46% das secundárias inflacionam notas

46% das secundárias inflacionam notas


Este ano há 236 escolas onde os professores deram uma nota três valores acima da classificação conseguida pelos alunos no exame nacional.


Quase metade das escolas secundárias dão notas inflacionadas aos alunos. Ou seja, a nota atribuída aos alunos que resulta da avaliação dos professores ao longo do ano letivo é superior à nota que, posteriormente, os alunos conseguem no exame nacional. O fenómeno – que acaba por condicionar o acesso dos alunos a uma universidade ou a um politécnico – não é novo mas tem sido uma das preocupações do Ministério da Educação nos últimos anos. De acordo com o ranking do B.I., este ano houve 236 escolas secundárias (46%) que, em média, atribuíram uma nota interna três valores acima da classificação obtida pelo aluno no exame nacional. Destas, 212 são escolas públicas sendo as restantes 24 escolas privadas.

Entre as dez escolas que mais inflacionam as notas, em 2016, a Básica e Secundária de Mogadouro ocupou o primeiro lugar. Os alunos desta escola não ultrapassaram uma média de 7,5 valores nos 22 exames nacionais. Mas em média, os professores atribuíram uma nota média de 13,02 valores. Ou seja, 5,5 valores acima da nota do exame. E não terá sido por coincidência que esta foi, aliás, a mesma escola que ficou em último lugar do ranking elaborado pelo B.I., com a média mais baixa de exames, a nível nacional.

Em segundo lugar entre as escolas que mais inflacionam notas está a Básica e Secundária Bispo D. Manuel Ferreira Cabral, em Santana, na Madeira. Aqui a diferença entre a nota interna e a nota externa (de exame) ascendeu aos 5,29 valores (ver tabelas ao lado). No ranking geral, esta escola surge na 505.ª posição da tabela com as médias dos exames mais elevadas, não ultrapassando os 8,43 valores.

Mas o reverso também acontece. Ou seja, há escolas onde os professores dão notas inferiores às conseguidas pelos alunos nos exames nacionais. Nesta situação, há este ano 279 secundárias que dão notas internas 3 valores abaixo das classificações dos exames.

A análise feita pelo B.I. teve como base as avaliações dos professores aos alunos internos (os que frequentam as aulas o ano inteiro) e as notas obtidas nos 22 exames. Foram consideradas as escolas onde foram realizadas mais de 100 provas e o desvio de três valores foi pensado tendo em conta a opinião de quatro ex-ministros da Educação que consideram ser este o máximo aceitável.

Em 2015, o ex-ministro Nuno Crato revelou que 24 escolas inflacionaram as notas internas dos seus alunos, de forma constante, entre 2009 e 2013. Deste grupo, 14 eram escolas privadas e a maioria (22) do norte do país. Para analisar a inflação das notas, a tutela desenhou um indicador para comparar as notas internas atribuídas pela escola com as notas atribuídas pelas outras escolas em exames, a alunos com resultados semelhantes.

Para tentar travar este cenário, o ministro do Ensino Superior e Ciência, Manuel Heitor, admite criar um sistema que ajuste automaticamente a classificação dos alunos com notas inflacionadas, durante o processo da candidatura ao Ensino Superior. Esta é uma das sugestões do grupo de trabalho que o ministro nomeou para estudar alterações ao concurso nacional de acesso ao Ensino Superior. Segundo o relatório do grupo de trabalho – que reconhece que esta “é uma questão aguda” e que “introduz óbvias desigualdades” – estes ajustes podem ser feitos de duas formas: através de ponderações que corrigem as notas das escolas ou por ajuste direto da nota interna no cálculo da nota de candidatura. Uma prática que, defende o ministro do Ensino Superior, é feita “há muitos anos” nos países anglo-saxónicos.

O desvio de notas foi denunciado em 2014 pelo Conselho Nacional da Educação (CNE) – órgão consultivo do Ministério da Educação. Na altura, o presidente do CNE, o ex-ministro da Educação David Justino, alertou que “os alunos que em provas de exame obtêm resultados mais fracos tendem a ser favorecidos pela avaliação interna”.

Depois disso, o ministério de Nuno Crato anunciou que investigou dez escolas e fez recomendações que estariam a ser cumpridas, mas a Inspeção-Geral de Educação e Ciência achou que devia averiguar melhor o que se passava em quatro dessas escolas. Os resultados nunca foram conhecidos.