José Sócrates e Carlos Alexandre. Apanha-me… Se puderes

José Sócrates e Carlos Alexandre. Apanha-me… Se puderes


Um jogo do gato e do rato na vida real, com muito mais peripécias e patranhas do que o filme sobre Frank Abagnale Jr. Quem dera a Spielberg encontrar um argumento tão bom quanto a Operação Marquês… 


Estamos no final dos anos 70, em Coimbra. José Sócrates, um jovem com muitas ambições, obtém o curso de bacharel em Engenharia Civil no Instituto Superior de Engenharia de Coimbra e parte para Lisboa, em busca de uma vida melhor. Estava muito longe o que o esperaria. Das ascensão a primeiro-ministro e da queda para uma investigação que o coloca no centro de uma teia de corrupção.  Fuga ao fisco e lavagem de dinheiro são outras das suspeitas do Ministério Público. 
Quando começou a ser investigado, Sócrates vivia uma vida de luxo em Paris, num apartamento numa das zonas mais caras da capital francesa, passando despercebido numa sociedade que não era a sua. Uma vida que acabaria em novembro de 2014, quando o juiz Carlos Alexandre assinou a sua detenção.

Enquanto no filme de Steven Spielberg ‘Apanha-me Se Puderes’ o jogo do gato e do rato é feito com as duas partes em liberdade, a versão portuguesa mostra que nem sempre a realidade é tão linear e que às vezes estes jogos acontecem com um dos intervenientes presos. Se o realizador norte-americano tivesse esperado mais uns anos, de certeza que poderia aprimorar a sua obra…

No enredo que se desenrola no eixo Lisboa-Paris, o ‘vilão’ começa a responder às acusações do ‘bom da fita’ quando já está preso. Queixava-se de perseguição e programou uma série entrevistas e cartas que acabaram publicadas nos principais jornais nacionais. Nos 288 dias em que esteve em prisão preventiva, em Évora, recebeu várias visitas, conviveu com os restantes reclusos e fez exercício físico. 

“Apesar da minha insistência, nunca, em nenhum momento, nem a acusação nem o juiz foram capazes de me dizer quando e como é que fui corrompido, onde ou sequer em que país do mundo essa corrupção aconteceu, nem por quem, a troco de quê, qual a vantagem que obtive ou qual a que concedi, lícita ou ilícita. Nada, rigorosamente nada!” Esta é uma das frases mais famosas deste ‘episódio’, que terminou em setembro de 2015 quando saiu.

E é nesta altura que a saga se adensa: o antigo primeiro-ministro começa a fazer de tudo para defender a tese de que  o juiz Carlos Alexandre fez tudo para o por atrás das grades ao não questionar o que dizia o MP. 

Nos últimos tempos, depois de uma entrevista em que o juiz tentou passar a sua versão, Sócrates avançou para uma queixa no Tribunal da Relação e outra no Conselho Superior de Magistratura  exigindo o afastamento de Carlos Alexandre do caso. Após alguns meses de análise, as instituições decidiram manter o ‘super-juiz’ à frente da investigação, deitando por terra os planos do ex-governante. 

Nesta longa metragem, as duas partes tentam apanhar-se, proporcionando vários momentos de clímax.

Diferentes países É difícil chegar aos calcanhares de Frank Abagnale Jr., o protagonista do filme de Spielberg, e criar uma narrativa tão complexa, envolvendo várias identidades. Mas nesta ‘película à portuguesa’ também não faltam viagens ao estrangeiro e alternativas ao estilo de vida conhecido.

Foi aliás por aí que tudo começou, quando Sócrates decidiu ir viver para Paris em 2011, para estudar Ciência Política. Viveu uma vida bastante confortável – alugou um apartamento numa das zonas mais caras da capital francesa – e empenhou-se nos estudos, deixando para trás (aparentemente) a vida política portuguesa. Publicamente, justificou a vida que levava com um empréstimo pedido à Caixa Geral de Depósitos e uma herança deixada à mãe. Mas, tal como no filme, o MP entendeu que nem tudo era assim tão linear: os investigadores suspeitaram logo que a mãe de Sócrates poderia ter sido um dos meios que este usou para branquear dinheiro ilícito conseguido enquanto governante. 

Antes de ser detido, Sócrates tinha previsto um voo para o Brasil, país ao qual também mantém ligações – mais tarde viriam a ser investigadas as conexões de Sócrates à construtora Odebrecht, com a qual Lula da Silva tinha uma relação privilegiada. Mas se deste lado do Atlântico houve um ‘Apanha-me Se Puderes’, do outro também se assiste a um ‘Prenda-me Se For Capaz’ (nome dado no Brasil ao filme ‘Catch Me If You Can’), com a Operação Lava Jato. Duas películas tão parecidas que o que muda mesmo é quase só a tradução.adução.