Primárias. PSD dividido sobre forma de escolher o líder

Primárias. PSD dividido sobre forma de escolher o líder


Passos Coelho já foi a favor das eleições primárias no partido, mas deixou cair o tema. O último congresso aprovou uma moção da JSD que propunha esse método. Mas o assunto divide os sociais-democratas


Abrir a escolha do líder a todos – militantes ou não – em eleições primárias é um tema recorrente no PSD. No último congresso foi mesmo aprovada uma moção da JSD que previa este método para eleger a liderança. Mas os sociais-democratas continuam muito divididos sobre o tema.

Rodrigo Gonçalves, vice-presidente da concelhia de Lisboa do PSD, relançou o debate com um artigo de opinião publicado ontem no i. O dirigente social-democrata acredita que as primárias “para escolher um candidato a primeiro-ministro” são a melhor forma de “abrir o partido à sociedade civil” numa altura em que o PSD não chega aos 30% de intenções de voto nos últimos estudos de opinião. 

“Com estes resultados, é preciso abrir o partido aos cidadãos sem medos, para ouvir as pessoas e evitar a irrelevância política”, defende ao i aquele que é visto como um dos homens do aparelho em Lisboa. “O statu quo tem medo disto. Mas se eu sou visto como um homem do aparelho e defendo isto é porque não tenho medo de perder poder”, afirma Gonçalves.

Outro homem do aparelho que apareceu recentemente a defender um processo de primárias no PSD foi Miguel Relvas. Há cerca de um mês, numa conferência em Brasília, Relvas elogiou as primárias do PS. “Acredito pessoalmente que muitos outros partidos serão futuramente pressionados para também mudarem, incluindo o meu”, declarou na altura.

Bastam 1500 assinaturas Mesmo com uma moção aprovada em congresso nesse sentido, só passará a haver primárias caso se realize um congresso para a revisão dos estatutos. Isso pode acontecer já no próximo, em 2018, se a direção assim o entender, ou numa reunião magna extraordinária convocada através de 1500 assinaturas de militantes.

O número é baixo, mas Rodrigo Gonçalves diz que não vai fazer nada para recolher as assinaturas e provocar um congresso. “Antes das autárquicas, não é o momento para congressos”, defende.

Simão Cristóvão Ribeiro, o líder da JSD que levou a ideia das primárias ao último congresso, está convencido de que esta forma de escolha da liderança reúne muitos apoios no partido. 

“Foi aprovada por uma larga maioria”, aponta o líder da jota, que diz ser “sensível” aos argumentos dos que “têm receio de que seja mais difícil unir o partido depois de primárias muito fraturantes”, mas está convencido de que as vantagens de abrir o partido são superiores.

Passos mudou? Na altura do último congresso, Simão Ribeiro diz não ter notado “oposição” de Passos Coelho à realização de primárias. Mas o certo é que o líder, que propunha primárias na moção com que foi eleito em 2012, não incluiu esse método de escolha da liderança no texto que submeteu ao congresso de Espinho.

De resto, há quem no partido já tenha sido um adepto fervoroso da ideia e agora comece a ter dúvidas, depois do exemplo da eleição que fez de António Costa líder do PS. O i falou com vários desses sociais-democratas, mas nenhum quis dar a cara.

Direção dividida Na direção do PSD há quem defenda as primárias e quem esteja contra. Teresa Leal Coelho recorda ao i que no congresso em que foi diretora de campanha de Passos apresentou “precisamente essa proposta, mas não passou”.

Sofia Galvão, outra vice-presidente de Passos Coelho, não hesita no não às primárias. “Sou muito conservadora. O PSD perdeu muito quando decidiu criar as diretas [onde só votam militantes], os congressos deixaram de ser eletivos. A eleição em congresso permitia uma discussão mais viva e mais interessante. A fazer alguma mudança nos estatutos seria para recuperar a eleição em congresso”, assume Sofia Galvão ao i.

Distritais contra Os líderes das principais distritais também preferiam recuperar o modelo em que o líder era escolhido durante o congresso e que permitiu reviravoltas durante a reunião magna do partido como a protagonizada por Cavaco Silva, que – reza a lenda – foi à Figueira da Foz fazer a rodagem do Citroën e saiu de lá presidente do PSD.

“Sou totalmente contra as primárias. Já fui contra as diretas. São modelos demagógicos e populistas”, declara Miguel Pinto Luz, líder da distrital do PSD de Lisboa. Pinto Luz frisa o dinheiro gasto nas primárias do PS para ilustrar o que diz. “Foram gastos 3,5 milhões de euros em campanha. Quem é que pode suportar isto?”, questiona-se o dirigente social-democrata, que acha que isso só faria sentido se o partido pudesse dar um orçamento a cada candidato. “Aí, haveria igualdade, mas isso não é possível”, defende Miguel Pinto Luz.

O líder da distrital de Lisboa lembra que o processo implica uma volta ao país com jantares de apoio, dormidas em hotel, uma equipa de campanha e contactos com os media que exigem um orçamento bem recheado. “É quase uma campanha para as legislativas”, conclui, argumentando que, nesse modelo, “as pessoas deixam de precisar de estar em partidos, basta-lhes organizar grupos”.

Um trump no PSD? Raciocínio idêntico tem o líder da distrital do Porto. “Estamos a um ano do congresso e é preferível manter as coisas como estão. Não vá aparecer para aí algum Trump”, diz Bragança Fernandes, que acha que os valores necessários para um candidato fazer uma volta ao país em campanha seriam incomportáveis. “Neste momento, não há condições. Ou então só os Amorins, os Soares da Costa e as Sonaes têm dinheiro para isso”, ironiza.

José Manuel Fernandes, líder da influente distrital de Braga, confessa não ter certezas. “Não tenho opinião fechada sobre isso. Nem sequer tenho a certeza de que as diretas sejam melhores do que os congressos eletivos”, reconhece ao i. Fernandes admite que “a ideia [das primárias] é simpática” ao permitir abrir o partido aos não militantes, mas abre caminho a “discursos demagógicos”.

O dirigente de Braga também olha para o exemplo do PS como uma lição a aprender. “O custo das primárias no PS é um ponto contra esse modelo”, avisa.