Luís de Matos. “O meu trabalho não acontece apenas quando estou em palco ou na televisão”

Luís de Matos. “O meu trabalho não acontece apenas quando estou em palco ou na televisão”


Cada vez mais dedicado aos palcos internacionais, nos próximos dias Luís de Matos volta a apresentar-se em Portugal, a propósito da estreia do filme “Mestres da Ilusão 2” 


Hoje, amanhã e depois, a propósito de três antestreias, em Lisboa, Cascais e Matosinhos, do filme “Mestres da Ilusão 2”, que chega oficialmente às salas de cinema no próximo dia 16, Luís de Matos coordena um espetáculo que junta cinema e quatro dos mais conhecidos ilusionistas da atualidade. E o próprio Luís de Matos, claro.

Como surgiu esta ideia de levar a magia ao cinema?

O mérito de nos juntarmos nesta iniciativa é totalmente devido à visão da NOS Audiovisuais em desenvolver uma ação especial, única e irrepetível para promover o filme “Mestres da Ilusão 2”, que estreia no próximo dia 16 de Junho. Contudo, a magia e o cinema têm uma história que se cruza desde os primórdios da sétima arte. Recorde-se que o cinema, enquanto narrativa ou espetáculo sobre a tela, foi inventado por um mágico. Georges Melies era o diretor técnico do mágico francês considerado o pai a magia moderna, Jean Eugene Robert Houdin. No final da sua carreira, Robert Houdin ofereceu o seu teatro, no centro de Paris, a Georges Melies que, poucos anos mais tarde, viria a inventar o cinema. Também a chamada claquete, dispositivo usado no cinema e audiovisual para identificar planos e sincronizar áudio e imagem, foi inventado por um mágico chamado Leon M. Leon. O próprio Orson Wells era mágico profissional, apesar de o grande público o conhecer pelo cinema. Mais recentemente, na última década, dezenas de filmes têm sido produzidos em redor da temática da magia. Eu próprio estou a participar num filme português.

Qual será o seu papel?

… Mágico.

Viu o primeiro “Mestres da Ilusão”, lançado em 2013?

Sim, claro. Gostei pela história, pelas representações e pela realização. Naturalmente não pude ficar insensível ao facto da própria imagem da magia sair beneficiada com um extraordinário toque de contemporaneidade.

E já viu a sequela, que estreia agora?

Sim. Contrariamente ao que somos levados a esperar esta sequela é melhor que o primeiro filme. Espero que essa tendência se intensifique na medida em que já está a ser produzido o próximo…

O que pode revelar destes espetáculos que acompanharão a antestreia do filme em Lisboa, Cascais e Matosinhos?

O filme “Mestres da Ilusão 2” continua a dar-nos uma imagem contemporânea da magia, mas grande parte dos momentos de ilusão são naturalmente conseguidos através da magia do cinema. Por isso, momentos antes de cada uma das antestreias, estes mágicos vão partilhar com o público ilusões de semelhante espetacularidade, mas realizadas a poucos metros dos espetadores.

Mas o facto de estes espetáculos acontecerem em salas de cinema condiciona-vos? Um ilusionista tem sempre de se adaptar aos espaços onde atua?

Claro que sim, tal qual aconteceria com um músico, um ator ou qualquer outro artista. No entanto, vejo nisso uma vantagem, na medida que induz uma criatividade maior e certamente se traduzirá numa agradável surpresa junto de todos quantos nos derem o benefício da dúvida e se juntarem a nós.

Como coordenador, quais foram os critérios para escolher os convidados?

Acima de tudo pesou a sua qualidade, originalidade e contemporaneidade, características presentes nos mágicos do filme e que poderão identificar-se no trabalho de cada um dos mágicos que este fim de semana chegam a Portugal.

E chegam dos quatro cantos do mundo.

Sim. Hyunjoon Kim, da Coreia, é um manipulador premiado mundialmente. De uma destreza absolutamente ímpar. Thommy Ten & Amélie, da Áustria, são os atuais campeões do mundo em transmissão de pensamento. Além do êxito mundial que vêm obtendo nos últimos anos, acabam de passar às finais do concurso televisivo “America’s Got Talent” e os vídeos da suas atuações tornaram-se virais. Jan Van Kammen, da Holanda, é um moderno mentalista, com uma singular carreira e, mais recentemente, protagonista de uma série de televisão produzida com a FOX.

