Equívocos e casos complexos


Num país tão pequeno cabem tantas confusões que se percebe a ideia de que não nos sabemos governar.


1) A trapalhada à volta da administração da Caixa envolve muita gente. Começa em António Domingues e na sua equipa, e no processo de escolhas e de seleção que envolveu o governo, o regulador nacional e o BCE. Atinge ainda os partidos que miseravelmente se aproveitam do caso para fazer demagogia. Uma vergonha que inevitavelmente está a destruir ainda mais o valor da CGD. Talvez a primeira solução patriótica passe por António Domingues renunciar ao cargo. Até porque, se é assim tão bom, de certeza que arranja num instante quem lhe pague os tais 400 mil euros/ano mais comissões. Os grandes treinadores arranjam sempre clube.

2) Há aspetos que não batem certo em alguns dados públicos. Há dias, na TVI24, Manuela Ferreira Leite assinalou um caso misterioso. Como é possível o desemprego estar a diminuir se o investimento não aumenta? Em teoria, o emprego cresce quando sobe o investimento. Mas agora parece que não. A chave do problema pode estar na circunstância de se contarem estágios como emprego verdadeiro. Ou, pior ainda, de tudo se dever à passagem de desempregados a reformados ou à existência de desempregados que têm uma inatividade tão longa que deixam de estar recenseados depois de perderem todos os apoios. A isto pode ainda somar–se a hipótese de o êxodo de gente para o estrangeiro não ter diminuído assim tanto. Será que alguém explica?

3) Quanto ao investimento, os dados não são famosos. Mas aqui pode haver um excesso de pessimismo gerado pelas estatísticas e falhas na recolha de elementos. Alguns especialistas asseguram que há investimento estrangeiro que não é detetado, pois é canalizado por empresas nacionais, e que se dirige a setores como o turismo, o qual, entretanto, gera bastante emprego precário. Uma justificação frágil e que encerra outros perigos.

4) Ainda em relação ao investimento, seria excelente a confirmação formal da notícia do “Jornal de Negócios”, segundo a qual a vinda de mais um novo modelo para a fábrica de Palmela iria gerar 1500 contratações. Considerando que essa iniciativa teria repercussão direta em algumas empresas fornecedoras da VW, teríamos um excelente sinal de retoma e a vinda de dinheiro para um setor produtivo, e não uma mera aplicação financeira numa empresa rentável do Estado que acaba amortizada em meia dúzia de anos por via da exportação dos lucros, depois de inevitavelmente passar por um processo de saídas com encargos para o Estado. Ainda por cima, os exemplos que tivemos foram sempre anunciados como operações para cobrir a dívida pública, a qual nunca parou de subir.

5) Já se sabe que as eleições autárquicas são aquelas em que todos os partidos cantam vitória, tal é a dificuldade em perceber exatamente o que corresponde à votação e implantação de cada um. Seja como for, são importantíssimas e mais se tornam quando acontecem a meio de uma legislatura, como sucederá em 2017. Lisboa é, neste processo, um ponto estratégico. No PSD é cada vez mais óbvio que Santana não vai a jogo. Prefere manter–se na Santa Casa, onde faz um trabalho notável, resguardando-se para pensar num regresso à política através de uma segunda subida à liderança do PPD/PSD, caso Passos não se aguente, o que, aliás, é improvável. Este cenário – abordado neste espaço há semanas – está a consolidar-se, enquanto se verifica que não há nenhum barão no PSD disponível para se candidatar à capital, preferindo outras cadeiras de conforto. A manter-se a situação, os sociais-democratas serão obrigados a ir a reboque de Assunção Cristas, que avançou em força. Dominada por políticos da chamada Linha, a distrital de Lisboa do PSD parece conformar-se com a situação, dando sinais de estar mais interessada no que se vai passar em Cascais, Oeiras e Sintra. O não aparecimento de uma candidatura credível em Lisboa significaria que o PSD local está subalternizado, sobrando-lhe algumas freguesias da capital para se afirmar, o que, sendo importante, não deixa de ser pouco. Veremos se há quem não se conforme com a situação.

6) José Sócrates é agora apontado como tendo pago (através do seu amigo de sempre) a um blogger para o elogiar e atacar os adversários. A defesa do ex-primeiro- -ministro nega violentamente a acusação. Uma das curiosidades do caso Sócrates está na circunstância de demonstrar uma permanente incapacidade para desmentir com factos tudo o que a imprensa lhe aponta (como, por exemplo, o trem de vida em Paris, as relações com certas pessoas e alguns pontos no seu curriculum). O mesmo não se pode dizer da capacidade de defesa de Sócrates perante a justiça, a qual não apresenta uma acusação substancial e fundamentada ao fim de dois anos. Quanto ao blogger, nada de estranho. No governo anterior também existia um tal Guerra que escrevia em tudo quanto é sítio, perseguindo e insultando qualquer jornalista ou cronista que não se desfizesse em loas à governação da época. Onde andará esse tal Guerra?

