Mário Soares – o construtor da democracia demoliberal


A manifestação da Alameda, com a sua carga simbólica e emotiva, trouxe ao de cima o Mário Soares pró-europeu, pró-democracia demoliberal, do Estado de direito. 


“É mais fácil obter o que se deseja com um sorriso do que com a ponta da espada.” Shakespeare

Morreu Mário Alberto Nobre Soares. Figura maior da nossa história política e social. Sobretudo do séc. xx. 

A sua vida, de quase um século, é um exemplo do percurso de alguém que se alimentou da coragem e da liberdade para protagonizar alguns dos momentos mais decisivos da história política e social portuguesa do séc. xx. 

Filho de família com posses e culta, sempre se destacou por não se deixar confundir pelo statu quo dominante e contagiante, até quando era titular e responsável principal de alguns órgãos de soberania. 

Ao partir e deixar-nos, é mais do que justo recordarmos que é a ele que devemos alguns combates, opções e decisões importantes. Para Portugal e para os portugueses. 

Combateu o Estado Novo, foi comunista, foi deportado, foi exilado e fundou um partido político pilar da democracia representativa em Portugal. 

Mário Soares, mesmo antes da revolução de abril de 1974, no exílio, foi fundamental para a criação de uma rede externa europeia pró-Portugal, a favor de Portugal ter uma democracia demoliberal, de tipo ocidental. 

Dos vários combates, opções e decisões em que tomou parte, destaco sobremaneira a sua opção pela construção de uma democracia demoliberal em Portugal. É, sem dúvida, o seu grande construtor. Sem ele, nos anos seguintes ao período revolucionário de Abril, dificilmente a opção e a decisão teriam sido essas. 

A sua chegada a Portugal, de comboio, nos idos dias quentes de Abril, foi o primeiro grande momento diferenciador em relação a Álvaro Cunhal. 

A sua relação com o Conselho da Revolução foi disso eloquente, até à sua extinção e substituição pelo Tribunal Constitucional. 

A manifestação da Alameda, com a sua carga simbólica e emotiva, trouxe ao de cima o Mário Soares pró-europeu, pró- -democracia demoliberal, do Estado de direito, da separação de poderes, da civilização do regime e do combate a uma ditadura comunista. 

Enquanto ministro dos Negócios Estrangeiros, primeiro-ministro e Presidente da República e candidato a presidente do Parlamento Europeu, foi um grande paladino dessa convicção forte, em contraponto com todo o tipo de formulações jurídico-constitucionais, sobretudo das fundadas em todo o tipo de sistemas totalitários, onde os elementos nucleares da democracia demoliberal nunca estavam presentes. 

Mário Soares, o construtor maior da democracia demoliberal portuguesa, deixa-nos também um legado maior enquanto escritor e intelectual. A esse nível, é extraordinária a sua obra. Para ele, escrever era como respirar. Escrever e publicar eram complementares. E uma forma de partilhar opiniões, absorvidas e partilhadas ou não, escrutinadas e criticadas ou não, o que importou sempre, para ele, foi estimular o debate, a reflexão, a partilha do conhecimento. 

Tive e tenho também neste domínio grande admiração e um grande respeito por ele. 

Em toda a minha vida, votei uma única vez em Mário Soares: nas eleições presidenciais da sua reeleição. E não estou arrependido. 

Conheci-o pessoalmente. Falei mais vezes com ele e até mais com a sua mulher nas últimas décadas das suas vidas. Testemunhei a sua preocupação com vários temas para além da política. Como crente, não duvido que Mário Soares morreu com as contas feitas com a vida. 

Que a figura e o seu exemplo em vários domínios da nossa vossa coletiva nos inspire, na hora da sua despedida, é o que desejo. 

 

Escreve à segunda-feira 


Mário Soares – o construtor da democracia demoliberal


A manifestação da Alameda, com a sua carga simbólica e emotiva, trouxe ao de cima o Mário Soares pró-europeu, pró-democracia demoliberal, do Estado de direito. 


“É mais fácil obter o que se deseja com um sorriso do que com a ponta da espada.” Shakespeare

Morreu Mário Alberto Nobre Soares. Figura maior da nossa história política e social. Sobretudo do séc. xx. 

A sua vida, de quase um século, é um exemplo do percurso de alguém que se alimentou da coragem e da liberdade para protagonizar alguns dos momentos mais decisivos da história política e social portuguesa do séc. xx. 

Filho de família com posses e culta, sempre se destacou por não se deixar confundir pelo statu quo dominante e contagiante, até quando era titular e responsável principal de alguns órgãos de soberania. 

Ao partir e deixar-nos, é mais do que justo recordarmos que é a ele que devemos alguns combates, opções e decisões importantes. Para Portugal e para os portugueses. 

Combateu o Estado Novo, foi comunista, foi deportado, foi exilado e fundou um partido político pilar da democracia representativa em Portugal. 

Mário Soares, mesmo antes da revolução de abril de 1974, no exílio, foi fundamental para a criação de uma rede externa europeia pró-Portugal, a favor de Portugal ter uma democracia demoliberal, de tipo ocidental. 

Dos vários combates, opções e decisões em que tomou parte, destaco sobremaneira a sua opção pela construção de uma democracia demoliberal em Portugal. É, sem dúvida, o seu grande construtor. Sem ele, nos anos seguintes ao período revolucionário de Abril, dificilmente a opção e a decisão teriam sido essas. 

A sua chegada a Portugal, de comboio, nos idos dias quentes de Abril, foi o primeiro grande momento diferenciador em relação a Álvaro Cunhal. 

A sua relação com o Conselho da Revolução foi disso eloquente, até à sua extinção e substituição pelo Tribunal Constitucional. 

A manifestação da Alameda, com a sua carga simbólica e emotiva, trouxe ao de cima o Mário Soares pró-europeu, pró- -democracia demoliberal, do Estado de direito, da separação de poderes, da civilização do regime e do combate a uma ditadura comunista. 

Enquanto ministro dos Negócios Estrangeiros, primeiro-ministro e Presidente da República e candidato a presidente do Parlamento Europeu, foi um grande paladino dessa convicção forte, em contraponto com todo o tipo de formulações jurídico-constitucionais, sobretudo das fundadas em todo o tipo de sistemas totalitários, onde os elementos nucleares da democracia demoliberal nunca estavam presentes. 

Mário Soares, o construtor maior da democracia demoliberal portuguesa, deixa-nos também um legado maior enquanto escritor e intelectual. A esse nível, é extraordinária a sua obra. Para ele, escrever era como respirar. Escrever e publicar eram complementares. E uma forma de partilhar opiniões, absorvidas e partilhadas ou não, escrutinadas e criticadas ou não, o que importou sempre, para ele, foi estimular o debate, a reflexão, a partilha do conhecimento. 

Tive e tenho também neste domínio grande admiração e um grande respeito por ele. 

Em toda a minha vida, votei uma única vez em Mário Soares: nas eleições presidenciais da sua reeleição. E não estou arrependido. 

Conheci-o pessoalmente. Falei mais vezes com ele e até mais com a sua mulher nas últimas décadas das suas vidas. Testemunhei a sua preocupação com vários temas para além da política. Como crente, não duvido que Mário Soares morreu com as contas feitas com a vida. 

Que a figura e o seu exemplo em vários domínios da nossa vossa coletiva nos inspire, na hora da sua despedida, é o que desejo. 

 

Escreve à segunda-feira