Um presidente em caixa baixa


Marcelo Rebelo de Sousa foi o homem que armadilhou a administração da CGD. António Domingues foi apenas um dano colateral. O alvo foi António Costa


O presidente da República, o tal dos afetos e do grande apoio ao governo da geringonça, mete-se em tudo, fala sobre tudo e mais alguma coisa, faz figuras tristes no estrangeiro, como o diálogo surrealista com a rainha Isabel ii, baba–se com ditadores brutais, como Fidel Castro, e recebe de forma envergonhada chefes de Estado, como o presidente egípcio Al-Sisi, que combateu e venceu organizações islâmicas radicais, como a Irmandade Muçulmana, que iam transformar o Egito numa das maiores ameaças para o Médio Oriente e o Ocidente.

Mas o comentador feito presidente não mudou nada com a sua eleição. Nisso é coerente. O Marcelo de Sá Carneiro, de Balsemão, de Cavaco, de Guterres, de Paulo Portas e de Passos Coelho está bem vivo e recomenda-se. Que o diga António Costa, o irritante otimista. Não há jornalista, comentador, analista ou politólogo, amigo ou não da geringonça, que não realce as excelentes relações entre o presidente e o primeiro-ministro.

O mar de rosas banha Belém e S. Bento. O pior é o resto. E o resto é quando o governo e o primeiro-ministro avançam com medidas sem consultar previamente o senhor presidente e ouvir a sua sábia opinião. Foi o que aconteceu neste triste e lamentável folhetim da CGD. António Costa, a mando do Banco Central Europeu, alterou o estatuto dos gestores da Caixa para estes ganharem salários equiparados à banca privada. Marcelo não gostou e logo na promulgação do diploma deixou alguns recados.

Mas como as suas palavras caíram em saco roto, passou ao plano B. A transparência. Marques Mendes, conselheiro de Estado e seu fiel escudeiro, noticiou que os gestores da Caixa não só iam ganhar salários “milionários” como não tinham de apresentar ao Tribunal Constitucional os seus rendimentos e património. Compromissos assumidos pelo ministro das Finanças com a total concordância do governo que, ao abrigo das exigências do Banco Central Europeu, percebeu finalmente que a CGD, para se manter pública, tem de funcionar como um banco privado.

A demagogia populista da notícia espalhada com ar de indignação por Marques Mendes caiu como sopa no mel nos populistas demagógicos da extrema-esquerda que apoiam a geringonça e na esquerda populista e demagógica que está na oposição. Todos engoliram sem custo o isco atirado pelo leal conselheiro de Estado e, a partir daí, estava montado o arraial que culminou na demissão de António Domingues.

O PS começou por se encolher perante tanta demagogia, mas lá acabou por alinhar no baile pela voz muito autorizada do ilhéu Carlos César, um caso singular de devoção à causa pública. Com a oposição e o PS aos gritos de indignação e os gestores da Caixa perplexos perante tanta cobardia e falta de vergonha, a Caixa do bloco central e do CDS, agência de empregos seguros e bem pagos da classe política desempregada e balcão privilegiado dos amigos do bloco central e do CDS para negócios ruinosos, lá ficou sem administração e com o plano de recapitalização, a tal grande vitória de António Costa e companhia, mais uma vez adiado.

Marcelo, o presidente dos afetos e amigo da geringonça, levou a sua avante. António Domingues e a sua equipa de gestão foram apenas danos colaterais nesta guerrilha vergonhosa de Marcelo contra António Costa, o verdadeiro alvo e o grande derrotado neste obsceno processo.

O tal bom aluno europeu é agora olhado em Bruxelas e Frankfurt como um país que tem um presidente irresponsável e um governo que não cumpre os seus compromissos. A partir de agora, tudo será mais difícil e é natural que os critérios de avaliação da nova equipa liderada por Paulo Macedo sejam ainda mais apertados.

Mas mesmo que o ex-ministro da Saúde receba luz verde do BCE e da Comissão Europeia, a guerra não acabou. Resta sempre a demagógica e populista questão dos salários dos gestores, que o governo, e bem, quer manter. Esta semana, o populista e demagógico PSD, o tal que se absteve no lamentável voto de pesar pelo brutal ditador Fidel Castro, vai levar de novo ao parlamento uma proposta de lei que pretende reduzir os salários dos gestores da Caixa. Se tiver o apoio do CDS e da extrema-esquerda, o país vai assistir a mais um arraial de mau gosto. Com Marcelo Rebelo de Sousa a rir, o governo a chorar e a querida Caixa a sofrer.

À medida que os episódios se sucedem com este desgraçado banco público, mais urgente é a sua privatização. O BCE e a Comissão já lhe traçaram o destino. Só é público porque tem o Estado como único acionista. No resto, é privado. Na gestão, nos créditos concedidos, nos lucros e nos dividendos a pagar ao acionista.

Privatizar a Caixa é não só urgente como higiénico. Para evitar que presidentes em caixa baixa como Marcelo e partidos demagógicos e populistas como o PSD, PS, CDS, BE e PCP rebentem com o maior banco sediado em Portugal.

Escreve às segundas-feiras