Há notícia de que está tomada a decisão final de amanhar o aeroporto do Montijo para o tornar num complemento do Humberto Delgado, em Lisboa.
Depois de andarmos dezenas de anos a esbanjar milhões em estudos inúteis entre a Ota e Alcochete, chegou-se a este entendimento que parece razoável e que favorece claramente a Vinci, a empresa francesa que comprou a pataco a nossa ANA para ganhar uma pipa de massa em poucos anos, amortizando o investimento num ápice, num negócio do tipo Terceiro Mundo.
Melhor ainda, a Vinci tornou-se grande defensora da solução Montijo porquanto isso evita-lhe cumprir o que foi anunciado quando comprou a ANA, no tempo do governo PSD/CDS, ou seja, que se construiria um novo aeroporto ao atingir-se um determinado volume de passageiros em Lisboa, como parece ser o caso.
A solução Montijo não é propriamente um novo aeroporto, mas uma serventia que fica perto de Lisboa, facilitando o aumento do tráfego aéreo e tendo custos muito mais baixos do que uma solução de raiz, podendo ser também mais apelativa para as companhias. É, portanto, um boa opção para o concessionário privado, num mundo inseguro onde uma crise ou um problema de segurança pode destruir totalmente o turismo de um país, por mais atrativo que ele seja.
Adquirida a solução Montijo por parte do governo (ainda que à boca pequena), começa agora a faena de saber quem financia o quê, sendo certo que, no final, quem vai pagar tudo são os portugueses contribuintes e os viajantes através dos seus bilhetes, pois nestas coisas não há lógicas que não sejam as do negócio.
Obviamente, os franceses pretendem pagar o mínimo possível e, uma vez condicionada a decisão ao que desejam, começaram a dizer que não querem suportar acessos e outras coisas. Simultaneamente apareceram notícias a reclamar um transporte marítimo tipo Veneza para trazer os turistas do Montijo para Lisboa (!?) através de barcos panorâmicos da Transtejo, ou seja, pagos pelo pagode que vem de Cacilhas e do Seixal como em lata de sardinhas.
Não é preciso ser bruxo, economista à moda das PPP ou um super “experto” em aviação civil e militar ou em turismo para perceber que se está a preparar um imbróglio daqueles em que ninguém se entenderá sobre as responsabilidades financeiras de cada uma das entidades envolvidas quando a coisa der para a inevitável derrapagem que adorna toda a obra nacional que envolva um público e um privado em Portugal. E sempre com os custos agravados atirados para o coletivo. Esta é uma realidade indesmentível que vai do simples chafariz até a um TGV que nunca se fez mas custou, pelo menos, 60 milhões em estudos. Já para não falar das PPP rodoviárias onde ninguém passa mas que vamos financiando, porque as estimativas de tráfego estavam empoladas, como era óbvio.
Se, efetivamente, a solução aeroportuária lisboeta for o Montijo e não a manutenção e otimização da infraestrutura atual, dando condições especiais aos nossos insulares e limitando o turismo a um nível aceitável para não transformar a atividade numa praga, então há que rapidamente decidir quem faz o quê e quem se responsabiliza ao tostão por qualquer gasto e respetivo desvio na construção ou exploração.
É essencial que tudo seja assinado e protocolado relativamente à obra e à sua envolvente, clarificando de forma cristalina as obrigações do concessionário, das entidades nacionais oficiais e também políticas, pois o caso exige um consenso alargadíssimo para não dar azo a futuras querelas demagógicas. Exploradores, construtores, autarquias, militares, ambientalistas e instâncias portuguesas e internacionais que tenham a ver com qualquer aspeto da obra devem ser envolvidos e responsabilizados para evitar prejuízos e polémicas futuras. Seria mesmo desejável que o pró-ativo Presidente Marcelo assegurasse uma vigilância sobre o processo. Isto porque nas coisas de infraestruturas e de banca cá no burgo, já se sabe que, normalmente, o pagode paga e alguém fatura uma brutalidade, tendo mesmo assim o desplante de vir depois reclamar.
Como gatos escaldados com água, os portugueses queimaram-se com obras públicas. Num certo ponto do centro do país temos três autoestradas paralelas para chegar ao Porto. Mas há mais. Em Beja existe um aeroporto fechado que custou 50 milhões e que, em três anos, terá recebido dois voos comerciais. Foi bonita a obra! Ninguém foi preso e não há solução à vista. Por isso, há que ter muita cautela na forma como se planear e executar o projeto do Montijo, se é que ele é mesmo necessário.