Cafés. O novo mercado negro das apostas de futebol

Cafés. O novo mercado negro das apostas de futebol


A ASAE tem em curso investigações a cafés com máquinas de apostas ilegais. Geralmente em resultados de futebol. Há idosos que deixam lá a reforma e jovens sem controlo. O fim do jogo online e a centralizaçãono Placard terão potenciado o ‘jogo ilegal’  


Vários cafés e pequenas associações de norte a sul do país dispõem de máquinas para fazer apostas ilegais em resultados de futebol. São computadores com impressoras que permitem entregar aos jogadores um ticket comprovativo da sua aposta, uma espécie de concorrência ao único jogo permitido em Portugal: o Placard, da Santa Casa da Misericórdia.

Segundo o i apurou, o caso está já a ser investigado pela ASAE depois de diversas denúncias. “Estamos a falar de um número elevado de apostas e de quantias muito avultadas”, explica fonte da investigação, adiantando: “A ASAE está a atuar neste momento, basicamente em todo o território. Há pequenos cafés onde as pessoas vão e apostam, como se fosse um euromilhões ou o Placard”.

O conhecimento deste tipo de apostas chegou com diversas denúncias de familiares de idosos e de menores de idade dando conta de que estes gastavam muito dinheiro nestes estabelecimentos. “Em alguns casos gastavam a reforma toda. Isto é um problema social”, adianta fonte da ASAE, assegurando que “todos esses sistemas são ilegais”.

Nenhuma licença até ao momento Se dúvidas houvesse sobre se alguns dos cafés têm ou não licença para estes jogos, todas se dissipam quando se constata que até hoje não foi pedida qualquer autorização ao Turismo de Portugal – Serviço de Regulação e Inspeção de Jogos. 

“Foi concebido [em 2015] que os operadores interessados se pudessem candidatar a um licenciamento, mas até ao momento ninguém se candidatou e por isso não existe nenhuma licença passada pelo serviço de Regulação e Inspeção de Jogos, que é a entidade que supervisiona a matéria”, assegura outra fonte conhecedora da investigação em curso.

Os jogos detetados até hoje pelos inspetores da ASAE e que deram origem às várias investigações em curso são todos de apostas “similares ao Placard”. E todos eles violam o art.º 15.º do decreto-lei 67/2015: “Quem, por qualquer meio e sem estar para o efeito devidamente autorizado, explorar, promover, organizar ou consentir a exploração de apostas desportivas à cota de base territorial é punido com pena de prisão até cinco anos ou com pena de multa até 500 dias.”

Como funciona se ganharem Caso os apostadores dessas casas ilegais de jogos vençam prémios pequenos, ou seja, tenham o ticket vencedor, o dinheiro é-lhes pago na hora. Caso contrário têm de esperar algum tempo para o receberem. 

Até 500 euros, os donos dos estabelecimentos assumem e pagam de imediato os prémios, quando os valores ultrapassam esse limite, os apostadores têm de esperar que quem gere a plataforma usada pelo café vá lá entregar o prémio.

Segundo os investigadores da ASAE, ainda que existam diferenças de café para café estas regras parecem ser uniformes.

Outra das questões é o facto de os “domínios” nem sempre estarem em Portugal: “Os cafés têm os computadores portáteis e usam plataformas cujos domínios parecem ser portugueses, mas estão fora de Portugal”, explicam. Mas uma coisa é certa: “Quem gere são empresas portuguesas”. 

Por norma os casos em investigação são de apostas em resultados de jogos de futebol. Apesar de ilegais, os investigadores não encontraram até ao momento qualquer situação em que houvesse manipulação de resultados, como o que aconteceu na chamada Operação Jogo Duplo (ver texto ao lado): “Até ao momento não há nexo causal destas situações com jogos combinados”.  

Uma alternativa às slot machines Estes jogos terão começado a tornar-se moda há relativamente pouco tempo e são já vistos como uma forma alternativa às chamadas slot machines que alguns cafés ainda têm.

Tendo em conta as denúncias recebidas, os investigadores não têm dúvidas de que se trata de um esquema que movimenta milhares de euros e que traz diversos problemas sociais, dado o grande volume de apostas por parte de idosos e jovens, alguns deles com poucos rendimentos. “Não precisam sequer de se deslocarem ao casino, basta ir ao café do lado”, dizem.

Outra situação que potenciará este mercado negro, sobretudo entre os mais jovens, é o facto de atualmente não existirem sites legalizados para fazer apostas em Portugal, em cumprimento do decreto de lei 67/2015.