A hipótese pode parecer irrealista, mas quem diria há dois anos que o Bloco e o PCP se aliariam a um PS liderado por António Costa? As autárquicas de 2017 são decisivas. Se as vencer, Passos soma e segue até às legislativas, que pode ganhar se a situação económica se agravar ainda mais. Mas se Passos não passar o obstáculo autárquico, a questão da sucessão vai-se colocar. Aliás, não faria sentido de outro modo. O próprio Passos tem consciência disso e recentemente lançou o desafio a quem lhe quiser disputar o lugar desde já.
O problema para o PSD num cenário de sucessão pós-autárquicas (que o próprio Presidente Marcelo pôs na agenda como marco decisivo) é que se estaria a escassos dois anos de legislativas, pelo que um novo líder teria de ser alguém conhecido de todos os portugueses.
Há Rui Rio, por exemplo. É verdade. Mas sendo conhecido, não é verdadeiramente uma figura nacional. É mais uma referência regional. Sobretudo tem o defeito de avançar dois passos para recuar um, acabando por desistir como aconteceu com Belém e duas vezes em relação à liderança do PSD.
Chegou a falar-se em Maria Luís Albuquerque, que todos conhecem, mas as contas furadas deixadas nas Finanças e as confusões nas explicações sobre o Banif afastaram-na por uns anos. Seria bom demais para os adversários.
Há Paulo Rangel, que é fulgurante e inteligente. Falta-lhe a quota de popularidade nacional, além de se estar a tornar simétrico de António Vitorino em termos de carreira, acabando por se aproximar mais das áreas de negócios e dos areópagos políticos internacionais. Moreira da Silva é sempre falado, mas não parece objetivamente empenhado em avançar. José Eduardo Martins tem feito o seu percurso. Tem substrato, é politicamente inteligente e esteve sempre distante de Passos. Mesmo assim é duvidoso que reunisse rapidamente um conjunto de apoios que o levassem à liderança após um colapso autárquico. Outro nome forte seria Morais Sarmento, um dos mais brilhantes da constelação social-democrata. Se quisesse mesmo, haveria que contar com ele, mas tem hesitado sempre.
Atualmente fala-se sobretudo em Luís Montenegro. Tem sido um líder parlamentar de qualidade. Reúne apoios. Foi essencial para fazer pontes com o CDS na coligação anterior e está já na estrada para o que der e vier. Apesar de ser relativamente conhecido, teria vantagem em ter mais de dois anos para se afirmar, ao jeito de Assunção Cristas.
Deixando de parte Durão Barroso, a quem só Belém pode interessar, estamos reconduzidos a dois nomes que o país conhece perfeitamente e que poderiam protagonizar um eventual regresso do PSD ao poder depois de uma hipotética débacle autárquica. Em primeiro lugar, Marques Mendes. Todavia, Mendes mais parece estar a decalcar a trajetória de Marcelo, consolidando uma imagem equidistante que lhe permita outros voos que não um mero regresso à política partidária e executiva. O segundo nome é o de Santana Lopes, talvez aquele que possa ter mais coragem para saltar para a arena política de repente.
Se é certo que muitas coisas não lhe correram bem quando foi primeiro-ministro, a verdade manda dizer que não se lhe podem assacar todas as culpas. O erro foi precipitar-se para o lugar que Barroso lhe cedia, sem reconhecer que Ferreira Leite tinha melhores condições. Sampaio anuiu durante um tempo até usar a bomba atómica da dissolução para liquidar um governo à deriva, mas legitimo. E assim a estrela da época, José Sócrates, conseguiu uma inimaginável maioria absoluta nas urnas. Com um sucessor desses e o que veio a seguir, a passagem de Santana por S. Bento passou de cadastro a curriculum. Nomeado provedor da Santa Casa, a sua obra é claramente positiva. Ficará na história a transformação do Hospital do Exército, na Estrela, numa unidade de cuidados paliativos e continuados. É certo que há por vezes uns burburinhos na instituição a propósito de danças de cadeiras e admissões, mas nada mais que isso.
Com tempo e persistência, Santana recuperou a imagem e moderou comportamentos. Já não é um liberal Nova Esperança. Voltou a uma temperada social–democracia de centro-direita. Amadureceu. Mede o que diz sem deixar de ser quem é. Não avançou para Belém. Ficou–lhe a pedrinha no sapato com Marcelo, mas não alimenta uma hostilidade como a de Passos relativamente ao Presidente. Em termos políticos, sabe colocar-se sistematicamente como hipótese para alguma coisa, como agora a propósito de uma improvável recandidatura a Lisboa. Na televisão, contracena com António Vitorino. Apela a consensos e dá conselhos. A sua vida pessoal passou a ser privada. É um Santana mais branco no cabelo, mais ponderado na palavra, mais maduro. Dialogante com o PS, não é hostilizado no CDS. Todos os portugueses o conhecem e poucos o detestam. Nisso parece António Costa. Na Europa há centenas de casos de políticos renascidos. Em Portugal aconteceu com Mário Soares e agora com Marcelo. Então porque não considerar Santana Lopes, sobretudo se ele se apresentar sem a guarda pretoriana que tanto o prejudicou?
Jornalista