Pela paz e estabilidade


Trump elegeu como uma das prioridades para o seu mandato alcançar a paz e a estabilidade no Médio Oriente, e atirou: “Estou determinado no estabelecimento da paz na Cisjordânia e no Médio Oriente.” Até porque, como é já um clássico da sua postura, “no one does it or knows it better than me”.


E neste mote lá iniciou ele o seu périplo-relâmpago pela região, convicto da sua capacidade de resolver um problema secular.

O resultado palpável desta missão é, para já, um generoso contrato de assistência militar (chamemos-lhe assim) no valor global de 110 mil milhões de dólares para, nas palavras do secretário de Estado Tillerson, “apoiar a longo prazo a segurança da Arábia Saudita e da região do Golfo face às ameaças do Irão” – um negócio que, em termos de comparação, representa sensivelmente metade do PIB português.

Parece-me válida a abordagem, isto é, injetar armamento e apoio militar, promovendo a hegemonia na região de um superestado como o da Arábia Saudita, é um dos possíveis caminhos. É também uma forma de alimentar a “super” indústria de armamento americana e, neste caso, de mandar para as urtigas os valores da democracia e da liberdade.
Outra abordagem possível seria o apoio às economias mais frágeis da região, a promoção do desenvolvimento de indústrias, a capacitação das populações e, sobretudo, o combate à infoexclusão e a promoção do acesso à informação que, no meu entender, continua a ser o principal entrave à paz e à estabilidade na região – mas esta não é tão lucrativa.
Trump está-se nas tintas para a paz e estabilidade na região. O propósito desta viagem (e possivelmente de todas as outras) foi apenas um: negócios. O foco na monarquia saudita é simples e resume-se em números: maior fundo soberano do mundo, com cerca de 2 biliões de dólares, e um PIB de cerca de 700 mil milhões de dólares. 

Trump não se podia estar mais a borrifar para a paz e estabilidade no Médio Oriente. Enquanto houver instabilidade, haverá conflito. Enquanto houver conflito, haverá guerra. E enquanto houver guerra, a indústria de armamento continua a lucrar.

Não sei se viram mas, em 2005, Nicolas Cage protagonizou o papel de um negociante/traficante internacional de armas no filme “Lord of War”. Vale a pena ver ou, para quem viu, revisitar, e juntar ainda à lista o mais recente (e baseado numa história verídica) “Dogs of War”, com Jonah Hill e Miles Teller, nos principais papéis, e que relata a forma simples e rápida como dois jovens norte-americanos entram no mundo milionário do negócio internacional legal de venda de armas através de um contrato com o Pentágono de 300 milhões de dólares. 

Recomendo porque cada um dos filmes relata os dois mundos do negócio de armas: um legal e outro ilegal. E, surpreendentemente (ou não), em nome da paz e da estabilidade (ou não), percebemos que ambos correm em paralelo e se complementam, curiosamente (ou não), sem nunca se tocarem.

A hipocrisia humana parece não ter limites assim como, na mesma proporção, cresce o desinteresse e a indiferença perante os factos que cada vez mais nos são apresentados de forma clara e sem o mínimo de pudor. Mas, claro, tudo isto pela paz e estabilidade.

Escreve à quinta-feira