos são atribuídos a parentes próximos ou membros da mesma etnia sem as necessárias qualificações.
Os militares aliados já se deram conta desta ameaça e os analistas notam que os ataques minam a (já de si pouca) confiança popular no poder político, podem bloquear o apoio dos doadores estrangeiros, que permite manter a educação, os media, os serviços médicos e a sociedade civil a funcionar minimamente, atirando para os braços dos extremistas jovens e adultos sem perspectivas. “A nossa segurança defende-se no Hindukusch”, uma máxima que entrou nas academias militares, cunhada em 2003, pelo antigo ministro da Defesa alemão, Peter Struck, e que em nada perdeu de atualidade.
Escreve à segunda-feira