A cerveja começou a ser produzida por volta de 8000 a.C. Egípcios, sumérios, gregos e romanos apreciavam o seu sabor característico que, com a evolução industrial, foi ganhando um novo gosto. Hoje em dia existem várias marcas de cerveja artesanal, que apostam num paladar mais forte e distinto. E a CUL – Cerveja da Universidade Lusófona – não é exceção.
A primeira cerveja universitária foi criada por Laura Teixeira de Vasconcelos, professora da Lusófona que decidiu dar uso a uma máquina antiga que ia ser deitada para o lixo e pôr os alunos a produzir a sua própria bebida. Mas a parte mais interessante desta história é que a criadora desta cerveja devia estar em casa, refastelada, a bebericar o seu néctar preferido – é que a professora Laura tem 80 anos de idade e vontade de continuar a produzir cerveja nas instalações universitárias.
Mas para perceber esta devoção é preciso conhecer o passado desta professora. Nascida em Lourenço Marques, Laura Rainho (nome de solteira, pelo qual é conhecida naquela que é ainda a sua terra) vive rodeada pela flora e fauna. “Eu gostava de ser fazendeira, sempre me apaixonou a vida agrícola e a natureza… Éramos livres”, recorda. Mas Moçambique ainda não tinha uma universidade, por isso teve de vir estudar para Portugal, para o Instituto Superior de Agronomia, sempre com o sonho de regressar à sua terra natal.
“Quando voltei para Moçambique, há mais de 50 anos, o meu marido foi convidado para trabalhar na central de cerveja que lá existia. Mandaram-no para a Bélgica e tirou o curso de cervejeiro. Eu dava aulas e colaborava na central de cerveja: formava as pessoas para os laboratórios. Treinei muitos técnicos para a central, mas era só colaboradora, não uma empregada”, contou ao i.
Com o 25 de Abril teve de deixar a sua casa em Moçambique e mudar-se para o Brasil. Por esta altura estava a tirar um pós-doutoramento e tinha vontade de regressar de vez a Portugal. E assim foi: nos anos 80 chega a Portugal e começa a trabalhar na Central de Cervejas, na Vialonga. “Nunca me pagaram como doutorada. Pagaram-me sempre como engenheira agrónoma mas, para compensar, davam-me um dia por semana para dar aulas. Por isso dei aulas em Évora, nos Açores, nos Estados Unidos, em muitos sítios”, explica a prof.a Laura.
Quando se reformou da Central, em 2001, já dava aulas na Lusófona há algum tempo. Pouco tempo depois soube que a administração da cervejeira iria ver-se livre de uma máquina de produção de cerveja artesanal, construída em 1968. “Soube que iam deitar fora a instalação-piloto porque tinham outra de 1000 mililitros e esta é de 120. Já não davam tanta importância a este tipo de instalações. Eu sabia não se podia deitar uma coisa destas fora, nem que fizesse dela apenas uma peça de museu. Mas a verdade é que é muito boa para ensinar, porque neste tipo de instalações vê-se o processo todo, e numa fábrica não”, explicou ao i a docente.
E assim, em 2005, a máquina foi parar às instalações da Universidade Lusófona, onde a professora Laura ensina aos seus alunos o processo de fermentação. É também usada numa das atividades que integram o Criar Saberes, um projeto da universidade dedicado aos alunos do secundário em que os estudantes ganham “uma noção do que querem para o futuro”, explicou ao i a gestora do projeto, Madalena Brás.
Problemas técnicos e humanos A CUL ainda não é comercializada, até porque, segundo a prof.a Laura, a universidade não o pode fazer. Apenas a associação de estudantes poderia vender a bebida mas, face ao baixo número de litros produzidos e à demanda existente, era difícil comercializar apenas esta cerveja.
Além disso, a instalação-piloto está neste momento parada e a precisar de manutenção – a pessoa que costumava tomar conta da máquina já não trabalha na Lusófona e ninguém a substituiu. “A Central tem um convénio connosco e dá-nos toda a matéria-prima necessária para fazer esta cerveja. Na minha opinião, com a produção interna e pedindo à central para fazer a produção industrial – só ao nível industrial é que este negócio dá lucro -, poderíamos ter dinheiro para fazer investigação na própria universidade. Mas eu não sei gerir essa parte, não depende só de mim”, confessou a prof.a Laura.
Mas as boas notícias acabam sempre por chegar: “O sucesso com o fabrico de cerca de 100 litros de cerveja no último mês de outubro permitiu confirmar o interesse da Universidade Lusófona em continuar com o projeto e será agora iniciada uma nova fase que vai levar a CUL aos vários polos da Lusófona, não só em Portugal como nos PALOP”, disse fonte da direção da universidade ao i.
A importância da cerveja na saúde Além de estar a fazer algo inovador, a prof.a Laura defende que a cerveja (e o álcool em geral) tem um papel fundamental na saúde das pessoas. “As cervejas e os vinhos não têm patogénicos. Quando havia epidemias, os que bebiam é que se safavam. Os que não bebiam morriam. Não vou estar cá em 2050 mas, pelo que vejo nas notícias, vai haver muitas infeções devido à resistência aos antibióticos. Estes vão deixar de funcionar como agora”, explicou.
“Se as pessoas conseguirem beber todos os dias, faz uma grande diferença. E até deviam cozinhar (na panela de pressão) com cerveja em vez de água: os produtos fazem menos mal. Eu faço isso, cozinho com cerveja. A comida fica com muito mais minerais do que se for feita em água. E com os minerais certos – mais potássio e menos sódio”, defende. Por isso, o ditado devia ser atualizado para ‘uma cerveja por dia, nem sabe o bem que lhe fazia’.”