Em Dezembro de 2001, depois de uma derrota nas autárquicas, António Guterres demitiu-se, segundo as suas próprias palavras, para evitar que o país caísse num “pântano político”. Na verdade, nessa altura, o PS, que tinha um governo com quase maioria no parlamento, via-se obrigado a negociar com um deputado do CDS os denominados “orçamentos do queijo limiano”, estando o governo refém desse deputado. A votação nas autárquicas demonstrou como o país estava a encarar esses acordos, o que foi suficiente para Guterres perceber que tinha que ir a eleições, que aliás o PS perderia.
Passaram-se quinze anos, e o episódio da TSU demonstrou que hoje o governo PS está igualmente numa situação limiana. O acordo de concertação social que este governo subscreveu foi inviabilizado no parlamento pelos seus pretensos parceiros da geringonça. Depois disso, a única forma que o governo encontrou para compensar os empresários foi proceder à redução do PEC, uma medida que estava prevista nos programas do PCP e do Bloco, mas não no do PS. Ora, isto significa que neste momento o PS só tem maioria parlamentar para executar os programas do PCP e do Bloco, deixando de a ter quando quer executar as suas próprias medidas. É assim manifesto que deixámos de ter um governo PS, passando a ter um governo do PCP e do Bloco por interposta pessoa.
A situação em que o governo caiu corresponde assim a um pântano político muito pior do que aquele em que tinha caído António Guterres. Mas António Costa tem muito mais resiliência do que Guterres, e não se importa nada em manter o seu governo neste pântano. Por isso, quando há alguém do seu próprio partido, como Francisco Assis, a avisar que esta situação é insustentável, o PS adopta a táctica tradicional de matar o mensageiro das más notícias. Foi assim que Francisco Assis foi ferozmente atacado pelo seu próprio partido que, no entanto, deixou em paz o PCP e o Bloco, apesar de eles terem roído a corda ao acordo que celebraram.
Só que as más notícias não desaparecem com o silêncio do mensageiro. O PS enfiou-se num pântano e, como escreveu Joaquim Silva Pinto, “do pântano não se sai a nado”. Neste momento, os juros dispararam, o Eurogrupo olha apreensivo para a situação, enquanto António Costa se entretém em cimeiras do sul da Europa, como se algum desses países do Sul estivesse em condições de nos tirar de sarilhos. Palpita-me que Marcelo vai ter que se deixar de afectos e começar a pensar como vamos sair deste pântano.