Will Toledo é daqueles jovens que nunca gostou de pessoas. Mais: teve a decência de cedo perceber que prefere paisagens, talvez até gorilas, seres ou objetos cuja língua não possamos entender. Exercício honesto, ainda que egoísta, esse de optarmos por vagões com pouco mais que ferrugem, ou simplesmente o banco de trás do carro que nunca conheceu um pendura.
Tipo de caráter que nem sempre se suporta – ao próprio, claro – e cujo remédio é beber depressão, ir ao escuro mais escuro possível só para evitar confrontos ao espelho, e, no caso de Will Toledo, fazer boa música.
Boa é eufemismo. O jovem de Leesburg, Virginia, estreou-se num tal Toyota Sienna de 2000, que lá atrás há mais espaço para ninguém. “Já fazia música há alguns anos, no meu quarto, mas quando comecei Car Seat Headrest queria que fosse um projeto pessoal, de música experimental. Nessa altura estava farto de o fazer em casa, queria encontrar um lugar específico para aquilo, então comecei a tocar no carro, que se foi tornando uma tradição, gravava sempre ali”, explica timidamente, o autor de uma epopeia lo-fi que o fez depositar 11 discos no seu bandcamp, isto tudo antes de arriscar inspirar o oxigénio do lado de fora do carro.
É esse criador precoce, esse génio triste, que em 2015 assinou pela Matador tendo editado “Teens of Style”, um disco compilação desses tempos de solidão, e que agora acaba de editar “Teens of Denial”, primeiro disco de estúdio e em fórmula banda, um dos grandes do ano corrente, já agora. Os Car Seat Headrest atuam sábado, no Palco Pitchfork do NOS Primavera Sound, um dos concertos mais desejados do festival, apostamos.
Cuidado que isto é coisa para fazer desmaiar, sobretudo se o seu tempo coincidir com o de Will Toledo, se a vertigem da juventude dispensar grandes alturas ao ponto de qualquer um cair. Aos 23 anos, os Car Seat Headrest são mestres a domar a desilusão que é ser-se só, a pregar a desventura da pseudo-felicidade, o isolamento tem-no “guiado rio acima, por diferente espetros da vida e que, por certo, influencia a música” que faz.
Sobra sempre a parede que não se derruba, o momento em que nos tornamos alpinistas por obrigação. Em 2010, WillToledo começou a “fazer música mais acessível e a criar uma base de fãs”, confirma antes de acrescentar que o anonimato e o Toyota tinham os dias contados: “Foi sobretudo online porque ainda me sentia bastante tímido para tocar ao vivo. Só que a certa altura havia demasiada gente a ouvir e a gostar para não o levar a outro nível. Quando acabei a universidade mudei-me para Seattle e formei a banda”.
Pelos vistos, a universidade consegue mesmo alterar comportamentos pessoais, o que é raro por aqui é que foi para melhor, ao ponto de Toledo afirmar que esse seu problema de socialização está a mudar: “Neste momento tenho uma agenda, tenho que cumprir horários, estar com pessoas, é impossível não me ir relacionando, tenho passado bastante tempo com a banda. Mas é também uma questão de mentalidade, durante muito tempo andei sozinho, agora que não tenho outra hipótese sinto que é um desenvolvimento pessoal”.
Acumulam-se razões para a fila se alongar. A partir das 21h15, no Palco Pitchfork do NOSPrimavera Sound, quem estiver pelo Parque da Cidade, no Porto, parece não ter desculpa. “Teens of Denial” será o prato forte, sendo que, mais que certos temas e discos, o que queremos é o direito de poder deprimir em paz. E sim, ficamos bem.