Um fim de semana de 15 em 15 dias, uma noite a meio da semana, uma semana na mãe, outra semana no pai, férias de Verão com um, férias da Páscoa com outro. As fórmulas são muitas e nenhuma delas universal, mas a verdade é que, independentemente do que o tribunal decida, os miúdos de hoje em dia aprenderam a pôr a vida em mochilas para conseguirem dividir o tempo entre os pais separados.
Se até meados da década de 90, era quase taxativo que a custódia dos filhos era entregue à mãe, com o pai a ter direito apenas a um fim de semana de 15 em 15 dias, atualmente existem outras opções a considerar. Desde 1995, ano marcado pela alteração do regime jurídico do divórcio, que foram abertas portas para que o tempo seja dividido entre os dois progenitores, desaparecendo assim da lei o pressuposto de entrega da criança à mãe. Só a partir daí se começou a falar do conceito de “residência alternada”, defendida pelos especialistas como a mais próxima do ideal.
“Não há fórmulas matemáticas nem soluções fixas”, começa por lembrar Ricardo Simões. Mesmo assim, o presidente da Associação Portuguesa para a Igualdade Parental e Direitos dos Filhos (APIPDF), não hesita na hora de apontar a residência alternada como a melhor das opções.
“Acreditou-se, durante décadas, que a residência fixa era uma forma de proteger a criança, mas está provado que não protegeu coisa nenhuma”, refere. Aliás, Ricardo lembra que 40% das situações de conflito entre os pais diminui quando se opta por residência alternada, regime no qual a criança convive com pai e mãe, com tempos equilibrados, existindo assim duas casas.
Estabilidade da criança
Ricardo está habituado a ter que responder a quem questiona se este modelo não requer mais mudanças para a criança, logo, mais instabilidade. “Na residência fixa, normalmente o pai tem direito a um fim de semana de 15 em 15 dias e às noites de quarta-feira. Na residência alternada, a troca acontece uma vez e dura uma semana. Fazendo as contas, qual é a situação em que a criança tem que mudar mais vezes de espaço?”.
A esta pergunta retórica, Ricardo junta a evidência de que, para uma criança, “a casa não é um espaço físico, mas sim o sítio onde o pai e a mãe estão”. E isto independentemente da idade. “Um dos argumentos para que o filho ficasse a viver com um progenitores era alegar que, no caso de crianças pequenas, não haveria a necessidade de partilhar o mesmo tempo com pai e mãe. É mentira”.
Ainda na temática das idades das crianças, Sofia Marinho, autora da tese de doutoramento “Paternidades de hoje – Significados, práticas e negociações da parentalidade na conjugalidade e na residência alternada”, vai mais longe e garante que quanto mais novas são as crianças, maior a necessidade de partilhar o mesmo tempo com o pai e a mãe. “Nestes casos houve um período mais curto de tempo com os pais juntos e é fundamental que o vínculo com os dois não se perca”, explica a socióloga. Com a idade, continua, os filhos tornam-se mais autónomos e pode partir deles essa vontade de estar com um dos pais. “Se é a semana da mãe, a criança pode dizer que tem saudades, pode falar ao telefone ou mesmo pedir para ir dormir uma noite na casa do pai. Essa flexibilidade é muito importante”, acrescenta.
Mudanças sociais
Apesar de ser também defensora da residência alternada, acredita que há casos em que não deve ser aplicada. “Quando os pais vivem a muitos quilómetros de distância, por exemplo, não faz sentido”, refere. Mesmo assim, ressalva que, ainda dentro da opção do regime standard, já se verificam mudanças. “Nos últimos trabalhos que tenho feito deparo-me cada vez mais com famílias que, apesar de optarem por residência fixa, passam a admitir até oito noites por mês com o outro progenitor, seja em fins de semana mais longos, ou estadias a meio da semana”.
A socióloga acredita que as mudanças legais acompanham a mudança de valores que, em Portugal, se notam numa relação mais próxima com as crianças. “O pai quer estar mais envolvido, mas a atitude da mãe também mudou. Passou a abrir espaço para chamar outra pessoa para dentro da parentalidade”.