Eles são omnipresentes. Podem viver numa aldeia do interior de Portugal mas, somente com um telemóvel na mão, vão conseguir saber o que se passa na Índia, na Síria ou no Brasil. Os problemas deles são os do mundo e os problemas do mundo são os deles. Absorvem tudo, partilham mais. Querem mudar o mundo, lutam pelas causas deles, às vezes pela calada, outras vezes à moda antiga. As irrequietações são mais que muitas, as desilusões não se contam pelos dedos. Sim eles são geração i de consumidos pela informação, são a geração imparável, a iluminada, a improviso, a inebriante, a geração irrequieta.
Irrequietos porquê?
“Estás a ver quando estás a brincar com um cão e finges que lhe atiras uma bola e o cão vai a correr todo contente e tu pensas ‘como é que ele cai nisto?’ Nós somos exactamente como esse cão, e a bolinha são os nossos sonhos. A pessoa que a atira e que pensa que somos estúpidos é a sociedade como um todo e o pessoal com poder, nasces para ser uma engrenagem numa sociedade que é um nojo, composta por pessoas que na sua maioria nem deviam existir” responde, aos 25 anos, Duarte quando lhe perguntamos o que o torna irrequieto. Mas Duarte não está só irrequieto, está furioso: “dizerem que deves estar grato por fazer parte disto é só ter um descaramento abismal” completa.
“Ignorance is a bliss” ou “a ignorância é uma bênção” foi e é cantada, vezes sem conta, por músicos de todo género, desde o rock, ao hip-hop, com os Ramones ou o Kendrick Lamar, partilhada em livros e em poemas, cantada por multidões: “a ignorância é uma bênção”, mas será que é?
“Ontem abri o jornal e vi o futuro, um futuro feito ontem, por homens e mulheres cheios de certezas. Sempre achei que à medida que a história fosse passando que iríamos aprender a cuidar mais, a ser mais tolerantes e com uma maior disponibilidade para nos descobrirmos, a nós próprios e ao outro. Pelo menos assim parecia: nos últimos 100 anos surgiram existencialistas, sindicalistas, pensadores, sonhadores, pensamentos, direitos, tempos e formas de moldar a nossa vida para que a viagem fosse, no mínimo, significativa. Mas ontem dei de caras com o futuro e fiquei com a impressão de que ou desistimos de nos procurar ou enlouquecemos pelo caminho” desabafa ao i o ator e músico Gil, de 28 anos, “e estamos todos cheios de certezas, mas estamos sempre à espera. A guerra continua, dentro e fora do corpo, no Brasil, na Síria, na Somália, na Colômbia, na Turquia, e talvez, também aqui, em Lisboa. Os existencialistas já não têm covil ou então alguém não os deixa falar. Mas a televisão fala disto, por isso, existimos, vamos existindo. E ficamos à espera, à espera que a bomba nos caia na cabeça, à espera de mais um tweet, de um toque que nunca acontece. Estamos à espera de um futuro que nunca acontece, estamos cheios de certezas nessas guerras que vão existindo, ali na televisão. Estamos cheios de certezas de que a guerra não é nossa”.
Novas formas de protestar
Em 2007, o colunista do New York Times, Thomas Friedman, chamou aos Millennials “Geração Q” de quietos, como se os jovens da geração Y, à qual chamamos geração i, estivessem inertes perante o mundo e perante as causas e só se ficassem pelas discussões nas redes sociais. Chegou ainda a surgir a expressão “slacktivism” para o descrever como um “ativismo froxo”. O Washignton Post, mais tarde, viria a mostrar o outro lado da montanha. É que os Millennials por terem um enorme acesso à informação, mudaram a forma de fazer protesto. Hoje os jovens desta geração consomem informação e atacam o problema com uma granada de ações que antigamente não seriam possíveis. Um estudo recente a mais de 1.000 jovens entre os 16 e os 24 anos nos Estados Unidos da América, liderada pela Voxburner no Relatório de Tendências Juvenis, sugere que “o futuro do ativismo pode ser uma revolução ainda mais silenciosa”.
Revolução pela calada
Serão os Millennials uma geração mansa? “Eles podem parecer mansos mas quando acordam são capazes de rugir bem alto” diz o sociólogo e professor universitário Elísio Estanque. Com o crescente poder das redes sociais, os ativistas encontraram uma maneira silenciosa e rápida de espalhar mensagens por toda parte. Uma simples campanha online consegue movimentar fundos para atividades de associações, consegue levar uma petição ao parlamento ou simplesmente passar a palavra à multidão. No estudo da Voxburner um pouco mais da metade (52%) dos entrevistados disseram que “partilham artigos e opiniões sobre assuntos atuais através das redes sociais”, enquanto quase três quartos (74%) concordam que “o ativismo online é tão importante quanto o ativismo tradicional” como é rotulado. O acesso sem precedentes à informação e uma compreensão natural das ferramentas digitais contribuíram para que esta geração se tornasse a mais “especialista em protesto de sempre” lê-se.
O jornal Independent noticiava que em 2014 a campanha de verão “Ice bucket challenge” em que as pessoas eram desafiadas e tomar um “banho de gelo” tornou-se “uma das maiores campanhas digitais dos últimos anos apoiando os doentes com Esclerose Lateral Amiotrófica” uma doença neurodegenerativa que afeta as células nervosas no cérebro e na espinal medula. Com o dinheiro das doações arrecadadas nessa campanha os cientistas puderam dispensar mais recursos na investigação tendo “descoberto um novo gene relacionado com a doença”.
Em Portugal eles ainda saem à rua, criam associações, entram na política. São formados, na sua maioria, alguns chegaram ao parlamento, acreditam que podem mudar o mundo, nem que comecem só por ajudar os da sua rua. A Geração i tem um burburinho lá dentro e quer-se fazer ouvir. A ignorância para eles não é uma bênção porque não é uma opção. O i foi conhecer os que não se deixam parar, os que gritam de megafone e através da lei. Fomos conhecer os irrequietos.
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