Já vai longa a discussão sobre se a mostra dos peitos – ou parte deles apenas, que a doutrina divide-se – de Emma Watson na “Vanity Fair” atraiçoa ou não o feminismo. E também já vai longa a discussão sobre a resposta que deu às críticas a dona dos ditos peitos (sim, são dela, caso quem opina mais militantemente a favor da traição o tenha esquecido). Já se disse tudo, a favor e contra, já se eriçou muito pelo no sovaco, entre outros eriçamentos possíveis, e eu só queria dizer, se me é permitido, duas coisas.
Uma, que estou com os que dizem que a ex-menina de “Harry Potter” não traiu coisa nenhuma e que as mamas (perdão, os peitos) são dela e que ela os põe onde quer (ou onde a deixam, que isto da liberdade às vezes sofre a limitação das vontades dos outros, uma chatice antiga e universal). E também estou com os que dizem que ela respondeu muito bem às críticas, exceto na parte final da resposta, aquela onde ela pergunta o que têm os seus peitos que ver com o feminismo, pois ela parece concluir que não têm nada, mas eu acho que têm tudo, embora menos com o feminismo “mau” (aquele que quase queria que não houvesse peitos), e muito mais com o feminismo “bom” (aquele que acha que os peitos não devem determinar coisa nenhuma na vida, a não ser a liberdade total de os ter e de com eles fazer o que bem se entende).
E a outra coisa que queria dizer é que estas críticas a Emma Watson são filhas de uma coisa mais global, que é uma certa militância politicamente correta, a puxar para o intolerante, quando não mesmo asfixiante, e que só não é ridícula porque é extremamente perigosa e muito entediante. E sobre ela lembrei–me de um texto antigo, mas muito moderno, de Álvaro de Campos, “Aviso por Causa da Moral”, sobre a polémica em redor do livro “Canções” de António Botto, onde escreveu assim, e cito parte, com a devida vénia, e sem saber o que diria o heterónimo sobre a discussão acerca dos peitos da senhora e, bem assim, sobre os ditos: “Quando o público soube que os estudantes de Lisboa, nos intervalos de dizer obscenidades às senhoras que passam, estavam empenhados em moralizar toda a gente, teve uma exclamação de impaciência. Sim – exactamente a exclamação que acaba de escapar ao leitor… (…) Bolas para a gente ter que aturar isto! Ó meninos: estudem, divirtam-se e calem–se.
Estudem ciências, se estudam ciências; estudem artes, se estudam artes; estudem letras, se estudam letras. Divirtam-se com mulheres, se gostam de mulheres; divirtam-se de outra maneira, se preferem outra. Tudo está certo, porque não passa do corpo de quem se diverte. Mas quanto ao resto, calem-se. Calem-se o mais silenciosamente possível. Porque há só duas maneiras de se ter razão. Uma é calar-se, que é a que convém aos novos. A outra é contradizer-se, mas só alguém de mais idade a pode cometer. Tudo mais é uma grande maçada para quem está presente por acaso. E a sociedade onde nascemos é o lugar onde mais por acaso estamos presentes. Europa, 1923.”
Escreve à sexta-feira