“Mostramo-nos fracos e os fracos são amaldiçoados.”
Vladimir Putin
1) O tratado de Roma virou sexagenário por estes dias com pompa, alguma circunstância e não muita festa. A partir desse tratado assinado por seis estados foi-se construindo uma Europa que chegou a 28 e que proporcionou mais paz, bem-estar e harmonia do que alguma houve no velho continente. Estar contra este projeto é querer regredir e preferir confrontos a equilíbrios mesmo que difíceis. A União Europeia (UE) é o projeto político mais bonito que alguma vez se construiu na Europa e talvez no mundo. É claro que está cheia de problemas, precisa de reformar a sua “eurocracia” e que há uma Europa de mais ricos, outra de menos ricos e outra ainda feita de pobres que são ainda alguns dos países da antiga Europa de Leste comunista. É claro também que há nacionalismos a nascer e que é preciso combatê-los para evitar a desagregação do projeto. É claro igualmente que a Europa tem de ser humanitária, mas não pode receber toda a gente para sempre. E é claro finalmente que, ao contrário do que pensa o ministro holandês das Finanças e presidente do Eurogrupo, o projeto europeu não foi construído com base na procura de uma homogeneidade. Foi feito, sim, no pressuposto de ser um espaço solidário no qual os mais ricos apoiam os mais pobres ou os que estão pontualmente em dificuldade. Existe nele a mesma lógica do que nos impostos sobre rendimento: quem ganha mais paga mais, para apoiar o crescimento de quem menos tem. Num espaço geográfico do tamanho da UE haverá sempre países tendencialmente mais pobres por um conjunto de razões que, desde logo, começam na sua posição geográfica. Outros beneficiam exatamente do inverso, ou seja da circunstância de terem uma centralidade europeia, isto sem retirar mérito às suas capacidades de organização. Por isso mesmo é que, supostamente, se preveem sanções tanto para os que acumulam riqueza como para os não demonstram capacidade de minorar os seus défices. Mas, repete-se, o princípio da UE hoje não é nem tem de ser a de uma igualdade absoluta em todos os planos. Sessenta anos depois, o que ainda falta é a capacidade de inculcar na cidadania alguns dos valores básicos dos fundamentos da União. Essa é uma tarefa urgente para evitar a repetição de casos como Brexit que, a ocorrerem, destruirão definitivamente um sonho fabuloso. Isto apesar das muitas voltas que a que a saída da Grã-Bretanha ainda pode dar, a maior das quais seria a sua desagregação em resultado de uma separação da Escócia.
Portugal foi dos maiores beneficiários deste fantástico projeto humano. Num tempo de balanço, honre-se os que construíram a União Europeia e honre-se também os portugueses que nos fizeram aderir e nos têm conseguido manter no seu pelotão da frente, apesar das dificuldades. Quanto aos que são contra a UE importa combatê-los politicamente com racionalidade e firmeza, porque são forças retrógradas que mais não procuram do que instalar poderes nacionais e isolacionistas, tendencialmente autocráticos para acabar com a magnifica cidadania europeia e tudo o que ela permite em termos de liberdade e autonomia a cada um de nós.
2) A atribuição de uma casa de função a uma secretária de Estado da área da justiça foi há dias manchete do “Público”. A governante em causa é juíza, reside em Amarante e a casa que lhe foi atribuída destina-se a juízes, estando situada em Cascais. A governante está, portanto, deslocada provisoriamente em Lisboa, visto que é pouco provável que fique eternamente no governo. Houve, porém, outra juíza que não se conformou e se queixou por considerar abusiva a atribuição da casa, a quem não está em funções de juiz. A isto, o Ministério da Justiça respondeu que a casa também pode ser atribuída a outras pessoas ligadas a esta área como, por exemplo, a Polícia Judiciária. Pode haver de tudo nesta pequenina história: abuso de poder, inveja e jornalismo sensacionalista. Mas há certamente uma matéria sobre a qual teremos que pensar. As condições de remuneração dos políticos não deveriam sujeitá-los a vexames ou a recorrer a situações eventualmente dúbias, quando são deslocados para a capital. Este não é, infelizmente, o tempo para se pensar nisso porque há ainda um fosso enorme entre o salário médio nacional e o dos políticos. Mas ninguém duvide que qualquer pessoa que tenha uma vida confortável rejeitará normalmente qualquer lugar político que não seja simbólico ou que não constitua uma espécie de investimento, dentro daquela lógica de que o que é bom é ter sido ministro ou secretário de Estado. Ainda assim, quem aceite tem sempre de ponderar os danos resultantes de uma inevitável exposição mediática, como é manifesto no caso agora noticiado. São necessárias regras e remunerações dignas e transparentes. E não é só cá. Veja-se em França o que se passa com Fillon e Le Pen, apanhados em esquemas fraudulentos e imorais.
Jornalista