Impostos pesam mais de 60% do preço da gasolina

Impostos pesam mais de 60% do preço da gasolina


Governo pediu investigação aos preços, mas associações do setor afastam benefícios em margens nos combustíveis


Só os impostos representam cerca de 60% do preço final dos combustíveis. De acordo com as contas da Associação Portuguesa de Empresas Petrolíferas (Apetro), a carga fiscal na gasolina representa 63% do valor final, enquanto no gasóleo pesa 56%. A juntar a isto é necessário contar ainda com os custos fixos das despesas de armazenamento e distribuição e do biocombustível. Feitas as contas, as petrolíferas ficam com pouca margem para conseguirem alterar os valores que são cobrados aos consumidores finais, independentemente de o preço do petróleo subir ou descer nos mercados internacionais.

Mas os custos fixos não ficam por aqui. Desde o ano passado que os consumidores foram ainda confrontados com o aumento do imposto sobre produtos petrolíferos, que veio encarecer ainda mais o preço a cobrar aos clientes. Na última revisão trimestral do ISP, em novembro passado, o preço do litro do gasóleo no consumidor final sofreu uma redução de 1,2 cêntimos, enquanto o litro da gasolina ficou inalterado nos postos de gasolina.

O certo é que, após seis semanas consecutivas de agravamento nos preços dos combustíveis no mercado nacional, só esta semana é que vamos começar a sentir um pequeno alívio nos preços praticados. Ainda assim, estamos a falar de uma descida que será insuficiente para anular os aumentos acumulados nas últimas semanas, período em que o gasóleo aumentou 10% (mais de 10 cêntimos por litro) e a gasolina ficou 8,7 cêntimos mais cara (mais 6,7%).

A explicação é simples: o preço do gasóleo desceu um cêntimo por litro, enquanto a gasolina reduziu meio cêntimo por litro, passando a custar 1,25 euros e 1,46 euros por litro, respetivamente. Mas se compararmos com os valores que são praticados na vizinha Espanha, o fosso ainda é mais significativo. Em Portugal, além de os preços dos combustíveis serem mais altos do que na maioria dos países, as diferenças de preço face a Espanha chegam aos 11% no gasóleo e aos 18% na gasolina.

Investigação de preços 

Apesar do peso da carga fiscal, que é apontada pelo setor como a principal causa dos preços elevados que são praticados, o governo pediu à Autoridade da Concorrência (AdC) para realizar um novo estudo sobre a margem de lucro que as gasolineiras têm na venda ao público de combustíveis.

A Secretaria de Estado da Energia fez as contas e lembra que, em 2012, a margem bruta da gasolina era de 17% do preço final antes de impostos e a do gasóleo era de 18%, tendo subido ano após ano, para chegar a 2016 a 28% no caso da gasolina e a 24% no gasóleo, depois de eliminado o efeito da carga fiscal sobre os preços (ISP e IVA).

A Associação de Revendedores de Combustíveis (Anarec) já veio reagir ao garantir que não tem benefícios com o aumento da margem bruta sobre o preço final antes de impostos dos combustíveis.

“Não participamos na criação desse preço. Temos uma margem fixa que está contratualizada com as companhias petrolíferas, que são os nossos fornecedores. Portanto, se aumentar o preço dos combustíveis, a nossa margem mantém-se porque está contratualizado assim”, explicou a associação.

A Anarec vai mais longe e diz que “se alguém lucra com esse aumento, certamente não são os revendedores de combustíveis, que de resto há muitos anos lidam com várias dificuldades”, destacando entre elas “as magras margens” de comercialização e a “luta” por uma melhor distribuição das margens pela cadeia de valor.

Recorde-se que a margem bruta das empresas é calculada pela Entidade Nacional do Mercado de Combustíveis (ENMC) a partir da diferença entre o preço ao público (antes de impostos) praticado no mercado nacional e a cotação internacional dos refinados, incluindo importação e armazenamento. Mas para calcular a margem de lucro das gasolineiras é ainda necessário deduzir os custos fixos das gasolineiras, como o transporte do combustível até à bomba ou a mão-de- -obra nos postos de abastecimento.

Guerra antiga 

A verdade é que esta “desconfiança” não é nova. A nova presidente da AdC, Margarida Matos Rosa, em meados de novembro, quando estava apenas indigitada, disse, numa audição na comissão parlamentar de Economia, Inovação e Obras Públicas, que iria “estar atenta” ao mercado dos combustíveis e defendeu que, apesar do aumento da concorrência no setor devido à entrada de novos operadores, há “uma perceção” na sociedade de que o preço sobe muito depressa (acompanhando a subida do preço do petróleo), mas desce muito devagar.

“Teremos de estar atentos”, afirmou Margarida Matos Rosa, na altura, insistindo que esta era uma questão com a qual não deixaria de “lidar”.

A promessa recebeu uma resposta rápida por parte da Apetro ao lembrar que nenhum estudo da Autoridade da Concorrência (AdC) concluiu que há concertação de preços no setor dos combustíveis. “As inúmeras estatísticas publicadas pelas entidades competentes – Autoridade da Concorrência incluída – comprovam que os preços médios de venda ao público acompanham as oscilações das cotações dos produtos refinados, quer nas subidas quer nas descidas. Que eu me lembre, nunca foram detetadas anomalias ou insuficiências graves no mercado de combustíveis”, lembrou então o secretário-geral da associação, António Comprido.

Este não é um caso inédito. Sucessivos governos foram pedindo à Autoridade da Concorrência para que, no âmbito das suas competências, procedesse urgentemente à análise da formação do preço dos combustíveis. Um desses casos foi Manuel Pinho, ministro da Economia de José Sócrates, que solicitou essa intervenção em 2008. Nessa altura, o preço dos combustíveis tinha subido 14 vezes em quatro meses.

Já em 2011 foi a vez de o Automóvel Club de Portugal pedir uma investigação à autoridade. Na base estava uma queixa contra a Galp. O pedido foi negado mas, no ano passado, o Tribunal da Concorrência obrigou a AdC a analisar a reclamação.