Querido Pai Natal das Causas Impossíveis


Escrevo-te para te dizer que desejo que apareças em todas as casas. Sobretudo, aparece às famílias que já não acreditam em magia, “porque é só mais um ano, só mais um Natal”, aparece e surpreende-os com um toque teu. Dá-lhes amor


Como é, Pai Natal? Está tudo bem? A vida corre-te bem? Não me parece que tenhas muito por onde te queixar. Trabalhas uma única vez no ano (bem sei que no turno da noite mas, mesmo assim, és um desgraçado de um sortudo) e és mais popular que o Papa – o que não deixa de ser irónico porque, supostamente, o Natal deveria ser uma coisa religiosa. Mas adiante.

Como sabes, acreditei em ti até à chamada idade da vergonha – já tinha 10 anos e com 10 anos já é estúpido acreditar no Pai Natal. Mas eu acreditei de tal forma que, mesmo ainda não gostando de ver o noticiário, fui durante todos esses os anos a telespetadora mais atenta das reportagens que faziam contigo a viveres na Lapónia. Filmavam-te nesse teu mundo, mostravam-te no Jornal das 8 e era ver a minha fé aumentar exorbitavelmente – “Ele existe! Ele existe! Está ali a ser entrevistado!”.

Eras incrível e eu não duvidava disso. Amei-te durante dez anos, todos os meses, mesmo que só me aparecesses em casa uma vez por ano. Fui mesmo compreensiva.

Contudo, como nada dura para sempre, o dia da verdade chegou e acabei por descobrir a tua farsa, num mês qualquer. Se me concentrar, ainda consigo relembrar o choque que o meu pequenino coração sentiu quando, ao limpar uma gaveta por imposição de ser “o dia das limpezas grandes”, descobri a carta que, supostamente, a minha mãe te deveria ter enviado. Lembro-me de pegar na carta (muito confusa) e de questionar a minha mãe que, naquele momento, limpava o meu caótico quarto:

– Oh mamã, como é que esta carta está aqui? Tu não a enviaste ao Pai Natal?

E a minha mãe, envolvida naquela limpeza que a estava a enervar, saiu-lhe a verdade, de forma despachada e dura.

– Qual carta? Oh Marine, já tens 10 anos! O Pai Natal não existe!

E foi assim, que no meio da limpeza de sábado, o meu coração se partiu em dez pedaços porque afinal eras só uma invenção. Afinal não existias e eu andei a escrever para os CTT.

Agora perguntas, porque estou eu a escrever para ti, depois destes anos todos e apesar de me teres feito passar por idiota?

É muito simples, meu caro amigo diabético – o tempo passou e eu mudei certamente em muitas coisas mas, outras, foram só aprimoradas. E uma das que se manteve foi, de certeza, a crença nas causas impossíveis.

Dizem-nos que, com a idade, perdemos a inocência, a incredulidade, a fé e eu digo-te que ou as requintamos ou sujeitamo-nos a viver sem encanto e melodia. E é por querer manter alguma da minha inocência (e se tivesse sido possível, preferiria nunca ter encontrado aquela carta que afinal não chegou a ser enviada) que resolvi voltar a acreditar em ti.

Claro que já não te vejo como o Pai Natal que desce pela chaminé e distribui presentes – não preciso de acreditar nisso porque estou-me bem a marimbar se os putos recebem o seu iPhone novo – mas gosto de te imaginar como o Pai Natal das causas impossíveis. Gosto de crer que provocas pequenos milagres. Gosto de achar que, pelo menos nesta altura do ano, as pessoas ficam contagiadas pela felicidade da partilha e se tornam mais saudosas, mais sensíveis, mais gratas. Gosto de as ver a apertar os avós – porque é Natal – a comer sonhos e relembrar sonhos – porque é Natal – a cantarem desafinados e a rirem-se disso – porque é Natal – a terem altas hospitalares, sem estarem à espera – porque é Natal – a doarem a folga à colega, para estar com o filho que adoeceu – porque é Natal.

Querido Pai Natal das Causas Impossíveis,

Escrevo-te para te dizer que desejo que apareças em todas as casas. Sobretudo, aparece às famílias que já não acreditam em magia, “porque é só mais um ano, só mais um Natal”, aparece e surpreende-os com um toque teu. Dá-lhes amor. E se quiseres ser romântico, não dispenses a neve. Ficava-te tão bem.

 

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