Um manipulador, dois especialistas em transmissão de pensamentos e um mentalista. O ilusionismo está cada vez mais especializado?

Na minha opinião, a única desejável especialização consiste na singularidade de cada performer. Para o público não existem catálogos ou géneros, existem, isso sim, artistas que emocionam e surpreendem ou outros que, sem qualquer chama ou alma, se limitam a imitar. O público é cada vez mais exigente e consegue sempre ver para lá das luzes da ribalta. Nessa medida, vem acentuando-se cada vez mais um abismo entre verdadeiros artistas e os “cantores de karaoke” que se limitam a imitar.

Qual é a sua relação com os ilusionistas que convidou, trocam segredos?

Mantenho com todos eles uma relação excelente. Com três deles tenho estado em digressão mundial no espetáculo “The Illusionists”, onde tenho o privilégio de ser cabeça de cartaz. Claro que partilhamos segredos e opiniões. Contudo, falar em troca de segredos entre mágicos é quase como falar em troca de notas musicais entre compositores. O importante não são os sistemas, mas sim a obra final.

Em média, quanto tempo demora a atingir essa obra final?

Defendo que cada novo número demora uma vida inteira a preparar. Melhor dizendo, parece-me fundamental que cada criação reflita a maturidade artística entretanto conquistada, caso contrário não estaria a ser verdadeiro com a minha própria sensibilidade.

Mas como são passados os seus dias?

Contrariamente ao que o grande público pensa, o meu trabalho não acontece apenas quando estou em palco ou na televisão. A minha equipa e eu, nove pessoas no total, trabalhamos diariamente, juntos, há vinte anos. Aliás, no próximo domingo celebramos duas décadas de vida em conjunto.

Depois de uma fase em que o ilusionismo estava muito presente nas televisões nacionais, hoje em dia parece mais afastado, pelo menos o ilusionismo de grande escala. É uma arte que perdeu adeptos em Portugal ou tem a ver com o facto de ser dispendiosa?

Acredito que isso não seja verdade. Tenho a sorte da minha página de Facebook estar em vigésimo lugar no ranking das páginas pessoais mais numerosas e ativas no contexto das que representam pessoas da arte, cultura e lazer. Além disto, penso que o fenómeno que estamos a acabar de viver se prende com o facto de, no final da década de 90, nomeadamente em maio de 1997, o primeiro especial de televisão do americano David Blaine ter acabado por criar uma moda: a moda das séries filmadas na rua, com poucos meios e baixos custos. Esta fórmula finalmente mostra irreversíveis sinais de desgaste e tem vindo a dar lugar ao regresso dos grandes programas de televisão, feitos em estúdio, com a saudosa espetacularidade que a arte de criar ilusões permite. Esse ilusionismo de grande escala e consequente impacto, começa agora a regressar aos canais de televisão, um pouco por todo o mundo.

Além das televisões, nos últimos anos fica a sensação que tem andado mais afastado também dos palcos portugueses. Hoje em dia atua mais frequentemente no estrangeiro?

Sim, que é algo que deixa a minha equipa e eu cheios de orgulho. É bom perceber que o que fazemos tem qualidade internacional e não é fruto de uma qualquer circunstância acidental. Nos últimos três anos tenho andado pelo mundo. Partilhar o que faço em salas como a Sydney Opera House ou o Dubai World Trade Center é extraordinário. No final de 2015 e início de 2016, completámos quatro meses em Macau e, mais recentemente, acabámos de regressar de uma digressão asiática onde passámos pela Tailândia, Hong Kong e Singapura. Antes disto, no ano passado, estive seis semanas em cena em pleno West End londrino, sempre com casas esgotadas. Apesar de tudo isto, agora vou regressar aos palcos portugueses com o espetáculo “Luís de Matos CHAOS”, mas em novembro voltarei para o estrangeiro.

Ainda o chamam Copperfield português?

Há muito que esse epíteto ficou desatualizado. Aconteceu sobretudo no início dos anos 90, em que a única referência mundial era o David Copperfield e em que a minha atividade começava a ser mais visível. Na altura costumava dizer que, se as referências mais fortes na música fossem o Michael Jackson e a Dulce Pontes, essas mesmas pessoas diriam que a Dulce Pontes era o Michael Jackson português… Mas os nossos perfis, trabalhos, estilos são absolutamente distintos. E acrescente-se ainda que a sua dimensão é infinitamente superior…