O passar dos Verões


Há mais de vinte anos que venho de férias para a praia onde me encontro. No primeiro Verão no toldo ao lado do meu estava um casal novo com dois filhos pequenos. O mais velho não devia ter mais de quatro anos.


Nesse ano, várias vezes sorri com as suas tropelias. Todos os anos os vejo quando aqui estou e todos os anos me esqueço deles quando me vou embora. 

As duas crianças pequenas são hoje dois jovens adultos. Os pais estão na meia-idade. Vi-os crescer e envelhecer a cada Verão que passou. Nunca lhes falei e julgo que nunca repararam em mim. Se sim, fizeram como eu e não o demonstraram. Há uma familiaridade muito própria que seria destruída com uma palavra. Até com um olhar. Principalmente quando com uma breve busca no facebook ficamos a saber nomes, estudos, trabalho e cidade onde os outros vivem.

A ignorância sobre a vida das pessoas é ainda uma forma de ligação. Permite que, num breve fechar de olhos, num manusear da cabeça, num pensamento que nos ocorre, esqueçamos que elas existem. Como se desaparecessem numa fracção de segundos. Mas desta vez aconteceu algo que fez a recordação ficar. 

Nestas férias o miúdo mais velho olhou para o meu filho que tinha a idade dele quando aqui estive da primeira vez, e sorriu. Achou-lhe piada. Como eu lhe achei há tantos anos. E assim de repente, porque olhamos quando podíamos estar desatentos, passa-se um testemunho. Quem sabe o meu miúdo sorrirá quando vir o filho daquele rapaz nesta praia. E uma ligação que se desconhece instala-se e vinga entre duas famílias.


O passar dos Verões


Há mais de vinte anos que venho de férias para a praia onde me encontro. No primeiro Verão no toldo ao lado do meu estava um casal novo com dois filhos pequenos. O mais velho não devia ter mais de quatro anos.


Nesse ano, várias vezes sorri com as suas tropelias. Todos os anos os vejo quando aqui estou e todos os anos me esqueço deles quando me vou embora. 

As duas crianças pequenas são hoje dois jovens adultos. Os pais estão na meia-idade. Vi-os crescer e envelhecer a cada Verão que passou. Nunca lhes falei e julgo que nunca repararam em mim. Se sim, fizeram como eu e não o demonstraram. Há uma familiaridade muito própria que seria destruída com uma palavra. Até com um olhar. Principalmente quando com uma breve busca no facebook ficamos a saber nomes, estudos, trabalho e cidade onde os outros vivem.

A ignorância sobre a vida das pessoas é ainda uma forma de ligação. Permite que, num breve fechar de olhos, num manusear da cabeça, num pensamento que nos ocorre, esqueçamos que elas existem. Como se desaparecessem numa fracção de segundos. Mas desta vez aconteceu algo que fez a recordação ficar. 

Nestas férias o miúdo mais velho olhou para o meu filho que tinha a idade dele quando aqui estive da primeira vez, e sorriu. Achou-lhe piada. Como eu lhe achei há tantos anos. E assim de repente, porque olhamos quando podíamos estar desatentos, passa-se um testemunho. Quem sabe o meu miúdo sorrirá quando vir o filho daquele rapaz nesta praia. E uma ligação que se desconhece instala-se e vinga entre duas famílias.