Geração improviso. Na casa dos pais até cada vez mais tarde

Geração improviso. Na casa dos pais até cada vez mais tarde


Uns porque querem, outros contrariados, o que é certo é que a Geração Y em Portugal deixa a casa dos pais cada vez mais tarde. Por cá continuamos a dedicar espaço, todas as quintas-feiras, aos que têm mudado os paradigmas e que tanto dão que falar. Para uns são os millennials, para nós, Geração i


São conhecidos como precários, como escravos bem formados, bem à moda do século xxi. Já saíram às ruas, mas não saem da casa dos pais. “A vida está difícil”, “não ganho para a renda” e faz-se mais um estágio, faz-se mais um voluntariado, mas são muitos os passaritos desta geração que têm de voltar ao ninho, sempre. Já inspiraram poetas, já se cantaram canções e os Deolinda até os eternizaram nos versos: “Sou da geração sem remuneração/ E nem me incomoda esta condição./ Que parva que eu sou./ E fico a pensar:/ Que mundo tão parvo,/ Onde para ser escravo/ É preciso estudar.”

O mundo mudou drasticamente enquanto eles cresciam. O desenvolvimento da tecnologia explodiu, a internet veio para ficar. Muitos foram os que viram os pais perderem a casa, o carro, outros assistiram aos divórcios de famílias menos felizes. A Geração Y cresceu com tudo e viu–se, com o tempo, a ficar com cada vez menos. Crescem com a dificuldade de se adaptarem a uma sociedade em mudança, alteram-se paradigmas que até então eram intocáveis. Se antes os pais tiveram a oportunidade de criar uma carreira (até há pouco tempo) segura, se puderam construir uma família com a devida independência e adquirir bens materiais que lhes davam conforto e a sensação de estabilidade, são poucos os filhos a seguir essas pegadas.

Geração à Rasca Ao longo do tempo, cada país tem tido a originalidade de adaptar a cada uma das gerações novas um nome que as define relativamente aos tempos que cada uma delas acompanha. Na Noruega chamam-lhes “Geração Séria”, no Japão são a geração “Nagara-zoku” – os que fazem sempre duas coisas ao mesmo tempo. Em Espanha são a “Generación Ni-Ni” e na China, segundo o “Guardian”, são os “Ken lao zu” –“a geração que come dos velhos”. Em Portugal é “Geração à rasca” que se chama comummente à geração dos millennials e àquela que nós decidimos chamar Geração i.

Em casa até mais tarde “Portugal é um dos países da União Europeia onde os jovens ficam a viver até mais tarde em casa dos pais” conta ao i o sociólogo e professor da Universidade do Porto João Teixeira Lopes. Os números mais recentes do Eurostat comprovam-no. Na União Europeia, 55,6% da população entre os 20 e os 29 anos vive com os pais e em Portugal são 71,6% os jovens nessa situação. Os jovens saem mais cedo de casa dos pais nos países mais a norte. Na Finlândia, apenas 16,9% dos jovens entre as idades já referidas vivem com os pais, enquanto na Noruega já são 17,2% e na Suécia 22,9%. A Eslováquia tem o maior número de jovens na casa dos pais, correspondendo a 84,2% da população juvenil, seguindo-se a Croácia com 79,1% e a Itália com 78% .

“Há um fenómeno em que se vê a família a substituir o Estado-providência”, explica Teixeira Lopes, “uma vez que este falha nas transições para a idade adulta, sem proporcionar [aos jovens] emprego, casa própria, não lhes facilita a vida para construírem uma família.” Segundo o sociólogo, muitas das causas da emigração estão relacionadas com este fenómeno e muitos dos jovens que cá ficam “estão contra a sua vontade, mantendo-se num estado híbrido, a saltar de trabalho em trabalho, ora num estágio ora noutro, sendo obrigados a ficar em casa dos pais”. São vários os sociólogos que tentam explicar o que está a acontecer nos países com uma percentagem tão elevada de jovens a morar com os pais. O professor universitário discorda dos investigadores dos países nórdicos que tendem a explicar o fenómeno português com a tradição mais familiar e católica: “Não tem nada que ver, a questão cultural pode ter algum peso mas não é, de todo, a principal”, afirma. “O fenómeno de destradicionalização da sociedade portuguesa e a secularização é muito intenso e muito rápido”, justifica Teixeira Lopes.

A convivência mais ou menos forçada entre pais e filhos, de gerações diferentes, tem sido, no entanto, uma experiência maioritariamente “positiva”, explica Teixeira Gomes: “Outrora, o conflito geracional era enorme mas, hoje, o confronto está na incapacidade de os mais novos fazerem projetos, não por partilharem valores-base diferentes”. O que está a acontecer na casa das famílias portuguesas é “uma jovialização valorativa e simbólica dos pais” que estão dispostos a ouvir os mais novos.

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