Os portugueses não mandam cá dentro


Estão dependentes dos eurocratas e do dinheiro de fora. A banca é quase toda estrangeira, o que não é necessariamente um mal depois do que se viu


1) Quando se vê ou ouve um noticiário ou se lê um jornal, constata-se que Portugal deixou de ter soberania em praticamente tudo, nomeadamente nas áreas económicas e financeiras, estando transformado numa espécie de província como na Roma antiga.

As dependências têm duas vertentes particularmente penosas, a política e a empresarial. Na política, não há que ver. Estamos reduzidos (nós e quase todos os países da União) a executar estratégias comuns e a mandar o Orçamento primeiro para Bruxelas para visto prévio, podendo quando muito o nosso parlamento mudar verbas de um lado para o outro. O sistema até se perceberia num quadro de igualdade, mas já se verificou que essa premissa é uma ficção. Há uns quantos países, como França, Alemanha e Itália, precisamente os mais ricos do euro e da União, que fazem arranjos escandalosos debaixo da mesa. Diariamente, responsáveis portugueses vão às fontes de poder europeias receber orientações e pedir autorizações sobre um vasto conjunto de matérias, como se viu com a nomeação da administração Domingues para a CGD e se repete agora depois da demissão deste, ficando supostamente os governantes portugueses com o direito de propor nomes.

A somar a este estado de dependência há a circunstância de a nossa economia ter as suas maiores empresas na posse de capitais estrangeiros. A banca está toda fora do controlo interno, se excetuarmos a CGD, o Montepio e os despojos do BES, agora conhecidos por Novo Banco. Num certo sentido, talvez esta dependência externa seja uma salvaguarda depois das incompetências e manigâncias ocorridas no BES, no BCP, no Banif, no BPN, no BPP e quejandos. Por seu lado, as maiores seguradoras também já não são de cá. E se olharmos para as outras grandes empresas estruturantes, verificamos que também aí está tudo fora do controlo nacional. A Galp, a EDP, a REN, a ANA, a PT e mais umas quantas são geridas em função de interesses externos, e, também no caso da PT, a intervenção estrangeira veio salvar a parte portuguesa da empresa de uma destruição total. Excetuando as grandes cadeias de distribuição como a Jerónimo Martins e a Sonae, restam em mãos portuguesas meia dúzia de empresas de média dimensão.

Com este panorama, não há qualquer possibilidade de um governo ter efetivo poder na economia e traçar rumos, a menos que se desenhe rapidamente uma estratégia consistente e unanimemente aceite de captação de projetos industriais, contando para isso com uma AICEP a sério, com empresas de lóbi especializadas e com os favores das agências de rating, que importa tratar nas palminhas. Enquanto assim não for, o rumo do país é aquele que os interesses políticos e económicos externos entenderem. Quer se queira quer não, é este o estado das coisas e, por isso, não vale a pena andar a pressionar muito para se mudar, por exemplo, o ministro da Economia, porque em rigor, apesar de poucochinho e fraquinho, estar lá ele ou outro é a mesma coisa. Como diria o Herman, na Rua da Horta Seca é mais bolos.

2) Como aqui se previu desde logo, António Domingues demitiu-se da CGD, arrastando mais uns quantos. Não tinha escapatória e também não tinha razão, mesmo que alguém lhe tivesse feito promessas no sentido de não ter de apresentar a declaração de rendimentos, pois a lei fundamental sobre a matéria ficou inalterada, ainda que talvez por incompetência técnico-jurídica. Quem ficou menos mal na fotografia foi, curiosamente, Mário Centeno. A única vez que falou do assunto assumiu que havia mesmo o objetivo de isentar os gestores de mostrar os bens ao Tribunal Constitucional. Quando se deu a bronca, Centeno calou-se em vez de dar o dito por não dito. Já não é mau nos tempos que correm. E também não é mau para o governo e o país, pois este ministro parece ser o maior trunfo do governo depois de Costa. Fala-se agora em Paulo Macedo, Nuno Amado ou Carlos Tavares para presidir à CGD. O primeiro seria excelente. Os outros, tendo qualidade, gerariam certamente controvérsia. Mas há, claro, a solução “sempre- -em-pé”, que passaria por Rui Vilar.

3) O que se passa na CP? A administração terminou o mandato em fins de 2015, permanecendo em funções com todas as limitações que essa circunstância impõe e a que se soma uma gestão sem grande brio. Então não chegou um ano para confirmar os atuais gestores ou para nomear uma nova equipa? Lamentável!

4) Para ler o passado e adivinhar o futuro, consta não haver melhor que uma mesa de pé-de-galo onde deitar os instrumentos de leitura. Na política de hoje é mais ou menos a mesma coisa. Vai ter, portanto, de se dar muita atenção ao congresso do PCP deste fim de semana, pois o partido é o terceiro pé da mesa em que assenta a geringonça… Valha São Jerónimo a António Costa.

 

Jornalista