PE. Eurodeputados fazem “programa de governo” para a Comissão Europeia

PE. Eurodeputados fazem “programa de governo” para a Comissão Europeia


Eurodeputados elaboraram roteiro com recomendações para um novo caminho para a Europa no rescaldo do Brexit. Querem que a Comissão passe à ação já em 2017


O Parlamento Europeu (PE) deverá aprovar hoje “um verdadeiro programa de governo” com o qual quer vincular a ação da Comissão Europeia (CE) já a partir do próximo ano. 

“Esta resolução pode considerar-se o mais próximo de um programa de governo da União Europeia (UE). Serve para influenciar a agenda da CE, no âmbito do seu papel de executivo europeu e, embora sem ter força de lei, acaba por ser um documento essencial para a tomada de decisões, pois assenta numa ampla maioria de deputados, à esquerda e à direita do PE”, disse ao i fonte ligada ao parlamento. 

Subscrito pelas principais famílias políticas do PE (Partido Popular Europeu, Aliança dos Socialistas e Democratas e Liberais Democratas), o documento assumiu a forma de uma resolução onde estão fixadas “as prioridades estratégicas para o Programa de Trabalho da Comissão para 2017”. 

A eurodeputada socialista Maria João Rodrigues, que coordenou a elaboração do documento, disse ao i que a resolução é “uma resposta ao Brexit e a outros movimentos que replicam aquele sentimento noutros Estados”.

“Para os subscritores, esta resolução pretende mostrar que não deve ser esse o caminho. Há uma série de atores políticos que defende o regresso às fronteiras nacionais. Este documento diz exatamente o contrário. Que temos é de construir melhores soluções coletivas para a Europa. Esta é a grande escolha que está presente nesta resolução”, sustentou.

Além disso, prosseguiu, na resolução “há um reconhecimento de que o que existe não é suficiente. De que o que está em curso não serve. Por isso aponta caminhos”.

Para a deputada, a resolução torna-se também num documento marcante porque faz do Parlamento Europeu a primeira instituição europeia a tomar uma posição clara sobre o Brexit. O Conselho Europeu não o fez. Já o PE, com esta resolução, apresenta um roteiro para um novo caminho”, adiantou.

Maria João Rodrigues esclareceu também que nas negociações para se encontrar uma posição comum entre as três principais famílias europeias a parte mais difícil foi a relativa “à zona euro”.

“Essa é uma das partes que mais interessa a Portugal. Em que se procura convergência e não divergência e conseguiu-se, com as recomendações em matéria de união bancária e de um orçamento próprio”, adiantou.

Elaborada na sequência do terramoto político causado pela vitória do sim no referendo à saída do Reino Unido da União Europeia, a resolução está dividida em 50 pontos, repartidos por 10 áreas de intervenção. Começa logo por considerar que a “maior prioridade da Europa” passa pelo “reforço da legitimidade democrática da União” e, para se chegar lá, é fundamental restaurar a “confiança na capacidade de servir os interesses dos cidadãos”. 

A crise de refugiados, que tem mobilizado a opinião pública europeia, mereceu um destaque especial no documento. Para os eurodeputados, “a UE tem de encontrar soluções concretas para enfrentar a emergência dos refugiados, em particular abordando as causas profundas através do reforço da cooperação com os países de trânsito e de origem dos fluxos migratórios e usando todas as políticas e instrumentos disponíveis para garantir a respetiva estabilização, reabilitação e desenvolvimento”. 

O documento exorta a UE, em estreita cooperação com os Estados Unidos, a “prosseguir a assistência humanitária necessária e garantir condições de vida dignas em campos de refugiados, combinados com programas de desenvolvimento a longo prazo, especialmente no domínio da educação”. 

Os deputados dedicaram atenção especial às questões ligadas à melhoria das condições de trabalho e de vida dos europeus.

Depois de considerarem modesta a recuperação económica da Europa, lembraram que “muitas regiões continuam a sofrer níveis inaceitáveis de desemprego, pobreza, desigualdade e uma grave falta de perspetiva para as gerações mais jovens”. Por isso advogam que a UE “deve trabalhar para um mercado de trabalho dinâmico e inclusivo, incorporado no modelo europeu de economia social de mercado, melhorando as condições de vida dos cidadãos e permitindo mobilidade equitativa”. Para os parlamentares, “todos os cidadãos da UE devem contar com um conjunto fundamental de condições justas de trabalho, o acesso à educação de qualidade, proteção social e serviços essenciais”. 

Exigem que a CE reflita e tome medidas para diminuir a pobreza infantil e que faça um esforço para “reduzir as desigualdades sociais e promover a qualidade do emprego, especialmente para os jovens e os desempregados de longa duração, a fim de impulsionar o crescimento económico”. Em matéria de União Económica e Monetária, os parlamentares apelam a “uma coordenação mais estreita das políticas económicas para colmatar as lacunas de investimento da zona euro”.

No documento, considera-se também que a união bancária tem de “ser completada com medidas de redução de risco”, designadamente através da partilha desses mesmos riscos.

Os subscritores dedicam um capítulo ao “reforço do orçamento da UE e dos instrumentos financeiros”, considerando que a União “precisa de uma nova estratégia financeira e fiscal”. Para se atingir esse fim, a CE deve, designadamente, apresentar “propostas para reduzir a complexidade burocrática da Política Agrícola Comum (PAC)”. Os eurodeputados desafiam ainda a CE a “prosseguir uma abordagem comum, determinada a encerrar os paraísos fiscais”, e exortam o órgão executivo a incluir uma “dimensão externa” na “luta contra a evasão fiscal”, nomeadamente em relação “aos lucros que deixam a UE sem serem tributados”. 

Querem também que a CE de-senvolva uma ambiciosa agenda de ação externa, prosseguindo “o processo de negociação do alargamento através do reforço da estabilidade social, política e económica e da democracia nos países candidatos, sem concessões sobre os critérios de adesão”. 

Sobre a resposta da UE às “preocupações de segurança dos cidadãos”, os eurodeputados desafiam a Comissão a assegurar o “rápido arranque” da Guarda de Fronteiras e da Guarda Costeira, assim como a disponibilização dos meios humanos e logísticos. 

Nesta matéria, entendem que a CE, para “enfrentar as ameaças do terrorismo e do extremismo violento”, deve acompanhar “de perto a transposição e implementação de medidas de combate ao terrorismo”, incluindo uma cooperação judiciária e policial eficaz e a partilha atempada de informações entre as autoridades nacionais e através da Europol e da Eurojust. Os eurodeputados recomendam também que sejam identificados os esforços que levem à eliminação gradual dos “subsídios aos combustíveis fósseis”, minimizando os possíveis impactos económicos e sociais dessa decisão.