Tenho para mim que a relação entre política e desporto se deixa, por vezes, levar por caminhos obscuros e pouco éticos. Não é de hoje: as grandes competições internacionais (Fórmula 1, futebol, Jogos Olímpicos ou râguebi) são utilizadas pelos governos como um instrumento para melhorar a sua imagem junto da opinião pública e, em alguns casos, legitimar políticas pouco democráticas. De forma mais ou menos velada, há um pacto entre federações e Estados para que o desporto não se meta na política nacional, mesmo que estejam em causa direitos humanos. Para ficarem bem na fotografia, limitam-se a fazer uma declaração de intenções sobre o assunto.
A estranha ligação da Fórmula 1 à África do Sul em pleno período do apartheid não foi caso único. As graves e repetidas violações dos direitos humanos no Bahrein, China, Rússia ou Azerbaijão – todos eles recebem o mundial de Fórmula 1 – há muito que foram denunciadas pela Amnistia Internacional e pela Human Rights Watch, e o que aconteceu? Nada. Podemos perguntar, e os pilotos não tomam posição? Não! Os pilotos têm um mindset muito próprio, mas numa coisa são iguais a outros desportistas de alta competição: vivem “alienados” na sua atividade e “desligados” do mundo que os rodeia.
Estamos numa época em que a ditadura das potências económicas fala mais alto, e isso não é problema exclusivo da Fórmula 1. A diplomacia do silêncio vale muito dinheiro. Só assim se compreende que a China tivesse recebido os Jogos Olímpicos em 2008 e que a Rússia vá organizar o mundial de futebol em 2018, países que violam constantemente os direitos humanos e eliminam os opositores ao regime sem piedade. Não vejo grande diferença para a África do Sul racista. Perante este quadro, assalta-me uma dúvida: estarão os dirigentes desportivos à altura das suas responsabilidades?