Jornalista


Equívocos e casos complexos


Num país tão pequeno cabem tantas confusões que se percebe a ideia de que não nos sabemos governar.


1) A trapalhada à volta da administração da Caixa envolve muita gente. Começa em António Domingues e na sua equipa, e no processo de escolhas e de seleção que envolveu o governo, o regulador nacional e o BCE. Atinge ainda os partidos que miseravelmente se aproveitam do caso para fazer demagogia. Uma vergonha que inevitavelmente está a destruir ainda mais o valor da CGD. Talvez a primeira solução patriótica passe por António Domingues renunciar ao cargo. Até porque, se é assim tão bom, de certeza que arranja num instante quem lhe pague os tais 400 mil euros/ano mais comissões. Os grandes treinadores arranjam sempre clube.

2) Há aspetos que não batem certo em alguns dados públicos. Há dias, na TVI24, Manuela Ferreira Leite assinalou um caso misterioso. Como é possível o desemprego estar a diminuir se o investimento não aumenta? Em teoria, o emprego cresce quando sobe o investimento. Mas agora parece que não. A chave do problema pode estar na circunstância de se contarem estágios como emprego verdadeiro. Ou, pior ainda, de tudo se dever à passagem de desempregados a reformados ou à existência de desempregados que têm uma inatividade tão longa que deixam de estar recenseados depois de perderem todos os apoios. A isto pode ainda somar–se a hipótese de o êxodo de gente para o estrangeiro não ter diminuído assim tanto. Será que alguém explica?

3) Quanto ao investimento, os dados não são famosos. Mas aqui pode haver um excesso de pessimismo gerado pelas estatísticas e falhas na recolha de elementos. Alguns especialistas asseguram que há investimento estrangeiro que não é detetado, pois é canalizado por empresas nacionais, e que se dirige a setores como o turismo, o qual, entretanto, gera bastante emprego precário. Uma justificação frágil e que encerra outros perigos.

4) Ainda em relação ao investimento, seria excelente a confirmação formal da notícia do “Jornal de Negócios”, segundo a qual a vinda de mais um novo modelo para a fábrica de Palmela iria gerar 1500 contratações. Considerando que essa iniciativa teria repercussão direta em algumas empresas fornecedoras da VW, teríamos um excelente sinal de retoma e a vinda de dinheiro para um setor produtivo, e não uma mera aplicação financeira numa empresa rentável do Estado que acaba amortizada em meia dúzia de anos por via da exportação dos lucros, depois de inevitavelmente passar por um processo de saídas com encargos para o Estado. Ainda por cima, os exemplos que tivemos foram sempre anunciados como operações para cobrir a dívida pública, a qual nunca parou de subir.

5) Já se sabe que as eleições autárquicas são aquelas em que todos os partidos cantam vitória, tal é a dificuldade em perceber exatamente o que corresponde à votação e implantação de cada um. Seja como for, são importantíssimas e mais se tornam quando acontecem a meio de uma legislatura, como sucederá em 2017. Lisboa é, neste processo, um ponto estratégico. No PSD é cada vez mais óbvio que Santana não vai a jogo. Prefere manter–se na Santa Casa, onde faz um trabalho notável, resguardando-se para pensar num regresso à política através de uma segunda subida à liderança do PPD/PSD, caso Passos não se aguente, o que, aliás, é improvável. Este cenário – abordado neste espaço há semanas – está a consolidar-se, enquanto se verifica que não há nenhum barão no PSD disponível para se candidatar à capital, preferindo outras cadeiras de conforto. A manter-se a situação, os sociais-democratas serão obrigados a ir a reboque de Assunção Cristas, que avançou em força. Dominada por políticos da chamada Linha, a distrital de Lisboa do PSD parece conformar-se com a situação, dando sinais de estar mais interessada no que se vai passar em Cascais, Oeiras e Sintra. O não aparecimento de uma candidatura credível em Lisboa significaria que o PSD local está subalternizado, sobrando-lhe algumas freguesias da capital para se afirmar, o que, sendo importante, não deixa de ser pouco. Veremos se há quem não se conforme com a situação.

6) José Sócrates é agora apontado como tendo pago (através do seu amigo de sempre) a um blogger para o elogiar e atacar os adversários. A defesa do ex-primeiro- -ministro nega violentamente a acusação. Uma das curiosidades do caso Sócrates está na circunstância de demonstrar uma permanente incapacidade para desmentir com factos tudo o que a imprensa lhe aponta (como, por exemplo, o trem de vida em Paris, as relações com certas pessoas e alguns pontos no seu curriculum). O mesmo não se pode dizer da capacidade de defesa de Sócrates perante a justiça, a qual não apresenta uma acusação substancial e fundamentada ao fim de dois anos. Quanto ao blogger, nada de estranho. No governo anterior também existia um tal Guerra que escrevia em tudo quanto é sítio, perseguindo e insultando qualquer jornalista ou cronista que não se desfizesse em loas à governação da época. Onde andará esse tal Guerra?

Jornalista