Foi em 1999 que a Câmara Municipal de Sines organizou pela primeira vez o Festival Músicas do Mundo (FMM), motivado pela importância crescente da world music. Nessa primeira edição tiveram lugar sete concertos; nesta 18.a edição serão 47, com músicos oriundos de países tão distantes como a Noruega e o Mali (ver programação). Um retrato musical que reflete o mundo em que vivemos. E onde nunca nos pareceu tão importante celebrar esse mesmo mundo, na sua unidade mas também nas suas particularidades, como explicou ao i Carlos Seixas, diretor artístico e de produção do FMM Sines.
Numa altura tão conturbada, faz cada vez mais sentido existir um festival como o FMM Sines, que no fundo celebra a música como linguagem universal?
O FMM Sines é um festival que privilegia as pontes e o conhecimento do outro. Numa altura em que, no Ocidente, se fazem apelos ao levantar de novas barreiras, a novas formas de isolacionismo, à diabolização do que é desconhecido, este festival faz muito sentido pela sua mensagem de abertura e liberdade.
Aliás, muitos dos músicos do cartaz são naturais de países em conflito ou países onde o termo refugiado se tornou uma presença regular no vocabulário. De que maneira crê que a crise mundial de refugiados poderá estar presente no discurso dos músicos desta edição?
A crise de refugiados já esteve presente no discurso de vários artistas do festival do ano passado e vai voltar a acontecer este ano. Independentemente da sua origem – africana, asiática, americana, europeia –, os artistas do FMM Sines são artistas preocupados com o mundo que os rodeia.
A política é, de resto, algo fundamental para a música do mundo – temos, por exemplo, o caso de Billy Bragg.
As músicas do mundo não têm um cariz mais político que outras músicas. O que acontece nas músicas do mundo é que, ao ouvi-las, nos confrontamos com causas menos divulgadas, e isto pela voz de quem está nelas envolvido ou que as conhece de perto – por vezes, na pele. É um mundo maior que se faz ouvir: na alegria, na tristeza e também na mensagem de cunho político.
Quais foram os critérios usados para a escolha do cartaz deste ano?
Os de sempre. Qualidade em primeiro lugar. Atenção às músicas de hoje, jovens e urbanas. Uma tradição que não seja de museu. E um ouvido à escuta das periferias.
E consegue destacar alguns espetáculos?
Normalmente não destacamos espetáculos específicos e procuramos dar um tratamento igual a todos os artistas. É também por isso que o festival não programa concertos em simultâneo. O FMM Sines é um convite a uma viagem que pode, e deve, ser seguida integralmente pelo público.
O que esteve na razão de base para levar Sines a criar um festival de música do mundo, e não um festival “mais fácil” em termos comerciais?
O festival nasceu no Castelo de Sines, monumento ligado à vida de Vasco da Gama. As músicas do mundo tiveram, na altura, essa relação fundadora com, não uma glorificação acrítica dos Descobrimentos, mas uma ideia de viagem e contacto intercultural. Daí, o festival evoluiu para o que é hoje, em que nos abrimos a muito mais do que às músicas de raiz. Interessa-nos divulgar a música popular em todas as suas expressões – da mais tradicional à mais experimentalista –, numa perspetiva global. Foi este o festival que achámos interessante fazer e é este que queremos manter. Um festival mais fácil em termos comerciais seria apenas mais um festival e dificilmente teria chegado à 18.a edição.
E de que forma é que o FMM se tornou basilar para Sines e toda a região?
O FMM tornou-se uma marca de Sines e é hoje uma iniciativa querida pela esmagadora maioria da população, que o adotou como seu e o tem como motivo de orgulho. As pessoas reconhecem que o festival tem um forte impacto na notoriedade e na economia local de Sines.
Sabe qual o número de turistas que visitam Sines propositadamente para o FMM?
Como grande parte dos nossos concertos são de entrada livre e sem controlo de entradas, não temos números 100% seguros. Mas, certamente, largos milhares de pessoas.
O que destacariam em termos de iniciativas paralelas e qual a importância destas?
As iniciativas paralelas são o complemento necessário do programa de concertos e a sua extensão a outras artes. Uma delas, que se realiza há já bastantes edições, tornou-se também uma marca do festival: os ateliês para crianças com artistas do festival.