Educação. Abandono escolar precoce volta a subir passados dez anos

Educação. Abandono escolar precoce volta a subir passados dez anos


Desde 2006 que, todos os anos, a taxa de abandono escolar precoce descia. Em 2016, no primeiro ano de Tiago Brandão Rodrigues como ministro, voltou a subir. Portugal tem agora três anos para cumprir meta europeia e chegar aos 10%


Pela primeira vez nos últimos dez anos, a taxa de abandono escolar precoce voltou a subir em 2016. Durante o primeiro ano da tutela de Tiago Brandão Rodrigues é contrariada a tendência que se vinha registando, desde 2006, de sucessiva e acentuada redução deste indicador.

Segundo os dados divulgados ontem pelo INE, no ano passado, 14% dos jovens entre os 18 e os 24 anos não terminaram o ensino secundário (escolaridade obrigatória) nem estavam a estudar – mais 0,3 pontos percentuais do que em 2015, quando a taxa de abandono escolar precoce registada foi de 13,7%.

Este foi um dos assuntos que marcaram o debate quinzenal, que decorreu ontem, com os partidos da oposição a confrontarem o primeiro-ministro com o indicador, aproveitando para lembrar António Costa da sua mensagem de Natal, que teve como tema central a educação e a formação.

Portugal tem agora três anos para descer a taxa de abandono escolar precoce em quatro pontos percentuais, de forma a cumprir o acordo firmado com Bruxelas que impôs que, em 2020, Portugal não ultrapassasse os 10% de taxa de abandono escolar precoce.

Ainda segundo os dados do INE, nos últimos dez anos, a taxa de abandono escolar precoce caiu 24,5 pontos percentuais. Mas foi de 2010 para 2011 que este indicador mais desceu, caindo 5,3 pontos percentuais (ver tabela ao lado). Na altura estava aos comandos da Cinco de Outubro Isabel Alçada, atual assessora do Presidente da República para a Educação.

Os atuais 14% de abandono escolar precoce ainda colocam Portugal acima da média registada entre os países da União Europeia, que é de 11%, segundo o último relatório “Monitor da Educação e da Formação” da Comissão Europeia.

“É um alerta”

A ex-ministra da Educação Maria de Lurdes Rodrigues sublinha que “é pena e é um alerta” a quebra na redução da taxa de abandono escolar precoce. Até porque, sublinha a ex–ministra da Educação do governo de José Sócrates, “nos últimos anos temos tido um comportamento exemplar na evolução deste indicador e ultrapassámos países como a Itália ou Espanha”.

Agora, diz ao i Maria de Lurdes Rodrigues, “é preciso dar atenção e perceber o que está a acontecer com estes jovens”. Recuando a 2006, Maria de Lurdes Rodrigues recorda várias medidas que foram sendo adotadas ao longo dos anos seguintes e que, em seu entender, levaram à redução da taxa de abandono. É o caso do programa das Novas Oportunidades, em 2007, que previa a qualificação de adultos, ou a preparação do alargamento da escolaridade obrigatória do 9.o para o 12.o ano, em 2008. “A escolaridade obrigatória até ao 12.o ano fixou mais alunos na escola antes de entrarem para o mercado de trabalho”, refere Lurdes Rodrigues.

Além disso, recorda, foi também nesse período que as escolas públicas passaram a ter a via profissional de ensino. “Os alunos passaram a ter uma oportunidade que até aí não tinham”, remata Lurdes Rodrigues.

Também o ex-ministro Nuno Crato, que lançou a via vocacional, frisou várias vezes enquanto esteve no governo que estes cursos davam resposta à “inclusão de jovens em risco de abandono, no cumprimento efetivo da escolaridade obrigatória e no desenvolvimento de vários setores de atividade que dela necessitavam”, reduzindo o abandono escolar.

Esta opinião é partilhada pelo presidente do Conselho Nacional de Educação (CNE), David Justino, que também foi ministro da Educação durante o governo de Durão Barroso. David Justino diz que um dos fatores que podem ter levado à subida imediata da taxa de abandono foi “o fim dos vocacionais”. Outra das razões apontadas ao i pelo presidente do CNE está relacionada com a fuga dos jovens para o mercado de trabalho.

Governo desvaloriza

Para o governo, a inversão na tendência da redução da taxa não passa de uma “ligeira flutuação”, não sendo considerada “relevante”. Em comunicado, a tutela de Tiago Brandão Rodrigues replicou os argumentos do primeiro-ministro no parlamento, apontando “a recuperação do mercado de trabalho” como motivo para o abandono dos jovens.

No entanto, a tutela de Tiago Brandão Rodrigues não deixou de reconhecer que o país continua a “registar níveis preocupantes de abandono escolar”, lembrando as várias medidas adotadas pelo governo de combate à fuga dos alunos das escolas. É o caso do programa nacional de promoção do sucesso escolar, através do qual é atribuído um tutor aos alunos com mais dificuldades na aprendizagem, ou o programa Qualifica, através do qual os adultos regressam à escola para concluir o 12.o ano. O governo também salientou que está a reforçar e a valorizar o ensino profissional. No entanto, a tutela de Tiago Brandão Rodrigues acabou com os cursos vocacionais. E este foi um dos argumentos usados pelo PSD quando ontem confrontou António Costa no parlamento.

“É este o resultado das políticas deste governo, com o desinvestimento que fez no ensino profissional e com as alterações que fez nas reformas educativas. Perdemos qualidade no ensino e o vosso investimento na escola pública, afinal, tem este resultado: aumentou o abandono escolar precoce”, disse o líder da bancada social-democrata, Luís Montenegro. O deputado aproveitou ainda a ocasião para lembrar ao primeiro-ministro a sua mensagem de Natal, “quando disse que um dos problemas do país era um défice de qualificação e que não queria deixar ninguém para trás”.

Também o CDS diz estar “preocupado” com a inversão de uma “forte tendência” que se registou durante anos. “Há coisas que não estão a correr bem”, avisa ao i a deputada Ana Rita Bessa. A associação da subida da taxa de abandono à entrada de mais jovens no mercado de trabalho, sem o 12..o ano, mostra que o governo “não está a ser bem-sucedido no incentivo e promoção da formação de adultos porque não está a conseguir segurá-los na escola”, remata a deputada centrista.