“As leis morais são as regras de um jogo no qual todos fazem batota, e isto desde que o mundo é mundo.”
Jean Cocteau, Escritor francês
O antigo presidente da República de Moçambique, Joaquim Chissano, vai estar esta semana em Portugal para participar numa conferência em Cascais sobre Moçambique e Portugal (“Pontes para o desenvolvimento económico”) e para receber o prémio Norte-Sul 2015 atribuído pelo Conselho da Europa. Este prémio é atribuído anualmente a personalidades que se destacam a nível internacional no domínio da defesa dos direitos humanos e da democracia, contribuindo para um mundo mais interdependente e solidário.
Em relação a 2015, a par de Joaquim Chissano – do sul -, do norte, este prémio será atribuído a Lora Pappa, cidadã grega e dirigente de uma organização de apoio aos refugiados. Estas duas distinções serão entregues por Marcelo Rebelo de Sousa, enquanto Presidente da República de Portugal, na Assembleia da República. E são merecidas. As duas personalidades juntam-se a outras que já receberam a mesma distinção. Das 40 pessoas que já receberam este prémio, destacam-se de entre outras personalidades Kofi Annan, Mário Soares, Jorge Sampaio, Almeida Santos, Lula da Silva, Bob Geldof, Mary Robinson, Simone Veil e Graça Machel, para além de muitas outras pessoas quer do chamado mundo do norte quer do chamado mundo do sul. Esta distinção é entregue pela mais antiga instituição europeia, que é o Conselho da Europa, criado no ano de 1949, do qual fazem parte 47 países. E no que diz respeito a Joaquim Chissano, é muito merecida.
Chissano, antigo presidente da República de Moçambique é um príncipe da política africana e moçambicana. No tempo em que exerceu funções de presidente moçambicano foi sempre um realista no que diz respeito à realidade política, económica e social do seu país. Mesmo com as conhecidas vicissitudes políticas e militares, foi sempre um protagonista que procurou a paz, o compromisso e a estabilidade do seu país e do seu povo. Moçambique e os moçambicanos têm em Joaquim Chissano um ativo político e diplomático importante e, também por razões diversas, têm Graça Machel como uma forte referência. Com Joaquim Chissano, a comunidade de países de língua oficial portuguesa (CPLP) contou com o empenho de Moçambique no concerto dos países que estiveram na sua origem.
Aliás, Moçambique foi desde o início dos projetos quer dos PALOP, quer da CPLP, um país empenhado e interessado nas suas missões e objetivos. É curioso verificar que Joaquim Chissano venha a Portugal receber este prémio do Conselho da Europa e fazer uma conferência sobre Portugal e Moçambique naquele que é, sem dúvida, o período mais complexo e desanimador da CPLP. Ainda por cima quando a CPLP tem sido e ainda é liderada pelo antigo chefe da Casa Civil de Joaquim Chissano, o embaixador Isaac Murade Murargy, atual secretário executivo da CPLP. No tempo e no espaço parece uma contradição, mas não é. Deverá ser antes uma oportunidade para, com realismo, Portugal, as suas instituições e a sua opinião pública perceberem que a CPLP vive momentos muito dramáticos. Sobretudo por culpa de Portugal e de alguns portugueses. Aliás, direi mesmo, não fora a paciência do embaixador Murade Murargy, a CPLP, provavelmente, estaria numa situação ainda pior. Alguns de nós fomos avisando nos últimos anos para o que se estava a semear. Para a portugalização da CPLP e para a soberba e arrogância portuguesa em relação a esta organização internacional. Mas alguma esquerda e alguma direita, “caviares”, teimaram em não querer ver o óbvio e alimentaram parte da opinião pública portuguesa, com a intoxicação e diabolização de vários Estados, e países membros da CPLP. O resultado está à vista. Infelizmente, não vai ser fácil que as coisas mudem. Mas podem mudar. É só assumirmos o realismo que outros países têm assumido (como os EUA e vários outros países europeus) sem se abdicar de princípios estruturantes do nosso Estado de direito.
Uma coisa é certa como o destino. A CPLP, para ter futuro, terá de mudar o seu desígnio e a sua visão estratégica para as próximas décadas. Tendo em conta que vive num mundo onde a unipolaridade europeia e ocidental e o seu poder normativo têm de ter presente que vivemos num mundo cada vez menos ocidental. Antes pelo contrário. Mas contra a portugalização da CPLP falaremos na próxima semana.
Escreve à segunda-feira