São decisões atrás umas das outras, algumas de duvidosa conformidade legal de aplicação interna e até externa. Donald Trump já era e agora ainda é mais uma marca mundial que é muito mais temida do que, antes pelo contrário, amada. Atraindo contestações, manifestações, indignações, críticas, comentários não só pela sua eleição, mas sobretudo por, afinal, ao arrepio de muitos vaticínios e desejos, estar a começar a cumprir muito do que prometeu fazer na campanha eleitoral que o levou a vencer as eleições americanas.
Esta espécie de poder da trumpofobia faz dele o centro das atenções mundiais, por cumprir parte do que prometeu (curioso, porque uma crítica que nós, Europa, fazemos há décadas à classe política é que não cumprem as suas promessas…) e por estar a concretizar uma agenda interna que vai começando a pôr em causa a tal ordem mundial liberal, instrumento maior da tão proclamada sociedade aberta. Dando tiros no globalismo. Estimulando o americanismo, o protecionismo, a cuja ausência nos fomos habituando e dando como critério definitivo que não retornariam.
Vamos assistindo a esta espécie de poder da trumpofobia com um misto de preocupação e de curiosidade. Isso mesmo. Também curiosidade. Porque, como bem disse o atual ministro dos Negócios Estrangeiros de Itália, Angelino Alfano, “a União Europeia não está em boa posição para criticar Trump porque ergueu muros durante a crise dos refugiados”.
Nem mais. Trump faz cair muitas máscaras também por cá, no território europeu. Território onde, nestas matérias da imigração, refugiados e asilados, têm sido cometidos erros atrás de erros. Políticos, militares, diplomáticos. E outros. Renegando as suas origens humanistas e cristãs. Alimentando um laicismo radical. No território europeu onde populismos extremistas têm vindo a crescer, infelizmente, nas sociedades contemporâneas inclusivas e plurais. Exemplos negativos não faltam. Desde quase renegar no tratado maior do direito comunitário vigente a sua genética judaico-cristã até às erradas opções de política externa e de defesa, com o que foi feito relativamente às suas fronteiras a leste e a sul. Vide o que se passa com os territórios de países árabes de alguns Estados na prática falhados, como é o caso da Líbia, a Somália do Mediterrâneo.
Este laicismo radical é, em parte, semelhante ao fundamentalismo religioso de matriz muçulmana. Vide o que se tem decidido sobre o véu, o burquíni e afins. Repúblicas a imporem o que as mulheres devem ou não vestir e como devem ou não poder ir à praia. O poder da trumpofobia vai fazer detonar muito do que poderá vir a pôr em causa coisas que tínhamos como adquiridas definitivamente. No século do movimento dos povos, sucessor do século do povo, as migrações são o núcleo--base para as democracias, para o desenvolvimento e para a segurança dos povos.
Trump só começou agora. E começou pelas pessoas. Resta-nos estar atentos e perceber se vai ter coragem ou não, e ser coerente ou não, para tomar as mesmas decisões em relação às empresas e aos capitais. Se o fizer, é como se um século tivesse terminado. E se iniciasse um outro. Com premissas diferentes. Com impactos acumulados imprevisíveis. Com os “ocidentais” a terem de pensar bem como tudo isto aconteceu. Causas. Consequências. E o que fazer à unipolaridade política, normativa e militar, europeia e ocidental. Em coerência, como outros, há mais de um ano, eu lá fui avisando que Donald Trump era mais do que um simples elefante numa loja de porcelana. Por isso, mantenho. Se fosse americano, mesmo com a alternativa Hillary Clinton, nunca votaria Trump. Sobretudo por esta visão, que reputo muito grave, relativa à imigração.
Ao arrepio da história dos EUA. Aliás, se tivessem feito aos antepassados de Donald Trump o que ele está a fazer agora a imigrantes e refugiados, ele hoje não seria nem americano nem presidente. Pelos vistos, talvez tivesse sido melhor. Que a família Trump tivesse ficado na Alemanha ou na Escócia (terra de sua mãe). E ele. Atualmente, ou seria alemão ou escocês, e, a ter vida pública e mediática, as coisas seriam bem diferentes, mesmo que a sua cartilha programática fosse a que tem apresentado nos últimos meses.