Aterra-se em Schönenfeld a tentar arrancar sabe-se lá de que lugar aquele alemão que, coitado, mas que vem, começa a vir, e o jeito que ele nos há de fazer naqueles turcos que vendem pizzas a quatro euros quando a fome vem a uma hora em que já nem U-Bahn existe. Depois chega-se à Potsdamer Platz, centro de operações da Berlinale, para perceber o ridículo de se ter achado que dez dias num centro de imprensa com gente de 86 nacionalidades (números da edição anterior) são dez dias em Berlim.
Ich bin o que tiver que ser, é mais ou menos isso, pelo menos até pedirmos o primeiro bilhete para a estreia de um filme brasileiro, “Vazante”, de Daniela Thomas, coprodução brasileiro-portuguesa, como eles dizem, e o suposto alemão que trabalha no guiché nos perguntar de onde somos numa língua qualquer que já nem sabemos para depois nos explicar que “esse daí é no Zoo Palast”. Lugar bem mais bonito que a confusão da Potsdamer, a propósito, onde chegamos para nos esquecermos dos quatro graus negativos que a mudarem só se for para os menos seis.
Parece o Brasil isto, e não parece mal se já estivermos com o desespero do ar-condicionado sobre as nossas cabeças, e parecemos nós também no fim de contas, coisa que não espanta de um país que se faz representar por dez obras nesta 67.ª edição do Festival de Cinema de Berlim. Cinco minutos de aplausos para esta história a preto-e-branco sobre escravos e sobre a mulher no Brasil do século XVIII que é a primeira em que a realizadora conhecida pelo trabalho em conjunto com Walter Salles se aventura sozinha. E foram mais que merecidos neste Zoo Palast por uma noite brasileiro.