Morte ao sol?


O atual Presidente da República já vetou, em poucos meses, tantos diplomas emanados da Assembleia da República como alguns dos seus antecessores durante todo o mandato. A perda de capital político resultante de tais vetos é atenuada pelo efeito tonificador da minoria PSD-CDS


Atentos ao frenesim político-legislativo que se vive por estes dias, ninguém diria que a Assembleia da República se encontra no gozo de férias, encerrada a primeira sessão legislativa da 13ª legislatura. O número é aziago e talvez justifique uma sessão legislativa heterodoxa, com a tomada de posse de dois governos constitucionais e a sucessão de dois Presidentes da República. Não obstante, o termo da sessão permite fazer um balanço da actividade legislativa.

A primeira conclusão a retirar é a que aponta para o retomar do primado da AR no exercício da função legislativa, o que é normal quando o governo não dispõe de uma maioria parlamentar. Assistimos a uma diminuição da legislação produzida ao abrigo de autorizações legislativas, a fórmula canónica ao abrigo da qual legislam os governos maioritários. Mas o recurso à via legislativa parlamentar resulta também da necessidade de dar protagonismo político aos três partidos que, para além do PS, apoiam o governo mas que não integram o executivo. A via parlamentar permite a cada um dos três partidos (e às vezes até ao quarto, de natureza unideputal) reivindicar a sua quota parte de sucesso nos feitos legislativos.

O favor dado à atividade legislativa parlamentar tem duas consequências importantes em sede de mecanismos de controlo da actividade legislativa. Desde logo coloca o PR frente à AR, o que o obriga a gastar mais capital político aquando de um veto do que o que aconteceria com um veto dirigido a um diploma proveniente do governo. O confronto entre PR e AR em sede legislativa é agora assumido como o primeiro round de combate político quando, em sede de governos maioritários, o confronto entre PR e AR é, muitas vezes, o resultado, em segundo round, da transformação pelo governo com apoio parlamentar maioritário de um seu diploma vetado pelo PR numa iniciativa parlamentar. Não por acaso, o actual PR já vetou, em poucos meses, tantos diplomas emanados da AR como alguns dos seus antecessores durante todo o mandato. A perda de capital político resultante de tais vetos é atenuada, sobretudo em temas “fracturantes” pelo efeito tonificador na “minoria alternativa” PSD-CDS-PP que continua a olhar com preocupação para as ambições hegemónicas de Belém.

Em segundo lugar o governo minoritário do PS com apoio parlamentar do BE e do PCP está, bastas vezes, imune ao mecanismo da apreciação parlamentar de decretos-lei na medida em que o sucesso de tal apreciação obrigaria a uma coligação de vontades que incluísse PSD, BE e PCP, coligação que teria custos políticos muito elevados para a esquerda. Serve de exemplo a recente indignação de origem Facebookiana dirigida contra o decreto-lei que executa a autorização legislativa em sede de IMI e que constava do OE para 2016, aprovado pelo PS, BE e PCP. 

Pelo lado da actividade legislativa do governo há uma sensível diminuição da produção fruto de um arranque mais tardio do que o normal, da menor produção legislativa de qualquer governo em início de funções e, é preciso dizê-lo, por um momento lírico pelo qual passou o XXI governo constitucional e que se traduziu na vontade de “não legislar” ou de “legislar pouco”. Esta deriva adolescente que poderia ter como fundamento uma reduzida esperança de vida do Executivo tem vindo progressivamente a ser corrigida. Alguma da ajuda à correcção vem do exterior, à medida que começam a cair os prazos de transposição das directivas da UE. 

Já na frente interna o governo vai descobrindo, com surpresa, mas também com alegria, que a actividade legislativa é não só necessária como também se pode revelar útil. Mais razões para não declarar morte ao sol.

Escreve à sexta-feira


Morte ao sol?


O atual Presidente da República já vetou, em poucos meses, tantos diplomas emanados da Assembleia da República como alguns dos seus antecessores durante todo o mandato. A perda de capital político resultante de tais vetos é atenuada pelo efeito tonificador da minoria PSD-CDS


Atentos ao frenesim político-legislativo que se vive por estes dias, ninguém diria que a Assembleia da República se encontra no gozo de férias, encerrada a primeira sessão legislativa da 13ª legislatura. O número é aziago e talvez justifique uma sessão legislativa heterodoxa, com a tomada de posse de dois governos constitucionais e a sucessão de dois Presidentes da República. Não obstante, o termo da sessão permite fazer um balanço da actividade legislativa.

A primeira conclusão a retirar é a que aponta para o retomar do primado da AR no exercício da função legislativa, o que é normal quando o governo não dispõe de uma maioria parlamentar. Assistimos a uma diminuição da legislação produzida ao abrigo de autorizações legislativas, a fórmula canónica ao abrigo da qual legislam os governos maioritários. Mas o recurso à via legislativa parlamentar resulta também da necessidade de dar protagonismo político aos três partidos que, para além do PS, apoiam o governo mas que não integram o executivo. A via parlamentar permite a cada um dos três partidos (e às vezes até ao quarto, de natureza unideputal) reivindicar a sua quota parte de sucesso nos feitos legislativos.

O favor dado à atividade legislativa parlamentar tem duas consequências importantes em sede de mecanismos de controlo da actividade legislativa. Desde logo coloca o PR frente à AR, o que o obriga a gastar mais capital político aquando de um veto do que o que aconteceria com um veto dirigido a um diploma proveniente do governo. O confronto entre PR e AR em sede legislativa é agora assumido como o primeiro round de combate político quando, em sede de governos maioritários, o confronto entre PR e AR é, muitas vezes, o resultado, em segundo round, da transformação pelo governo com apoio parlamentar maioritário de um seu diploma vetado pelo PR numa iniciativa parlamentar. Não por acaso, o actual PR já vetou, em poucos meses, tantos diplomas emanados da AR como alguns dos seus antecessores durante todo o mandato. A perda de capital político resultante de tais vetos é atenuada, sobretudo em temas “fracturantes” pelo efeito tonificador na “minoria alternativa” PSD-CDS-PP que continua a olhar com preocupação para as ambições hegemónicas de Belém.

Em segundo lugar o governo minoritário do PS com apoio parlamentar do BE e do PCP está, bastas vezes, imune ao mecanismo da apreciação parlamentar de decretos-lei na medida em que o sucesso de tal apreciação obrigaria a uma coligação de vontades que incluísse PSD, BE e PCP, coligação que teria custos políticos muito elevados para a esquerda. Serve de exemplo a recente indignação de origem Facebookiana dirigida contra o decreto-lei que executa a autorização legislativa em sede de IMI e que constava do OE para 2016, aprovado pelo PS, BE e PCP. 

Pelo lado da actividade legislativa do governo há uma sensível diminuição da produção fruto de um arranque mais tardio do que o normal, da menor produção legislativa de qualquer governo em início de funções e, é preciso dizê-lo, por um momento lírico pelo qual passou o XXI governo constitucional e que se traduziu na vontade de “não legislar” ou de “legislar pouco”. Esta deriva adolescente que poderia ter como fundamento uma reduzida esperança de vida do Executivo tem vindo progressivamente a ser corrigida. Alguma da ajuda à correcção vem do exterior, à medida que começam a cair os prazos de transposição das directivas da UE. 

Já na frente interna o governo vai descobrindo, com surpresa, mas também com alegria, que a actividade legislativa é não só necessária como também se pode revelar útil. Mais razões para não declarar morte ao sol.

Escreve à sexta-feira