Na sua obra de 1859 “On Liberty”, John Stuart Mill, filósofo e economista emérito, que cito em tradução livre, defendeu que “deve existir a mais ampla liberdade para professar e discutir, enquanto matéria de convicção pessoal, qualquer doutrina, independentemente de quão imoral ela possa ser considerada”. Stuart Mill, no século xix, defendia, assim, que uma amplíssima liberdade de expressão é necessária para se poder levar os argumentos aos seus limites lógicos, ao invés dos limites do embaraço social. Para John Stuart Mill, a liberdade de expressão, não obstante, estaria limitada pelo “harm principle”, ou seja, ele entendia que a única razão pela qual se poderia exercer o poder (de silenciar) qualquer membro de uma comunidade civilizada contra a vontade deste seria para prevenir danos a terceiros.
Num momento em que a discussão sobre a liberdade de expressão, na simplicidade do que se vai lendo por aí, parece opor marxistas-leninistas e trotskistas, de uma parte, contra nacionalistas de direita de outra – isto segundo relatos, adianta-se, não testados –, estas ideias de um liberal talvez pareçam aqui deslocadas a qualquer das duas trincheiras.
Só que, de um determinado ponto de vista, in casu, o meu, não deixa de ser curioso constatar (algumas décadas depois da muito apregoada – mas a espaços desmentida – revolução da liberdade) que seja a outrora perseguida esquerda – que ainda mantém a sempre intemporal e instrumental RGA que traz, pelo menos, dos tempos da greve académica e ainda não dá ares de ir acabar – a não permitir a liberdade de expressão àqueles (ideologicamente) contra quem antes se insurgiam por lhes fazerem exactamente o mesmo, o que, aliás, para além de ser uma constatação óbvia e patusca, tem pouco interesse se formos à matriz dos contendentes.
Mais engraçado, porém, será constatar que numa faculdade, para mais de ciências sociais e humanas, se nega a possibilidade da discussão e se resvala com rapidez e aclamação sufragada (ainda que de quórum ínfimo) para os limites do embaraço social, tudo para não se permitir uma ampla discussão livre e que teste até aos limites da lógica outras, ou todas, as convicções pessoais alheias e diferentes.
Esta exiguidade de horizontes e tendência normalizadora, salvo melhor opinião, causa muito mais dano que qualquer eventual imoralidade real, presumida ou putativa, que pudesse aí discutir-se.
A liberdade de expressão é um pilar fundamental das sociedades modernas e livres e não deve nem pode ser suprimida por clubite partidária e/ou cegueira ideológica. Por melhor argumentário que se pretenda o legitime, isso não foi boa ideia antes nem vai ser certamente agora.
É que “aqueles que abrem mão da liberdade essencial por um pouco de segurança temporária não merecem nem liberdade nem segurança”, como já alertava Benjamin Franklin à Assembleia da Pensilvânia em 1775.