Até um dia


É verdade, começam a ser já demasiadas as vezes que recordo um episódio da vida de um amigo, escritor, que vinha mantendo há anos uma crónica regular num semanário mas que, em dado momento, entrou em funções públicas relevantes numa prestigiada instituição. 


 Foi notório o seu esforço dedicado para ir mantendo viva a crónica, certamente pela vasta legião de leitores que a procuravam regularmente, como também pelo seu gosto no exercício da escrita e da opinião livre. Só que há situações em que a nossa liberdade tem muito que se lhe diga, e a verdade é que, a determinada altura, as crónicas empalideciam, ficando famosa uma última em que dissertava sobre… gravatas.

E assim se finaram, para desgosto de tantos leitores.

Ora, sem me querer comparar, porque não sou sequer escritor, sinto bem na pele a incomodidade da situação quando todas as semanas me vem uma angústia terrível ao fazer estes textinhos. Solta-se um polícia dentro de mim e falha-me a pena, perante uma óbvia dificuldade em conciliar a exposição pública de um lugar de responsabilidade, sempre escrutinado, com a liberdade de escrever sobre o que me dê na real gana. E é medonha a autocensura, com prejuízo evidente do leitor que é, afinal, o mais importante disto tudo. 

 Amo demasiado a liberdade, e sublinho que ninguém ma condicionou agora, mas sei bem que há um tempo em que a res publica se impõe para seu próprio benefício. Por isso mesmo, e pela santa liberdade, encerrarei agora este gratificante ciclo de mais de dois anos no i. O meu grato abraço ao diretor e a toda a sua equipa. Há mar e mar…